Grazi Massafera fala sobre carreira, amor, maternidade e finanças
A atriz relembra passagens humilhantes vividas com colegas de trabalho e revela que gosta do dinheiro, mas é zero deslumbrada com o poder dele
Conversar com Grazi Massafera, 35 anos, é como se ver diante da Esfinge, figura mitológica com corpo de leão e cabeça de mulher, que propunha enigmas aos viandantes e os comia, se eles não os desvendassem. Ao jornalista, Grazi não faz perguntas, mas dá respostas enigmáticas. Fala bastante, porém nem sempre de forma clara – daí a referência ao “Decifra-me ou te devoro”, do monstro grego.
Desconfiada, assume que precisa estar no comando, por isso espera para ver qual é a do interlocutor antes de abrir o jogo. Quando o faz é para valer, como você verá a seguir. E notará também que a mais bem-sucedida BBB do reality show global está madura. Sua carreira completa 11 anos, ela não precisa mais contar o dinheirinho do dia, como fazia quando era manicure, mas confidencia: vende suas roupas usadas.
Mãe de Sofia, 5 anos, fruto da união com o ator Cauã Reymond, a paranaense mostra-se belíssima e encontrou o amor, novamente, no advogado carioca Patrick Bulus, 29 anos. Adorada pelo público e – finalmente! – respeitada pela crítica, detesta este lado da fama: ver frases serem atribuídas a ela em perfis falsos.
Nenhuma das conquistas lhe caíram no colo. Como esta: fará a vilã Lívia, em O Outro Lado do Paraíso, próxima novela das 9. Repetirá a parceria com uma dama da TV, Marieta Severo, que vai interpretar a mãe de Lívia. Ela nos recebeu para uma conversa no Palácio Tangará, luxuoso hotel de São Paulo.
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EGOÍSMO, SUOR E SUPERAÇÃO
“Pouca gente vê, mas por trás do lado glamouroso do meu ofício existe uma longa história de trabalho, obstinação, disciplina e estudo, como minha mãe ensinou. Claro, há uma pitada de sorte também. E, cá entre nós, uma dose de egoísmo – bem pequena –, para saber a hora certa de colocar o foco em mim. Porém, nenhum ingrediente se mostrou mais importante do que a minha paciência.”
“Se precisasse arear uma panela ou lavar um banheiro, 100% de mim eram dedicados àquela missão. Eu pensava: ‘Nunca se sabe’. A pessoa que iria se servir daquilo podia se encantar com o meu trabalho e me levar para um emprego melhor. Idem quando fui jogadora de vôlei, miss e vendedora de loja de cosméticos. Não sou competitiva nem tenho sede de ser melhor do que o concorrente. Quero apenas superar a mim mesma.”
“Encontrei um ambiente hostil. Grandes nomes da televisão se recusavam a contracenar comigo. Teve ator que preferiu interpretar olhando para a parede”
FAMA
“Não tenho ilusão a respeito da fama. O sucesso é um passarinho que faz uma visita e pode bater asas a qualquer momento. Ao mesmo tempo, é um hóspede exigente, porque demanda cada vez mais atenção, tempo e dedicação. É estressante, mas delicioso.”
CONTRA A MARÉ DOS ADVERSÁRIOS
“No início da carreira, encontrei um ambiente hostil. Por ser uma ex-BBB, alguns grandes nomes da televisão se recusavam a contracenar comigo. Teve ator que preferiu interpretar falas olhando para a parede. Uma vez, o diretor precisou que eu gravasse sozinha no estúdio. Era cena de choro e eu desabei em lágrimas. A câmera estava fechada em mim. O resultado ficou ótimo!”
“Também armavam situações. Uma maquiagem sumiu do camarim e apareceu como mágica na minha bolsa. Deixaram umas coisas de feitiçaria no meu carro. Não teve estímulo melhor; em vez de desistir, fiquei tentada a fazer a carreira dar certo.”
“Confesso: demorei a encontrar motivação. Nos primeiros tempos, não tinha prazer no que vivia, estava ali para sustentar a família. O amadurecimento só aconteceu em Verdades Secretas (novela de 2015 em que fazia a modelo drogada, Larissa, papel que lhe rendeu indicação ao prêmio de Melhor Atriz no Emmy Internacional). Foram nove anos até gostar de ser atriz.”
BOLSA DE VALORES
“Quando trabalhava como manicure e ganhava um salário mínimo, meu sonho era ter uma moto pequena. Guardava 100 reais todo mês, religiosamente. Saí do BBB com 50 mil reais na mão. Minha mãe me recebeu eufórica, já dizendo como dividir e gastar o dinheiro. Falei: ‘Nada disso! Vai tudo para uma poupança’.”
“Hoje, meu orçamento é outro, mas a disciplina é a mesma. Posso contar que já curti momentos consumistas. Sonhava com perfumes e agora tenho uma bancada cheia, apesar de quase não usar.”
“A infância dura, eu brincava de telefone usando uma torneira velha. Desenhava os números com canetinha nela, e discava. Cheguei a ter cinco aparelhos de celular ao mesmo tempo, mas passou. Ao completar 30 anos, me permiti comprar um brilhante.”
“No entanto, adquiro roupas de maneira consciente e, a cada ano, repasso para a família 95% delas. Os outros 5%, revendo discretamente em sites de e-commerce, sem dizer que sou eu. Deve ter gente circulando por aí com bolsa que foi minha sem nem imaginar.”
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CORAÇÃO RELIGADO
“Paixão me assusta, porque perco o controle, coisa de que não gosto. Eu me relaciono com Patrick há um ano, e tem sido intenso. Meço muito as palavras quando me perguntam sobre ele. Pela primeira vez estou com uma pessoa que não é pública. A gente passeia no fim de semana na Serra Fluminense, pedala… Se tiver sexo todo dia, ótimo. Não é regra nem obrigação, mas, quando tenho desejo pela pessoa, rola até muito cansada.”
“Eu sinto vontade de casar de novo, mas sem muito alarde. Talvez faça isso longe de todos. Não sou de festa, nem mesmo no meu aniversário.”
PARA SE LIVRAR DAS GRAZIS FALSAS
“Demorei a criar perfil em rede social, e só entrei no Instagram porque era necessário para alguns trabalhos. Pago mensalmente um advogado para tirar do ar os inúmeros perfis falsos que criam em meu nome. Alguém se passar por você é uma coisa doentia.”
“Algo ainda mais grave é a imprensa publicar frases desses perfis. Uma vez, pedi para a minha assessoria alertar jornalistas sobre o erro. Responderam que apagar a notícia seria ruim para o veículo, pois traria problemas com sites de busca. Então, pergunto: é melhor deixar uma mentira no ar e enganar as pessoas?”
MEDO DO TEMPO E DA SOLIDÃO
“O que me assusta sobre envelhecer é a possibilidade de ficar mais ativa intelectualmente do que fisicamente. O ideal é o equilíbrio. Tenho medo, mais do que qualquer coisa, da solidão. Por isso, dou todo o amor que posso à minha família. É uma semente que estou plantando.”
“Não vou ser hipócrita, dizer que amaria ficar cheia de rugas. Elas são inevitáveis. Então você se conforma – o que julgo mais digno – ou começa a se mutilar. Não sou contra procedimentos estéticos, mas há celebridades que se tornam versões deformadas do que foram um dia.”
CHEGA DE MOCINHA
“O Brasil não sabe lidar bem com idosos. Meu segmento de trabalho, felizmente, está começando a mudar, a criar mais papéis para mulheres com mais de 50 anos, como a Elizângela, em A Força do Querer (aos 62 anos, a atriz interpreta Aurora, mãe angustiada com as escolhas da filha na novela das 9). Há 20 anos, salvo exceções, a gente tinha que ser só a mocinha boba.”
“Minha mãe via a beleza em mim e colocava nos meus ombros a esperança de mudar de vida fazendo uso da estética. Cresci com esse peso. Já Sofia poderá escolher o que quer fazer da vida”
O MUNDO DE SOFIA
“A responsabilidade de dar conta de um pequeno ser humano é apavorante. Na minha infância, o pavor era faltar comida em casa. Hoje, me preocupo em como educar. A tecnologia complica bastante, porque estamos cada vez mais distantes uns dos outros. Minha geração viveu o contato físico em tudo: na primeira paquera, no primeiro constrangimento, ao chegar junto, levar um fora… Enfim, todas as emoções eram cara a cara. Hoje, as crianças não contam com isso. Podem virar adultos frágeis. Tento manter o pé de Sofia na vida real.”
MÃE DE MISS? JAMAIS
“Espero nunca ser ‘mãe de miss’ com Sofia. Por mais piegas que seja dizer isso – e sempre me emociono quando penso a respeito –, o que desejo é que ela seja uma mulher forte. E feliz, claro. Quando tenho ensaio fotográfico, nas poucas vezes em que vai comigo, ela quer imitar e posar também.”
“Minha mãe via a beleza em mim e colocava nos meus ombros a esperança de mudar de vida fazendo uso da estética. A família tinha poucas condições e cresci com esse peso. Não vou fazer isso com a minha filha. Sofia terá a chance de escolher o que fazer da vida.”
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CULPA
“Toda mãe que trabalha fora de casa sente culpa quando precisa ficar meia hora longe dos filhos. Decidi que Sofia é a minha prioridade. Mas aprendi a lição da maneira mais difícil: no primeiro ano de vida dela, eu trabalhei muitíssimo. Exagerei. Pode colocar assim na reportagem.”
“Havia me programado para dar conta do que quer que houvesse, de todos os compromissos profissionais. Embora tenha organizado absolutamente tudo, definido e analisado cada coisa, o trabalho acabou ficando mais complicado que o previsto. Entrei em desespero. Nunca mais marquei milhões de atividades.”
“Hoje, meus fins de semana são dela e, nas raras ocasiões em que preciso me ausentar, mostro no calendário os dias em que ficarei longe e quando vamos nos reencontrar. Nas datas que ela estará com o pai, concentro a agenda de gravações e compromissos.”
“Outra coisa que faz diferença: transmitir a noção da necessidade do trabalho, como minha mãe fez comigo. Tenho orgulho da batalha; uma admiração enorme. Ela me mostrou o quão importante é ir para o batente, e que aquelas horas longe garantiriam a comida na mesa.”
“Sinto vontade de ter mais filhos. Não sei ainda quantos. Seria legal se viesse um menino na próxima, para formar par com Sofia. Se chegar outra menininha, a alegria continuará a mesma, com certeza.”
FEMINISMO
“Vão me olhar torto por falar isto: por mais difícil que seja a vida de mulher, considero nada fácil ser homem. Ele aguenta uma pressão absurda para não demonstrar as emoções. Sou a favor de evoluirmos juntos. Essa deve ser a força motriz de qualquer discussão sobre igualdade de gêneros.”
“Uma conversa que, sim, precisamos ter urgentemente é sobre salários iguais e condições justas de trabalho. O movimento feminista é estimulante, interessante e produtivo. Mas, às vezes, há excesso, sobretudo de ativistas de redes sociais. Algumas, até anônimas, destroem quem é contrário às suas crenças.”
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ESTUPRO
“Reconheço que lidamos todos os dias com o perigo físico. Ele é real quando uma mulher caminha na rua ou se vê forçada a pensar duas vezes na roupa que vai vestir. Cresci com um medo gigantesco de estupro.”
“Aos 14 anos, senti na pele a ameaça. Íamos visitar minha tia e, como não quis esperar minha mãe, segui sozinha. Um homem começou a me acompanhar. Apertava o passo, ele se apressava também. Acelerei até a hora em que o andar virou corrida; o cara fez o mesmo. Minha sorte foi que logo cheguei ao meu destino, ou hoje integraria a estatística deplorável das vítimas de abuso sexual.”
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*Styling: Érica Folloni/Beleza: Rodrigo Costa/MLages (com produtos M.A.C Cosmetics e L’Oréal Professional)/Assistente de moda: Maria Antonia Valladares/Tratamento de imagem: Regis Panato | PHOTOUCH/Assistente de beleza: Jean Ricardo/Assistentes de fotografia: Christian Henrique e Eduardo Carapito.