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‘Minha Fama de Mau’ tem carisma, mas não consegue ser um filme relevante

Ele é vibrante nas cores e na música, mas mostra Erasmo Carlos como um artista de essência pálida - o que coloca em cheque a razão de existir do filme.

Por Júlia Warken
Atualizado em 16 jan 2020, 00h25 - Publicado em 14 fev 2019, 11h32
 (Minha Fama de Mau/Divulgação)
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Protagonizado por Chay Suede, “Minha Fama de Mau” conta a história de Erasmo Carlos e entra para o hall das cinebiografias brasileiras sobre artistas da música. Grande amigo e companheiro profissional de Roberto Carlos, Erasmo estourou nos anos 1960 com hits chiclete como “Festa De Arromba”, “Gatinha Manhosa” e a música que dá título ao filme. Dirigido por Lui Farias, o longa é inspirado na autobiografia homônima de Erasmo.

Fascinado pelo rock and roll de artistas gringos como Bobby Darin – cuja música “Splish Splash” ganhou uma versão em português assinada por Erasmo -, Elvis Presley e os Beatles da época de “She Loves You” e “Love Me Do”, o Tremendão enveredou pelo mesmo estilo musical. No auge da carreira, tornou-se um dos grandes nomes do “iê-iê-iê” brasileiro com a Jovem Guarda.

Mas será que Erasmo foi um nome tão significativo ao ponto de fazer jus a uma cinebiografia feita nos mesmos moldes dos filmes sobre CazuzaElis ReginaTim Maia e Gonzaguinha? A princípio, nem mesmo o slogan do filme consegue nos convencer disso. “Uma amizade que marcou gerações”, diz o cartaz, referindo-se obviamente à dupla Erasmo e Roberto, por mais que Wanderléa também apareça na imagem.

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(Minha Fama de Mau/Divulgação)

Além de usar essa amizade – e não a importância de Erasmo em si – para vender o filme, a trama também deixa muito claro que o personagem principal sempre orbitou em torno de Roberto Carlos e não conseguiu cravar seu nome na história como fez seu grande amigo. Esse viés do filme é bem esquisito, já que empalidece a trajetória do protagonista ao mesmo tempo em que tenta enaltece-lo – aos moldes das outras cinebiografias já citadas.

Mesmo assim, é justo dizer a amizade entre Erasmo e Roberto é retratada de maneira encantadora. Chay e Gabriel Leone (que interpreta Roberto) têm uma ótima química em cena e os dois protagonizam cenas muito gostosas de assistir, como a da composição de “Parei na Contramão” e uma passagem bem emotiva na casa de Roberto Carlos, que poderia ser piegas, mas funciona muito bem e transparece o carinho mútuo entre ambos.

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Bom, mas essa é uma obra sobre Erasmo Carlos e é inevitável que a gente se questione se faz sentido ele ter ganhado um filme próprio antes mesmo de Roberto ou da Jovem Guarda como um todo. Vale lembrar que, com um roteiro afiado e inventivo, qualquer história pode ser uma ótima história, mas não é isso o que vemos em “Minha Fama de Mau”. O filme é absolutamente expositivo e, por ironia, peca em expor algo muito importante na carreira de Erasmo: a magnitude da Jovem Guarda.

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(Minha Fama de Mau/Divulgação)

A trama mostra apenas o período em que o programa de TV – que também chamava-se “Jovem Guarda”- comandado por Erasmo, Roberto e Wanderléa esteve no ar, mas sequer faz menção ao fato de que a Jovem Guarda transformou-se num verdadeiro fenômeno cultural e teve muitos outros membros. Falar somente da atração da TV Record, que durou meros três anos, é mais um dos estranhos desserviços que o filme faz a Erasmo Carlos.

Dentre os pontos fortes do longa, a caracterização de época e a musicalidade estão ótimas. A juventude sessentista é retratada de maneira deliciosa, mas, infelizmente, o roteiro não explora isso tanto quanto poderia. Como eram as discotecas embaladas ao som de “Festa de Arromba”? E a atmosfera pulsante das lojas de discos a cada lançamento da Jovem Guarda? Como os figurinos do programa da Record influenciavam a moda nas ruas? Nada disso é mostrado.  

Mas, falando sobre o que vemos em cena e deixando de lado o que faz falta, a reconstituição de época é bonita de se ver. E de se ouvir também! Chay, Gabriel e Malu Rodrigues (a Wanderléa) cantam com a própria voz e mandam muito bem. Eles também evocam o estilo característico dos personagens sem que pareçam caricatos.

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Quanto às atuações, Chay Suede está ótimo no primeiro ato, pois consegue transparecer a malandragem e o carisma de um Erasmo em busca do sonho dourado do rock and roll. As quebras da quarta parede – que só acontecem no início do filme – deixam isso ainda mais evidente e Chay realmente consegue conquistar o público. O ator também faz um bom trabalho no segundo ato, aquele em que o Tremendão está fascinado com suas conquistas e aproveita o que a fama tem de melhor. Só que Chay não entrega uma performance sólida nas cenas dramáticas que retratam a decadência do personagem.

Mas o longa nem tenta se aprofundar nessa questão, o que é bom, tendo em vista que as cenas com peso dramático não funcionam com Chay no papel. Mesmo assim, a trama dá margem para que a gente perceba que um filme sobre Erasmo Carlos poderia ser um estudo interessantíssimo sobre ascensão, queda e superação. Infelizmente, “Minha Fama de Mau” passou longe de aproveitar essa chance.

Seguindo a análise sobre o elenco, a grande surpresa é Gabriel Leone, que está muito bem como Roberto Carlos. Malu Rodrigues é mal aproveitada pelo roteiro e, assim como Bruno De Luca (Carlos Imperial), cumpre um papel meramente funcional na trama. É uma pena, pois dá vontade de saber mais sobre ela. Bianca Comparato está bem, mas seu papel é a coisa mais confusa do filme – em resumo, ela interpreta quatro personagens que são uma só. Um destaque inusitado no elenco é o novato Vinícius Alexandre, que interpreta Tim Maia e rouba todas as cenas em que aparece.

Ao final, “Minha Fama de Mau” entrega um início promissor, cheio de agilidade e carisma, mas que perde força gradativamente e culmina em um final apressado e morno. Em linhas gerais, o filme é muito agradável aos olhos e aos ouvidos, mas ele não consegue contar a história do protagonista de uma maneira verdadeiramente relevante – que é o que se espera de uma cinebiografia.

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