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O jornalismo que transforma de Maju Coutinho

Ativismo, cultivo da esperança e educação contra a desinformação são alguns dos focos da jornalista

Por Luanda Vieira
Atualizado em 23 ago 2023, 15h15 - Publicado em 21 ago 2023, 10h36

Esta semana você pode ver Maria Júlia Coutinho, 45 anos, ao vivo no Fantástico usando tranças, na próxima com o seu afro natural e na outra com dreads. Começamos esta entrevista trocando experiências capilares, mas não por acaso a jornalista vê o Show da Vida, programa que completa 50 anos agora em agosto, com a mesma versatilidade. “Ele é um mosaico de informações, curiosidades e entretenimento que já está consolidado no imaginário da população e, para mim, profissionalmente, é muito interessante fazer parte deste formato.”

O caminho para chegar à apresentação foi consequência da soma de sua paixão imediata por telejornalismo na faculdade, mais terapia para lidar com as expectativas de crescimento na carreira e uma pitada de ouvidos para a sua primeira audiência, em seu estágio na TV Cultura, afirmando que ela poderia se inspirar em Glória Maria. Filha de educadores e ativistas, Maju sempre teve a educação como ponto de partida para escrever narrativas novas e seguras, tanto na vida pessoal quanto na forma com que ela encara o jornalismo e todas as mudanças que a profissão vem sofrendo ao longo dos anos em função das novas tecnologias e da disseminação de fake news. “Eu acredito na pedagogia da notícia, que é ensinar já na escola como fazer a checagem de uma notícia falsa”, defende.

Sua primeira reportagem na TV Globo, em agosto de 2007, foi sobre o tempo seco em São Paulo, sua cidade natal, para os jornais locais. De lá para cá, Maju passou pela previsão do tempo dos jornais matinais e, depois, do Jornal Nacional; fez rodízio de apresentação no Jornal Hoje e, posteriormente, assumiu a titularidade do próprio; se tornou substituta no JN; e, há quase dois anos, está a frente do Fantástico, ao lado de Poliana Abritta. “Conforme eu fui me aproximando de alguns produtos da emissora, foi inevitável não pensar que um dia eu poderia estar exatamente onde estou. Mas, assim como na vida, a gente tem a sensibilidade do que pode acontecer, mas nunca a certeza de quais serão as movimentações.”

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O jornalismo que transforma de Maju Coutinho
Maju passou por diversas experiências na TV Globo até assumir a apresentação do Fantástico, que completa 50 anos este mês (Ilustração: JESSICA HRADEC/Reprodução)

Como chegar neste nível de reconhecimento na carreira com os pés no chão?

A terapia, que eu faço há muitos anos, me coloca num lugar de “eu estou” e não de “eu sou”. Então, eu estou no Fantástico, eu estive no Jornal Hoje, eu estive na previsão do tempo e tudo isso me ajudou a formar a Maju profissional, mas eu não sou esses produtos. Não é papo para parecer elevada, mas, para mim, é uma batalha diária não ser pega pelo truque do ego. Dentro disso tudo, ainda tem a síndrome da impostora que vive conversando comigo no divã. Eu sempre me cobro, por exemplo, de fazer a pergunta mais inteligente do mundo quando estou preparando uma entrevista, sendo que eu fiz toda a apuração, estou apta para realizar o meu trabalho. Ainda assim, me cobro ser genial.

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Pensando que você sempre teve consciência e letramento racial, por ter crescido dentro de movimentos negros ao lado dos seus pais, você tem a preocupação em separar a Maju jornalista da Maju ativista?

Acredito que não existe essa separação nítida porque quando têm assuntos que me tocam e têm que ser abordados, tento entrar com o meu olhar sobre eles sempre dosando qual é a melhor forma de retratar um assunto como o racismo para o público do Show da Vida. Tenho conversado bastante em um dos grupos de movimento negro que participo e feito um exercício importante, mas difícil, que é de como transformar uma narrativa que tende a ser de dor em algo positivo e esperançoso. Idealmente, eu gostaria de não precisar me deparar com essas pautas. Mas, como o racismo ainda é muito presente na sociedade brasileira e no mundo, sei que é utopia.

Para você, o que o Fantástico representa para a comunicação brasileira?

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Ele é vanguardista. Isso porque o programa envelopa o que está no inconsciente coletivo e coloca os conceitos na boca das pessoas, além de aprofundar os fatos mais importantes da semana e, também, trazer curiosidades e entretenimento. Não à toa, as matérias que vão ao ar são bastante repercutidas ao longo da semana. Para quem é jornalista, por exemplo, é uma possibilidade interessante de transitar por vários assuntos, como quando entrevistei Francia Márquez, primeira vice-presidente negra da Colômbia; e até quando têm as nossas participações, como eu de sereia ou a Poliana de bruxa.

Estar no programa era um desejo?

Passava pela minha cabeça como uma meta quase impossível, mas o que aconteceu foi um misto entre me descobrir no telejornalismo e, consequentemente, o Fantástico ser um lugar que qualquer pessoa com esse perfil gostaria de estar; e ter a figura da Glória Maria. Desde que eu comecei a aparecer na televisão, eu ouvia que seria a Glória Maria, não num lugar de substituta, mas de caminho para ser trilhado. Então, foi uma semente germinada pela audiência. Eu acho que, muitas vezes, os nossos caminhos e escolhas são uma mistura entre o que a gente quer e o que os outros dizem. Você vai moldando tudo isso junto com a questão das circunstâncias que fazem com que as coisas aconteçam.

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“Recebo devolutivas de meninas negras que passaram a gostar de seus próprios cabelos vendo a minha imagem na TV. Colaborar com a aceitação de um ser humano é uma coisa muito importante”

Quanto mais você foi ganhando destaque na TV, mais você foi sendo alvo de críticas nas redes sociais. É difícil lidar?

Eu sempre tive muita clareza que quanto mais você atinge um grau de exposição prolongada, que é o meu caso, mais críticas você recebe. É natural, mas aí você respira e segue em frente porque não tem o que fazer. Hoje, eu mantenho a minha rede social ativa, mas não olho os comentários detalhadamente. Você enxerga o seu trabalho como um legado? Nunca pensei nisso. Em um primeiro momento, eu falaria que o meu legado é que o meu trabalho tenha contribuído para um mundo mais justo, mas quando vejo outras coisas, entendo que esse legado vai se fazendo sozinho. Por exemplo, quando eu recebo uma devolutiva (que são várias) de meninas negras que passaram a gostar de seus próprios cabelos vendo a minha imagem na TV. Pode ser que eu não mude o mundo com as minhas reportagens, mas colaborar com a aceitação de um ser humano é uma coisa muito importante.

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Maju Coutinho
“Recebo devolutivas de meninas negras que passaram a gostar de seus próprios cabelos vendo a minha imagem na TV”, conta. (Ilustração: JESSICA HRADEC/Reprodução)

E como foi a sua experiência com o seu cabelo na TV, sendo um ambiente que sempre priorizou a padronização?

Até que foi tranquila, porque os momentos de maior violência eu vivi em salões de pessoas brancas que não entendiam o fato de eu gostar do meu cabelo natural, como se fosse inconcebível uma pessoa negra se achar bonita. Usei trança durante boa parte da minha adolescência, inclusive, no meu primeiro estágio, na TV Cultura, fui ao ar com o cabelo trançado. Parei de usar aos 24 anos, momento que eu realmente conheci o meu cabelo natural. Tive um momento de ceder ao amaciamento [técnica capilar que prometia soltar os cachos] e de usar babyliss, mas sempre mantendo o aspecto cacheado. No Jornal Hoje e na previsão do tempo do Jornal Nacional, usei ele natural e, agora no Fantástico, acredito que tenha espaço para eu brincar mais. Então, faço trança, dread e recentemente dei uma clareada, coisa que nunca tinha feito.

“É uma batalha diária para não ser pega pelo truque do ego. Ainda tem a síndrome da impostora, que vive comigo no divã. Sempre me cobro de fazer a pergunta mais inteligente do mundo”

Qual é a importância do jornalismo num país com tantas transformações sociais e com as transformações de tecnologia?

Eu acredito que o jornalismo sempre vai ser item de primeira necessidade, porque a informação é extremamente relevante para a sociedade avançar e melhorar. Porém, isso interage com vários desafios que, hoje, para mim, são dois principais:  a inteligência artificial, um negócio que me assusta e eu ainda estou tateando no assunto, porque é avassalador ter que lidar com algo que pode fazer o nosso trabalho; e a mentira, que sempre existiu, mas não desta forma frenética de disseminação industrial da fake news. Por isso, acredito na abordagem pedagógica, já nas escolas, para aprender a detectar uma notícia falsa. Eu vejo que o nosso papel é ser cada vez mais transparente no nosso processo de produção para que o público saiba diferenciar uma notícia confiável da inventada.

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