Duda Beat: por trás do belo (e doloroso) processo de “Tara e Tal”
Duda Beat mergulha em crises existenciais e dilemas da indústria fonográfica para criar Tara e Tal, o disco mais autêntico e dinâmico de sua carreira
Duda Beat se autodenomina, orgulhosamente, uma cantora “pop alternativa”. A afirmação, sem dúvidas, não poderia ser mais verdadeira. Desde que estourou no cenário musical com Sinto Muito, seu álbum de estreia, em 2018, a cantora recifense vem trazendo canções acessíveis sem abrir mão de uma abordagem vanguardista.
Sons contemporâneos, acenos às suas raízes nordestinas, moda maximalista: todos esses aspectos, ao longo dos anos, vêm ajudando Duda a firmar o seu lugar singular na indústria fonográfica. Em seu segundo disco, Te Amo Lá Fora, Beat expandiu ainda mais a proposta de unir o novo ao usual, colecionando sons que vão do house ao coco, passando por reggae e piseiro.
Porém, é em Tara e Tal, terceiro álbum de sua carreira (lançado em abril deste ano), que a cantora parece ter finalmente encontrado a confiança necessária para permitir que o público conheça o ser humano por trás da estrela.
Isso não significa, claro, que Duda não tenha as suas próprias ressalvas em relação à maneira com que a indústria absorve e repercute os seus posicionamentos artísticos. “O grande desafio de ser vulnerável é que, ultimamente, o negócio não é mais sobre música. Isso me dilacera, porque eu apenas sei fazer música”, declara.
O grande desafio de ser vulnerável é que o negócio não é mais sobre música. Isso me dilacera, porque eu apenas sei fazer música.
Duda Beat
Aqui, a cantora se refere a uma mídia que, constantemente, fortalece a ideia de que a vida pessoal de uma personalidade pública deva ser mais relevante do que o seu próprio trabalho.
“É difícil encontrar um balanço. Tento me manter reservada fora do estúdio, esquivando de polêmicas que possam fortalecer as demandas do sistema.”
Duda Beat contra as engrenagens
Tal pensamento faz com que, vez ou outra, a cantora seja “deixada de lado” na grande máquina que mantém o pop nacional rodando. Duda tem total consciência disso e está disposta a pagar o preço por ser, de certa forma, uma rebelde contra a demanda por comportamentos escandalosos e abordagens sonoras enlatadas.
“As plataformas têm medo de apostar em algo diferente. Eu sinto falta de ligar o rádio e conhecer novos artistas. Há uma necessidade de repercutir os mesmos nomes para garantir a audiência”, diz.
Mesmo com os gigantes da indústria tentando estabelecer limites e receitas mágicas, Duda Beat afirma que, “aos trancos e barrancos”, é possível ultrapassar barreiras. Mas para que esse processo se torne menos tortuoso futuramente, a cantora declara que todos, sem exceção, devem continuar fortalecendo as minorias, incluindo os movimentos feministas, nordestinos e LGBTQIA+.
“Eu sinto que faço isso através de meu trabalho. Pode parecer que não, mas quando furei a bolha do underground e migrei para o mainstream, incentivei muitos que sonham em fazer sua música sem fórmulas a não desistir. Quando abrimos as portas para nós mesmas, permitimos que uma multidão entre conosco”, declara.
Uma vez em território comercial, a pressão interna e externa por resultados se mostra presente a cada passo. Para lidar com as expectativas, tenta focar apenas em si mesma durante o processo criativo.
“Se eu vou compor um disco novo, não fico ouvindo o que está bombando. Preciso ser influenciada apenas com o que está em meu coração, pois pode ser muito fácil cair na história das fórmulas e dos números”, afirma.
O universo criativo de Duda
Apenas de observar as belíssimas fotos presentes nestas páginas, já é possível captar que Duda possui um senso estético visualmente avassalador. Aliás, quem é fã da nordestina sabe o quanto os seus videoclipes e discos vêm sempre carregados de referências de alto padrão e metáforas visuais bem desenvolvidas.
“A minha conexão com o audiovisual vem do desejo de materializar o que sinto na música. Para o Tara e Tal, me inspirei muito no cineasta Alejandro Jodorowsky (A Montanha Sagrada, de 1973), que traz essa proposta bastante surreal para a sétima arte”, revela.
O frequente ímpeto da cantora em flertar com o surrealismo tem raízes em sua ambição pela mescla de sonoridades. “Em uma das canções, eu misturei rock n’ roll pesado com música latina. Isso é algo muito surreal”, explica.
Vale apontar que, na capa de seu disco mais recente, a popstar aparece vestindo um figurino futurista em meio a um deserto onírico. Aqui, Duda afirma que a proposta foi mostrá-la em um terreno árido onde “tudo poderia florescer”, em uma clara (e criativa) referência ao histórico de luta de seu povo.
O mais surpreendente, porém, é descobrir que toda a exuberância e imaginação por trás dessas criações partem de um lugar de dor: “Eu estava super deprimida antes de iniciar esse projeto, descrente da indústria. Cheguei em um momento em que pensei: ‘Será que adianta eu fazer um trabalho maravilhoso se eu não for atingir as pessoas?’”, conta.
Redescobrindo propósitos
Em meio a uma verdadeira crise profissional e existencial, Duda revela que precisou se convencer de que a música, em primeiro lugar, era uma plataforma de cura para o seu espírito. “A arte me convence a acreditar em coisas que me fazem sair do buraco. É uma autoterapia”, declara.
Assim que se agarrou a esse pensamento, o primeiro passo de Duda foi viajar para uma ilha ao lado de seus produtores a fim de mergulhar na criação das novas faixas. “Eu sempre costumo fazer imersões artísticas em lugares frios, mas desta vez, quis ficar perto da praia no intuito de desenvolver algo mais solar. Quando cheguei lá, choveu por quase todos os meses”, conta, aos risos.
A arte me convence a acreditar em coisas que me fazem sair do buraco. É uma autoterapia. Em todas as novas canções, eu estou me deparando com dilemas em meio a batidas animadas.
Duda Beat
Segundo a cantora, essa foi a maneira que o universo encontrou para mostrar que, para reencontrar o seu propósito, ela precisaria encarar algumas sombras.
“Se você prestar atenção, em todas as novas canções, eu estou me deparando com dilemas em meio a batidas animadas. Esse foi um movimento que me puxou para si”, diz.
Para a estrela, essa vivência sutil e metafórica experimentada durante a viagem conversa com a beleza do que é estar viva. “Tudo é sobre impermanência, e é importante entender isso. Ninguém estará sempre no alto, ninguém estará sempre em baixo. A nossa trajetória não é uma constante subida. Há horas em que você estaciona, momentos em que você desce um pouquinho. E está tudo bem”, afirma.
Aos 36 anos, a cantora explica ter adquirido essa sabedoria ao acolher todas as nuances de seu emocional, incluindo os sentimentos de baixa autoestima que a colocaram no “fundo do poço”, segundo sua própria avaliação.
Ela complementa: “Não há evolução sem sofrimento. O questionamento nos leva à mudança. Obviamente, há muita terapia envolvida nesse processo”.
O futuro de Duda Beat
Passados os aprendizados emocionais que orbitaram o universo de Tara e Tal, Duda Beat revela já estar preparando o terreno para o seu próximo projeto musical — que, desta vez, deve mirar em uma energia que a artista define como “solar”.
“Eu entreguei um disco muito noturno, né? O ‘Te Amo Lá Fora’ também tinha essa atmosfera de noite. O ‘Sinto Muito’ era quase um fim de tarde. Agora, eu preciso encontrar alguma forma de chegar nesse período da manhã.”
Se os novos álbuns da artista serão ensolarados, não sabemos. Porém, algo é evidente: o estado de espírito da cantora definitivamente encontra-se em um lugar de luz — algo que Duda vem se certificando de preservar.
“Sempre que posso, acordo de manhã e aproveito a natureza em um parque perto da minha casa. É necessário desacelerar em tempos atribulados. Isso faz com que a gente, de fato, se conecte com a realidade, pois ela está aqui, o tempo todo.”
Escute Tara e Tal, o mais recente disco de Duda Beat, abaixo:
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