O clássico livro da escritora inglesa Virginia Woolf, Um teto todo seu, estudado e lido em todo o mundo, toca num ponto fundamental para a autonomia das mulheres – as de agora ou de antes: a necessidade da existência de um espaço, físico e simbólico, para que possam escrever. Ou, ouso dizer, para que possam ser autoras da própria vida.
Gosto de pensar que escrever é a ponta de um Iceberg. Uma ponta e tanto, que defendo e recomendo a todas, porque é afiada e profunda! Mas não podemos nos iludir: há muito por debaixo da camada superficial de gelo que se vê de longe. Para uma mulher escrever, é preciso muitas coisas. Vejamos.
Antes de mais nada, precisamos nos entender como seres desejantes e capazes de expressar esses desejos em palavras e histórias. E, para isso, temos que transpor uma infinidade de barreiras que nos levam a crer que o ordinário de nossas vidas não é relevante nem digno de ser contato.
Temos que nos autorizar a rabiscar textos autorais e aplicar o que chamo de “técnica da desimportância”, nos desafiando à liberdade de escrever livremente, sem um compromisso rigoroso com o resultado. Tudo para tentar calar os censores internos e trabalhar sem expectativas – a fim de evitar bloqueios criativos, filhotes do perfeccionismo paralisante.
Outro aspecto fundamental e de esforço homérico (para criar um paralelo sarcástico) é encontrar tempo, silêncio e espaço – combo que raramente se compõe em conjunto. Onde há um falta o outro, e o que se consegue é, no máximo, a possibilidade de seguir “apesar de”. Assim, se “apesar de” você conseguir concatenar ideias e formar algumas frases, celebre! Mesmo que não tenha familiaridade com o ato de celebrar pequenas conquistas pessoais, especialmente as que não são reconhecidamente úteis ou altruístas.
Escrevo este preâmbulo literato-filosófico de quinta categoria, para contar que esta Coluna – “apesar de” muitas coisas — completou um ano de existência e agora vai mudar de nome. Aqui apresentei minha jangada, confessei medos, revelei dores e despedidas, calei e falei. Fui cronista, comentarista e investigadora da alma humana — meu esporte favorito.
Neste espaço, pude experimentar-me como escritora e mulher. Pude entender que Travessia, nome que batizou esse espaço nos últimos 12 meses, era a minha própria busca, não somente pela posse subjetiva deste teto, mas pelo direito de ter nele minha escritura de papel passado.
Por isso, abro agora uma nova fase nesta casa com assinatura pessoal e firma reconhecida. A partir de hoje, a coluna Travessia passa a ser e ter um nome todo meu: Dani Moraes. Assinar um espaço como este simplesmente com o meu nome, e nada mais, diz muito sobre minha jornada de autodescoberta e realização — que se cumpre no tempo da delicadeza. Diz da coragem de me apresentar aqui de cara lavada. Diz do meu desejo de ser mais eu – nas palavras, nas emoções e na vida – e de ser espelho pra caminhada de quem busca a ocupação de si.
Hoje esta Coluna de Dani Moraes em Cláudia é pura festa. Comemoro um ano que nasci, cresci e finalmente registro aqui meu nome. Ao me nomear te convido a ser também seu próprio teto e ter, em qualquer canto, um nome todo seu.