Só Deus sabe como cheguei ao final do ano. Eu me sentia “atropelada”. Por todo tipo de veículo, motorizado ou não. Teve atropelamento feliz, em velocidade de chuva de bênçãos, como na ocasião do lançamento da minha plaquete “Nunca mais para sempre” – minha primeira publicação oficial como escritora, com direito a editora, ficha catalográfica, contrato assinado e lançamento durante a Festa Internacional do Livro de Paraty (FLIP).
Naquele dia, tão importante para mim, ganhei uma surpresa da minha família, que desabou de São Paulo até lá só pra me prestigiar. Nada foi mais lindo do que isso: receber ali o olhar do meu companheiro e das minhas filhas, que dividem o sal dos dias comigo, testemunhando a primeira dedicatória que escrevi na vida – com a letra trêmula e o coração acelerado.
Chovia. Muito. Tanto que a cidade se apagou num longo blackout. Oxum e Iemanjá – divindades das águas doces e salgadas – se fizeram presentes e cúmplices do passo inicial da minha caminhada literária.
Porque foi isso que essa publicação representou para mim: meu sim. A aceitação da sina que faz das palavras o leito do meu rio – sempre em direção ao mar e em comunhão com a proteção e a força do invisível.
Não faltaram os atropelos do tempo, do medo e das perdas. A exaustão e o questionamento, afinal eu sou eu e, assim sendo, duvido, pondero, reflito, penso mais uma vez.
Houve também oportunidade de afirmação, lugar de coragem e terra conquistada para fincar a bandeira azul-firmamento.
Na virada do ano, não consegui me conectar com os planos para 2024. Por algum tempo, não compreendi a razão e, simplesmente, não conseguia imaginar o porvir.
Agora entendo: meu nível de cansaço era tamanho que não havia espaço mental nem emocional para criar. E, então, meu conhecimento sobre saúde criativa me apontou um convite certeiro: a pausa.
Para criar é essencial também não criar. É preciso deixar adormecer os pensamentos, dar tempo aos movimentos de fazeção, esvaziar.
Dei a mim o direito ao repouso. Li com as pernas pra cima, mas, principalmente, mudei de foco. Me permiti pensar em coisas leves, divertidas, organizar a casa, aquarelar, não escrever.
Compreendi que o hiperfoco precisava de respiro e que, quando me desfaço da fantasia de ser uma usina incansável de ideias, projetos e intenções, nutro a alma e encontro sentido, além das atitudes.
Abrir espaço para não saber exatamente para onde ir, foi fundamental para que eu conseguisse enxergar o tanto que caminhei nos últimos tempos.
Hoje estou pronta e disponível para a colheita. Porque, sim, eu semeei. Sim, eu reguei. Sim, tirei as ervas daninhas. Sim, lidei com as intempéries. Sim, temi, mas persisti.
Agora recebo com respeito o tempo de frutificar. E te convido a me acompanhar, pois a vida é melhor quando compartilhamos e dividimos os nossos frutos – sejam em porções de palavras ou silêncios.
Agora está claro: meu plano para 2024 é fazer piqueniques. Aceita o meu convite?