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Ela criou o Bumble, app de relacionamento em que a mulher começa o papo

Criadora e CEO do Bumble, a norte-americana Whitney Wolfe Herd festeja suas vitórias e recusa comparações com outras mulheres

Por Isabella D'Ercole Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
26 Maio 2021, 10h00
Whitney no Bumble
 (Kristen Kilpatrick/Divulgação)
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a década de 1880, nos Estados Unidos, Victoria Woodhull se tornou uma das primeiras corretoras de ações do país – e, obviamente, encarou críticos ferrenhos e ataques machistas. Aos 31 anos, ela era milionária.

Depois, usou o dinheiro em sua campanha ao se tornar a primeira mulher candidata à presidência do país. Sufragista, defensora dos direitos das mulheres, seu esforço, junto com o de outras companheiras, abriu o caminho para as gerações seguintes.

Em fevereiro deste ano, com o filho Bobby Lee, de 1 ano, no colo, Whitney Wolfe Herd sinalizava na Nasdaq, a bolsa de valores norte-americana, que seu negócio, o Bumble, a partir dali, era uma empresa de capital aberto.

O anúncio a tornou, aos 31 anos, bilionária e também a CEO mais jovem a abrir o capital de uma empresa na bolsa. O feito deve ser comemorado – Whitney fez isso em casa, jantando com o marido – mas, como a empresária mesmo destaca, também é importante pensar o que significa para outras mulheres e para ela esses marcos destacados pela imprensa do mundo todo.

Para quem não conhece, o Bumble é um aplicativo de relacionamentos lançado em dezembro de 2014. O diferencial é que apenas as mulheres podem iniciar conversas, uma tentativa de combater as desigualdades existentes em relações heterossexuais entre homens e mulheres.

Whitney na sede do Bumble, com o escritório colorido ao fundo
(Kristen Kilpatrick/Divulgação)
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Isso evitaria comentários indesejados, assédio e daria às mulheres o controle sobre o início do diálogo. “A proposta era considerada meio doida em 2014, e isso só faz sete anos. Esse fato já mostra a revolução do Bumble, como ele pode causar abalos sísmicos”, disse Whitney em entrevista a CLAUDIA.

Superpopular nos Estados Unidos, o aplicativo rapidamente se tornou uma rede diversa, usada para relações de amizade e até profissionais – logo no cadastro, você pode definir a sua intenção. Celebridades como a tenista Serena Williams e a atriz Priyanka Chopra Jonas endossam o app e também compõe o fundo de investimentos originado dele.

Nos últimos anos, o Bumble apresentou outras ferramentas para aumentar a segurança e melhorar a usabilidade – este ano, baniu o body shaming. Pessoas que fizerem comentários gordofóbicos, racistas, homofóbicos ou falarem qualquer coisa relacionada ao corpo de alguém num comentário são advertidas. Se a situação se repetir, o perfil é excluído.

Antes de criar o Bumble, Whitney foi uma das fundadoras do Tinder. Ela saiu do negócio em 2014 e, em seguida, processou a empresa e o grupo do qual o Tinder faz parte por assédio sexual. No processo, anexou uma série de troca de mensagens com um de seus colegas, com quem manteve um relacionamento por um ano e que, após o término, passou a ameaçá-la diariamente.

Como envolvia um produto tecnológico muito em alta na época, a questão se tornou de grande interesse público, deixando Whitney exposta e vulnerável. Ela não fala, mas jornais afirmam que ela recebeu pouco mais de um milhão de dólares no acordo final.

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Tendo deixado esse período turbulento para trás, ela agora pensa em outras maneiras do Bumble impactar a sociedade, especialmente na luta contra o machismo. Colaborou, por exemplo, para a aprovação de uma lei no estado do Texas que transforma em crime o envio de nudes não solicitados.

“Nós ouvimos as pessoas, repensamos o que não é certo no mundo das relações e tentamos achar uma solução para que isso não se repita dentro do app. Queremos evitar as dificuldades do dia a dia feminino”, explica Whitney. A CLAUDIA, ela falou sobre o aplicativo, que começa a ganhar mais popularidade no Brasil, os aprendizados como executiva e a tentativa de combater padrões impossíveis impostos às mulheres.

“Estou trabalhando nisso há anos e, em muitos dias, achei que meu negócio não ia dar certo. Em outros, cheguei a pensar que não conseguiria ter filhos”

 

 

A foto que mostra você, na Nasdaq, segurando seu bebê e abrindo o capital da sua empresa (na página anterior) circulou o mundo. Como se sentiu naquele momento?

Foi um marco na minha vida; parecia surreal, mas também me deu enorme alívio. Eu estou trabalhando nisso há anos e, em muitos dias, achei que meu negócio não ia dar certo. Em outros, cheguei a pensar que não conseguiria ter filhos. Foi gratificante.

Porém, diferentemente do que vi circulando, não acredito que o discurso atrelado à foto seja: “Se ela conseguiu, toda mulher tem que abrir o capital da sua empresa antes do filho completar 2 anos”. Não é realista. Nem todo mundo pode ganhar o US Open e ter um bebê, como a Serena Williams.

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A mensagem deveria ser: se você tiver um objetivo e trabalhar nele, você pode conseguir. Para algumas mães, isso significa se formar na faculdade; para outras, é só passar pelo dia. Temos necessidades diferentes. Precisamos estimular as mulheres a acreditarem nelas mesmas e a serem resilientes, independentemente do objetivo que tiverem.

Polaroid de momento da abertura da empresa na bolsa norte-americana
(Instagram/Reprodução)

Muitos veículos que cobrem a área de economia exaltaram o fato de você ser mulher e a sua idade em vez do valor ou da história da sua empresa. Acha que essa é uma abordagem errada à sua realização?

Eu acho que meu negócio é impressionante independentemente de ter sido criado por uma mulher. Às vezes, parece que é uma tentativa de reduzir o feito, soa como “É um bom resultado para uma mulher de 31 anos”. Entendo a natureza histórica e o marco em ser a primeira, mas acho mais importante celebrarmos as próximas. Vamos encorajá-las, investir no negócio delas.

Além disso, não tenho o menor interesse em me tornar uma expectativa impossível para as outras, criando uma barreira de idade, por exemplo. Nunca é tarde para realizar seu sonhos ou ter sua família. Não acredite em limite de idade.

Há uma pressão muito grande para que as mulheres atendam padrões impossíveis. Somos muito mais julgadas do que os homens, é como se um passo em falso pudesse nos derrubar e esse sentimento é assustador. Não acho que os homens sintam isso e alguns deles, os predadores, deveriam.

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Esse medo, em partes, é culpa dessa cultura do cancelamento, estimulada também pela mídia. Vemos muitas líderes sendo criticadas e isso também assusta as mulheres que estão tentando fazer seu trabalho, ser uma boa mãe.

Por outro lado, há dez ou até mesmo cinco anos atrás, uma narrativa de mulher CEO não existia. É bom ver normalizado. Quando eu tinha 25 anos, ouvia das pessoas: “Você não vai reduzir o ritmo ou parar de trabalhar para ter filhos? Não quer uma família?”. Um homem nunca receberia essas perguntas.

O que eu espero é que minha história possa abrir os olhos das mulheres e inspirá-las a não escolher entre uma coisa ou outra, porque não é justo. Você pode fazer tudo se tiver amor e acolhimento da sua comunidade.

“Meu negócio é impressionante independentemente de ter sido criado por uma mulher. Além disso, não tenho interesse em virar uma expectativa impossível para outras”

 

 

As mulheres costumam sentir culpa fazendo ou não essa escolha. Você se sente assim às vezes?

Já sofri muito com isso. Sentia culpa por não responder um e-mail antes, por passar 15 minutos a mais numa atividade. Eu decidi que isso acabou. Tem poucas coisas que podemos controlar no mundo e uma delas é o que sentimos. Para mim, a culpa não é mais uma opção. Se eu fizer algo errado, peço desculpas. Mas não vou me sentir culpada pela minha existência, por pedir para meu marido ficar uma hora a mais com nosso filho enquanto faço uma reunião. A culpa não ajuda em nada.

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Whitney no Bumble
(Kristen Kilpatrick/Divulgação)

Qual lição aprendeu e carrega com você?

Gosto de estar cercada por pessoas que sabem mais do que eu, que possam me educar e me desafiar. Para isso, tive que me treinar a ouvir. Mas é um ótimo indicador. Se eu souber mais do que todo mundo, é hora de trocar a sala.

Segundo a descrição, os valores da sua empresa são generosidade, respeito e igualdade. Não se fala em produtividade ou lucro. Isso tem a ver com suas experiências anteriores?

Vejo muita gente com 20 e poucos anos com medo do fracasso, do julgamento. Eu passei por um processo com grande atenção pública muito jovem, fui julgada e considerada um fracasso sob alguns critérios da sociedade. Mas, porque eu caí do cavalo, perdi o medo. E aí me joguei com tudo no que tinha que fazer.

Então falo para os outros viverem ao máximo o que puderem, porque o maior fracasso é nunca tentar. No Bumble, priorizamos o bem-estar dos funcionários, mas sei que nenhuma empresa é perfeita. Estamos sempre trabalhando para nos aperfeiçoarmos. No momento, isso inclui a criação de canais de denúncias com anonimato garantido e o fortalecimento de uma cultura de confiança para que as pessoas não sintam medo de serem constrangidas ao expor um problema. Não tem a ver com experiências prévias, mas com o que eu acredito.

Estou com câncer de mama. E agora?

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