ONG ajuda a inserir refugiados no mercado de trabalho brasileiro
Projeto "Estou Refugiado" ajuda pessoas a encontrarem empregos no setor em que são qualificadas
Em 2015, a vida de Luciana Capobianco, 51 anos, mudou quando a paulistana se deparou com a latente questão dos refugiados no Brasil e criou o projeto Estou Refugiado – iniciativa em parceria com Gisela Rao que promove a inserção de pessoas refugiadas no mercado de trabalho nacional.
O principal objetivo da ONG, de acordo com ela, é inserir o refugiado dentro do setor em que ele se profissionalizou em seu país de origem. “Temos ofertas de emprego generosas e outras que devem ser vistas com cuidado. A questão do Estou Refugiado é mostrar que temos engenheiros e costureiras e perguntamos se existe empregos de engenheiro e de costureiras nas empresas“, explica.
Sócia da agência de comunicação Plano Digital, a publicitária resolveu tomar para si a causa ao ter conhecimento do grande fluxo migratório de pessoas refugiadas que buscavam em solos brasileiros um futuro melhor.
De acordo com o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), o número total de solicitações de refúgio aumentou mais de 2.868% entre 2010 e 2015 – quando saltou de 966 solicitações para 28.670. Atualmente, o Brasil tem 8.863 refugiados reconhecidos.
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O cenário comoveu Luciana e a qualificação profissional dessas pessoas atraiu sua atenção: são economistas, contadores, empresários com dificuldades para se estabilizar no país. “Eu percebi que tinha muito preconceito, muita xenofobia. Na época, via muitos questionamentos do tipo ‘será que ele é do bem?’ só por causa da religião de uma pessoa ou porque uma mulher usava o véu islâmico. Tinha muito racismo também. Então o projeto surgiu como uma vontade de ajudar essas pessoas.”
A partir dessas constatações, a publicitária resolveu os dados em uma campanha de sua agência. Nascia o projeto Estou Refugiado.
A primeira ação da iniciativa foi a produção de um vídeo com um teste social na rede social de relacionamentos Tinder. Nele, o refugiado Afonso cria um perfil e coloca em sua descrição características como “formado em letras”, “tecnólogo em mecatrônica”, “falo 5 idiomas”, “gosto de literatura e slow music” e “estrangeiro”.
A proposta do vídeo é mostrar como a característica “refugiado” pode impactar o cotidiano das pessoas. “O perfil do Afonso tinha recebido uns 30 matches. Então mudamos a palavra de estrangeiro para refugiado. Tivemos três matches. Por isso encerramos o vídeo mostrando que o preconceito acaba com a compreensão.”
Felizmente, tal compreensão pôde ser percebida com a repercussão de outro vídeo: o que conta a história de Mamie, 39 anos, cinegrafista refugiada da República Democrática do Congo. “Depois que soltamos o vídeo, recebemos ofertas de trabalho de empresas. Em um ano, tivemos aproximadamente 500 ofertas. Mas percebemos que não daria para direcionar os refugiados a esmo.” (As empresas podem procurar a ONG e cadastrar suas vagas pelo email: destino@estourefugiado.com.br)
No começo do projeto, Luciana contou que a iniciativa ajudava 40 refugiados – que vêm de diferentes partes do mundo, como América Latina, África e Oriente Médio. “A previsão é que esse número chegue a 100 até nosso evento no Dia do Refugiado, no Museu do Amanhã, no Rio, onde estaremos com nossa máquina de currículos.” (Os currículos também podem ser enviados para o email: cv@estourefugiado.com.br)
Além de oferecer o serviço para a produção de currículos para quem procura a ONG, o Estou Refugiados também disponibiliza recursos financeiros para que essas pessoas possam bancar seu deslocamento até as entrevistas de emprego. “Nós criamos crowdfunding chamado ‘Passe para Frente’, há um tempo, e até hoje usamos o recurso para bancar o transporte dos refugiados para as entrevistas.”
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Outro incentivo que o projeto procura dar aos refugiados que o procuram é incentivá-los a empreender. “Tem a história do Cristiano que trabalha com couro e chegou com uma bolsa do material aqui. Juntos, fizemos uma consultoria para que ele possa melhorar o seu produto para vender. E então, mostramos que metade do dinheiro ganho pode ficar com ele e metade investido em seu trabalho.”
Luciana entende o quanto é difícil o recomeço da vida dos refugiados por causa do passado de sua família. “E sou descendente de judeus russos que fugiram das perseguições. Então eu sei bem na pele o que é fugir e chegar em um lugar e não ter nada“, finalizou.