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O que é masculinidade tóxica e como ela influencia crianças desde o berço

Meninos criados em meio a ideologias machistas têm dificuldades de expressar seus sentimentos e podem se tornar adultos violentos.

Por Gabriela Sartorato
Atualizado em 22 abr 2024, 08h36 - Publicado em 8 nov 2019, 17h36
 (Thais Rodrigues/MdeMulher)
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“Homem não chora”, “seja homem!”, “menino veste azul e menina veste rosa”. Essas são algumas das frases repetidas frequentemente para as crianças, que apesar de parecerem inofensivas, contribuem para a formação moral dos meninos. E o que acontece quando o sexismo e repressão dos sentimentos são estimulados desde a infância? A formação de adultos com um comportamento violento, influenciados pela masculinidade tóxica da sociedade.

Estes meninos crescem acreditando que o ideal de homem é aquele que não fala sobre o que sente, parte para a violência na hora de resolver seus conflitos e tem grande propensão a discriminar tudo que lhe é diferente.

As consequências estão nos altos índices de violência contra a mulher e comunidade LGBTQI+. Em 2018, 1,6 milhão de mulheres foram espancadas ou sofreram tentativa de estrangulamento no Brasil, de acordo com levantamento realizado pelo Datafolha. No mesmo ano, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos elaborou um relatório sobre a violência  contra as pessoas LGBTQI+, o qual concluiu que a cada 16 horas uma pessoa é vítima de crimes relacionados a orientação sexual no Brasil.

O tema “masculinidade tóxica” foi o conceito explorado no curta “Boys Don’t Cry”, produzido pelas agências Bensimon Byrne e Narrative, dirigido por Hubert Davis, profissional que já foi inclusive indicado ao Oscar. O objetivo era mostrar como um garoto sofre os impactos da masculinidade tóxica ao longo de toda a sua infância e adolescência, para o movimento canadense White Ribbon, que luta pelo fim da violência masculina contra meninas e mulheres no país.

 

Mas afinal, o que é “masculinidade tóxica”?

De acordo com Isabela Venturoza, antropóloga e integrante do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, o termo “masculinidade tóxica” designa a construção histórica que dá sentido ao que é ser homem para a sociedade patriarcal. “Seria a expectativa que grande parte da sociedade coloca sobre os sujeitos homens de como devem ser, se comportar, o que podem sentir etc. Isso vai gerando muito sofrimento: para si, para os outros homens e para as mulheres”, afirma Venturoza.

O coletivo possui um grupo chamado “Núcleo de Masculinidades”, responsável por conduzir reflexões semanalmente com homens denunciados por crimes da Lei Maria da Penha. O objetivo do núcleo é debater questões fundamentais relacionadas à masculinidade tóxica, como gênero, métodos contraceptivos, violência de gênero, paternidade, trabalho e família. 

A antropóloga diz ainda que este tipo de masculinidade se encontra em crise, tendo em vista que há uma espécie de incômodo ou estranhamento por parte de muitos desses homens em relação aos avanços das lutas feministas ao longo dos últimos anos.

Gustavo Nanni é um dos voluntários do núcleo e acredita que os debates construídos no coletivo são essenciais para ressignificar o que é ser homem. “Esse é um processo longo e cansativo, porque afinal é uma luta que se faz em coletivo. Não tem como um homem mudar tudo, se é a sociedade como um todo que precisa de mudança”, diz Nanni.

A masculinidade tóxica forma homens que não sabem se expressar

A psicóloga Cecilia Tavares, da Cia. da Consulta, explica que a masculinidade tóxica pode atrapalhar os homens na descoberta da própria identidade durante a infância, fazendo com que os meninos busquem um ideal de homem pautado pelos modelos masculinos que teve. 

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De acordo com Tavares, frases como “menino não brinca de boneca”, ”meu filho vai pegar todas” e “menino é agressivo mesmo, é da natureza dele” são frequentemente repetidas para as crianças e estimulam a supressão dos sentimentos, sexismo e comportamento violento. O resultado? Um adulto competitivo, com necessidade de dominar sempre as situações e com propensão a desenvolver um comportamento agressivo. 

“Por impossibilidade em demonstrar fraqueza e vulnerabilidade, os homens são muito menos propensos do que as mulheres a procurar tratamento de saúde mental. Não à toa, os homens se suicidam 4 vezes mais do que as mulheres no Brasil, de acordo com o Mapa da Violência Flacso Brasil. Eles também são ensinados a não expressar sua dor e sofrimento e, por isso, procuram menos os serviços de saúde geral. Homens são mais propensos a terem comportamentos de risco, fumam e bebem mais”, afirma Tavares.

Para o professor Fábio Mariano, doutor em Ciências Sociais responsável por ministrar o curso de Masculinidade Contemporânea na PUC de São Paulo, os homens acreditam ter de provar a todo momento que “são homens”, que seguem os ideais da sociedade patriarcal. “Seja na família, escola, religião e assim por diante. O uso do azul, a invencibilidade, a competitividade, a força, devem ser incorporadas para um ideal de homem que não falhe na vida adulta, mas que acabam sendo nocivas pois desrespeitam as diferenças entre cada um deles”, enfatiza o professor.

O que fazer diante de um modelo tão bem enraizado na sociedade? Trata-se de um problema muito complexo e sem soluções fáceis, mas um bom começo pode ser, como mãe e pai, incentivar uma criação menos pautada em “azul ou rosa”, onde os homens possam demonstrar fraqueza e fragilidade, sem correr o risco de serem julgados por isso.

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