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Como o hábito de colocar ideias no papel pode ajudar a concretizar sonhos

Colocar desejos no papel, escrevendo, fazendo listas ou usando agendas é uma estratégia capaz de nos ajudar a concretizar essas intenções

Por Daniele Moraes
18 jan 2022, 10h00

É praticamente impossível começar um ano sem parar uns minutinhos para relembrar os acontecimentos vividos ou para pensar em resoluções para o período que está por vir. Escrever uma carta de agradecimento pelas conquistas e aprendizados ou uma lista de intenções para o novo ano é uma prática mais do que divertida e simbólica: pode ser um jeito de estruturar os pensamentos e provocar atitudes.

A escritora norte-americana Natalie Goldberg, em seu livro Escrevendo Com a Alma —um best-seller referência em cursos de escrita criativa— diz que aprender a escrever “é como correr: quanto mais treinamos, melhor o nosso desempenho”.

Não é de se esperar que um belo dia, por ímpeto ou despretensão, você levante da cama, calce um par de tênis e complete de cara a sua primeira maratona —sem jamais ter dado uma mísera voltinha num trote leve pelo quarteirão. Porém, é mais ou menos essa a nossa expectativa na adoção de um novo hábito. Do dia para a noite, como que por magia, esperamos acordar prontas.

Nada funciona muito bem desse jeito. No caso da corrida, além da prática diária e do esforço de sair da cama, é preciso fortalecer a musculatura e educar o movimento. O grande segredo não parece ser bater metas de distância ou tempo, mas, sim, sustentar a constância. Escrever é mesmo bem parecido com isso.

Há quem tenha com a escrita uma relação natural de realização, alívio ou criação. Ou os que se concentrem no seu uso prático, restrito à esfera profissional. E há quem nunca tenha parado para pensar que espaço essa forma de expressão ocupa na própria vida. O fato é que com o aumento das demandas de atenção (e distração) do mundo moderno, com o estresse e a carga mental cada dia maiores, muita gente descobriu na escrita um caminho para a descompressão e até mesmo para o autoconhecimento.

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Para Fefe Resende, especialista em identidade e comunicação, falar em voz alta nos faz passar o pensamento, aleatoriamente distribuído na nuvem mental, pelo filtro da cognição. Escrever, além disso, segundo ela, organiza e materializa ideias. “Quanto mais a gente abre espaço para ganhar intimidade com esse mundo interno, mais consegue fluir, aprofundar, conectar, encontrar sentidos”. Fefe ressalta, entretanto, que essa habilidade não é um dom, mas algo que precisa ser aprendido.

“As escolas de cultivo de equilíbrio emocional, meditação e neurociência estão ensinando a gente a olhar para dentro. Quando a gente se propõe a esse exercício, cresce na habilidade de se expressar melhor e afinar o que quer colocar para fora”, diz Fefe.

A escrita é uma ferramenta que também funciona muito bem para Lella Sá, que recomenda a prática em seus cursos e atendimentos como coach e aconselhadora biográfica. “A escrita abre portais para gente poder trazer o inaudível e conseguir deixar fluir o que a gente está sentindo para tomar ações mais conscientes”.

Uma das recomendações de dez em cada dez livros ou cursos sobre escrita é transformar essa atividade em uma prática cotidiana. Há mais de 30 anos, a escritora e dramaturga Julia Cameron recomenda uma atividade de escrita chamada “morning pages” — ou escrita matinal.

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A ideia é simples: escrever três páginas à mão, sobre qualquer assunto, todos os dias como a sua primeira atividade. “As morning pages provocam, esclarecem, confortam, convencem, priorizam e sincronizam o dia. Não pense demais: basta colocar três páginas sobre qualquer assunto no papel… E, em seguida, faça mais três páginas no dia seguinte”, explica a autora.

No seu livro mais conhecido, O Caminho do Artista, Julia propõe e aponta diversos benefícios dessa prática, entre eles o alívio da carga mental e um acesso facilitado ao inconsciente — algo que se relaciona com as teorias da psicologia junguiana. A rotina de anotar os sonhos, por exemplo, logo ao despertar é um dos métodos adotados por Carl Jung, e as páginas matinais vão na mesma direção.

Entusiasta da escrita matinal, a jornalista Daniela Arrais acredita que a atividade lhe trouxe um benefício “gigantesco”. “Fiquei muito surpresa com o quanto sai da gente quando nos comprometemos a escrever todos os dias. Essas páginas acabaram me ensinando mais sobre mim mesma, sobre o meu momento de vida”, disse.

Segundo Dani, escrever logo pela manhã impacta na qualidade de todo o seu dia. “Quando eu começo o dia escrevendo, fico mais centrada, mais consciente. Parece que eu coloco mais intenção, que eu sei mais quem eu sou e o que quero.”

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Engana-se, entretanto, quem imagina que o hábito de escrever tenha um objetivo meramente reflexivo e introspectivo. A prática também parece provocar mudanças e atitudes. “Se você está escrevendo e passa cinco dias reclamando da mesma coisa, no sexto dia você mesma já não aguenta reclamar mais. Então, é quase como se você buscasse uma solução”, conta Dani.

escrever é realizar
(MirageC/Getty Images)

Quem também adotou a prática foi a fisioterapeuta Natália Gastão. Segundo ela, a escrita matinal sustentou a criação de novos hábitos, como a leitura e o exercício físico. “A escrita me trouxe alguma disciplina e me ajudou a colocar novos hábitos em prática. Comecei a ler (foram 40 livros em 2021) e fazer ioga todo dia.”

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Quando iniciou a prática, após participar de uma oficina sobre o tema, passou mais de 200 dias escrevendo diariamente. “O caderno virou o meu lugar seguro, onde desabafo, me organizo e converso com o meu criador interno”, contou.

Menos produtiva, mais intuitiva

Buscar uma razão para o que fazemos, sob uma perspectiva utilitarista das coisas, parece absolutamente necessário na sociedade competitiva e pautada no desempenho em que vivemos. Estamos quase sempre nos perguntando: “Para que vou fazer isso?” e “O que eu ganho com isso?”. Ou ainda, no caso da escrita: “Para quem vou escrever?”. A sugestão parece ser, contudo, fazer dessa experiência algo que possa proporcionar o benefício pessoal de se conhecer melhor.

Para isso, é preciso se permitir a experiência. “Tem pessoas que nem quando têm uma inspiração escrevem, porque esse caminho não é uma possibilidade. É como se fosse um rio canalizado. Tem que abrir as vias de fluência para que essas águas fluam livremente no caminho natural que é o da criatividade”, afirma Mari Pelli, escritora e facilitadora de processos criativos e de aprendizagem. Para ela, é fundamental que cada pessoa descubra como o seu próprio processo acontece. “Com certeza a consistência ajuda, mas não quer dizer que tem que ser todo dia. Pelo contrário, pode ser quando tiver vontade para que seja uma coisa prazerosa e não mais uma obrigação”, acredita.

Já para Lella Sá, mais do que organização e planejamento, a criação de um hábito de escrita nos convida necessariamente a disciplinar a vontade e educar os pensamentos. “Aprender a disciplinar o seu querer é criar ambientes propícios para você conseguir de fato fazer o que você realmente deseja. Ter um tempo pré-definido na agenda é fundamental”, afirma.

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Outra dúvida comum a quem tem vontade de experimentar a escrita é: sobre o quê escrever? Afinal, para algumas pessoas seguir uma proposta de escrita livre e intuitiva gera insegurança. Muita liberdade também pode paralisar. Para evitar essa situação, é possível utilizar cadernos com perguntas pré-formuladas e planners ou fazer listas.

Lella acredita que os planners são ferramentas importantes que podem dar contornos e trazer perguntas-chave. “É ótimo para falar mais sobre um sentimento ou uma questão que você quer resolver”, diz.

Formada em design gráfico e apaixonada por papelaria, Dandara Panaroni criou uma empresa de cadernos e ferramentas de organização e anualmente elabora materiais com objetivos e usos distintos, mas com um ponto em comum: serem instrumentos que ajudem as pessoas a materializar sonhos e organizar a suas vidas. “Existem diversos estudos que mostram que escrevemos nossos planos, nosso cérebro entende que ali se inicia uma atitude mental e começa a gerar energia e conexões mais efetivas para a realização daquela atividade”, destaca Dandara.

Ela ressalta ainda o poder terapêutico dessas iniciativas e observa uma demanda cada vez maior de pessoas buscando se conectar com elas mesmas. O maior desafio, aponta, é manter a energia e a consistência. “Começamos o ano cheio de expectativas, sonhos, metas e com o passar dos meses vamos perdendo o foco.” Surge, consequentemente, um desafio: superar o sentimento de frustração quando aquelas metas não se concretizam.

Segundo Mari Pelli, os registros são como uma fotografia dos desejos do momento e parar para observá-los um tempo depois pode ser muito interessante. Ela acredita que um bom exercício é olhar para aquilo que não se realizou com curiosidade. “A gente pode dizer: putz, isso aqui não aconteceu, mas o que aconteceu ao invés disso? Que caminhos a vida tomou? Como ela me surpreendeu? O que de melhor apareceu? Eu ainda quero isso mesmo? De repente a gente nem deseja mais aquilo e só fica frustrado porque não aconteceu do jeito que a gente queria”, reflete Mari. Um caminho mais leve e amoroso pode ser então fazer mais votos que promessas. “Faz um voto, joga para o vento e o que vier daquilo é uma semente plantada”, sugere ela. Talvez seja agora uma boa hora para começar 2022 semeando palavras.

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