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“Após 55 dias em casa, andar na rua é emocionante”, diz brasileira em Roma

Bianca Luisi se mudou para Roma 1 mês antes do lockdown. Depois de 55 dias em casa, relata que andar na rua não é como antes

Por Isabella D'Ercole Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 8 Maio 2020, 12h00 - Publicado em 8 Maio 2020, 12h00

“O primeiro dia em que pudemos sair de casa amanheceu ensolarado. Fiquei muito animada. Coloquei o álcool gel na bolsa, vesti a máscara e deixei a chave do portão de casa num lugar estratégico, que fosse fácil de pegar e não entrasse em contato com as minhas coisas. Saí andando meio sem rumo até uma reserva natural. Foi uma sensação tão incrível! Eu pensava: ‘Ainda tem mundo! Os ônibus passam, tem gente na rua. Olha a criança tomando sorvete’. Ao mesmo tempo, eu me questionava se iríamos todos nos infectar, se teria uma segunda onda intensa de pessoas hospitalizadas e outra quarentena. Foi bem emocionante.

Minha quarentena durou 55 dias, praticamente o tempo todo que moro em Roma. Costumo brincar que cheguei junto com o novo coronavírus. Eu me mudei para cá em 11 de fevereiro. Meu pai é italiano e eu fui criada muito próxima da cultura do país. Sempre quis passar uma temporada aqui e, como tenho a cidadania, resolvi experimentar. Inicialmente, me matriculei num curso de italiano, que era diário, numa escola, com a sala cheia. O plano era, em seguida, com o idioma mais fluente, achar outros cursos.

O primeiro dia que percebi alguma coisa diferente foi no domingo de Carnaval. Estava na estação de trem indo para uma festa de Carnaval de alguns brasileiros e o clima era de tensão. As pessoas corriam de um lado para o outro, todos estavam de máscara e visivelmente aflitos. Eu ainda tive mais uma semana de aula normal até decretarem o lockdown.

O prefeito declarou que Roma pararia 1 dia depois de eu assinar o meu contrato de aluguel. O meu curso terminava aquela semana e eu resolvi não renovar. Em vez disso, contratei uma professora particular por Skype. Não pensei em voltar. Eu tinha planejado morar na Itália e já tinha até casa. É engraçado pensar nisso agora, mas, olhando para trás, percebo que nunca tive medo de ser infectada.

“Na primeira semana, os vizinhos saiam nas janelas e varandas para aplaudir profissionais da saúde e tocar música. Mas durou pouco. Acho que as pessoas foram se cansando, ficando desanimadas”

Meus pais me apoiaram, me tranquilizaram. Em nenhum momento eles pediram para voltar. Tenho uma irmã que é médica e ela alertou: ‘Vai chegar aqui no Brasil também, então não faz diferença voltar”. Minhas colegas de casa são uma engenheira da Letônia de 30 anos e uma mulher da Geórgia, que tem 27. Nos adaptamos bem. Uma gostava de cozinhar. Eu gostava de limpar para passar o tempo. Também fazia aulas de ioga por vídeo. Hoje, nem parece que durou tanto, parece que o tempo passou rápido.

Na primeira semana de quarentena, às 6 da tarde, os vizinhos saiam nas janelas e varandas para aplaudir profissionais da saúde e tocar música. Um deles tocava saxofone e sempre encerrava as apresentações com o hino da Itália. Era um momento muito emocionante e ficávamos felizes. Mas durou pouco. Acho que as pessoas foram se cansando, ficando desanimadas.

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Eu só saía de casa para ir ao mercado, e ainda assim usava luvas e máscara. Não era obrigatório, mas eu me sentia melhor. Não tinha medo de ir ao mercado. Pelo contrário, eu me sentia muito segura lá. As pessoas respeitavam o distanciamento de 1 metro na fila e tinha um número limitado de pessoas dentro do mercado. Ou seja, tinha que sair alguém para você entrar quando o limite era alcançado. Senti que todas as normas eram muito respeitadas aqui.

Precisei pegar uma receita de um medicamento durante a quarentena e fui a um dentista italiano que ficava a cinco quilômetros de casa. Tive que imprimir um certificado caso a polícia me parasse. Continha o meu endereço, o endereço do dentista e o motivo da saída. O dentista me entregou outro papel confirmando que eu tinha estado lá. A polícia não me parou, mas esses protocolos impediam que as pessoas ficassem circulando por nada. Quando eu falava com meus amigos no Brasil, mesmo o país tendo menos casos do que a Itália na época, me sentia mais segura aqui. Os italianos estavam levando mais a sério as regras do isolamento.

Quando começaram a falar em afrouxamento das regras de isolamento, preferi não fazer planos. Não queria criar expectativas enquanto não fosse real. Logo o governo anunciou o plano, que incluía aberturas graduais. Os museus abrem dia 18, por exemplo. Já restaurantes, bares e cabeleireiros só no dia 1º de junho. Tudo muito controlado.

“Quando eu falava com meus amigos no Brasil, mesmo o país tendo menos casos do que a Itália na época, me sentia mais segura aqui. Os italianos estavam levando mais a sério as regras do isolamento”

No dia em que saí, 4 de maio, fiz uma longa caminhada. Andei 8 quilômetros. Parei num parque perto de casa. Para quem estava acostumada a só descer do apartamento para jogar o lixo fora, era bastante coisa. Mas notei que todo mundo estava usando máscara – algumas pessoas usavam errado, claro, com a máscara no queixo ou sem proteger o nariz. Mas o clima da cidade era de alegria. Em geral, o distanciamento continuou a ser respeitado. O comércio estava reabrindo e você podia retirar comida nos restaurantes para levar para casa. Vi três amigos tomando cerveja sentados na rua, conversando. No parque, vi as pessoas andando com cachorro, praticando esportes, sentadas na grama conversando. Foram 3 horas fora de casa.

Acho que vamos ficar mais atentos aos hábitos de saúde. Vamos lavar mais as mãos, usar a máscara. Já percebi que vou ter que me acostumar com o calor que a máscara faz no rosto. Também não dá para sair de óculos, porque você fica colocando a mão no rosto pra ajustar. Melhor usar lentes de contato. O mesmo para o cabelo solto caindo nos olhos ou no rosto. O ideal é sair com ele preso. É um novo comportamento para aprender, mas acho que nada tão difícil de acostumar depois de tudo que passamos.”

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Bianca Luisi, 33 anos, é jornalista. Nascida em São Paulo, mora em Roma desde fevereiro

 

Em tempos de isolamento, não se cobre tanto a ser produtiva

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