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Como garantir a eficácia do planejamento familiar

Das gestações não planejadas, 46% das mulheres faziam uso de algum método anticoncepcional. O que está dando errado?

Por Cristina Nabuco
Atualizado em 24 ago 2017, 15h23 - Publicado em 24 ago 2017, 15h22
 (Zinkevych/ThinkStock)
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No Brasil, 80,5% das mulheres em idade fértil usam métodos anticoncepcionais. Era de esperar, portanto, que a maioria conseguisse programar sua vida reprodutiva e que fosse mínima a porcentagem das que recebem com surpresa e aflição um resultado positivo no teste de gravidez. Infelizmente, a realidade está distante dessa expectativa. Por ano, o país registra 1,8 milhão de gestações não planejadas, o que representa 55,4% do total de partos.

Tornar-se mãe quando não se espera é muito frequente no mundo todo: nos Estados Unidos, o índice é de 48% dos partos e, na Europa, de 44%. O impacto, porém, é maior nas nações pobres ou em desenvolvimento, como a nossa.

“A gravidez  indesejada compromete a autonomia da mulher, reduz suas chances de concluir os estudos e subir na carreira profissional”, diz a ginecologista Isabel Cristina Sorpreso, professora assistente do departamento de obstetrícia e ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

“Além disso, essa falta de planejamento prejudica a saúde da mãe e do bebê, aumentando a frequência de complicações como anemias, infecções, parto prematuro e até mortalidade infantil”, afirma a médica. Sorpreso alerta ainda para outra consequência perversa da gravidez indesejada: o aumento do índice de abortos provocados.

Leia também: Aborto: o que podemos aprender com a descriminalização no Uruguai

Estima-se que 49% dessas gestações sejam interrompidas clandestinamente (já que a prática é considerada crime), em clínicas insalubres ou de forma perigosa. Em decorrência dessas intervenções, diariamente quatro mulheres acabam morrendo nos hospitais brasileiros.

Ampliar a oferta de métodos contraceptivos é fundamental, evidentemente, mas é necessário também que se forneçam opções eficazes, já que 46% das surpreendidas julgavam estar protegidas pelos contraceptivos.

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Para ajudar a reverter esses números, a Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) mantém desde março a campanha Vamos Decidir Juntos. O objetivo é transmitir informações confiáveis sobre o tema e melhorar o diálogo entre médico e paciente a fim de auxiliar na escolha do método mais adequado para cada perfil de mulher.

Preferência x eficácia

A alternativa mais usada pelas brasileiras é a laqueadura, cirurgia que corta ou amarra as trompas, produzindo esterilidade permanente. Entre os anticoncepcionais reversíveis, a pílula ocupa o topo da preferência nacional.

Simples de usar e facilmente encontrado em serviços públicos ou farmácias, o comprimido tem alta eficácia. Seu índice de falha é de 2 em mil por ano – ou seja, 998 usuárias não engravidariam. “No mundo real, porém, 80 em mil usuárias de pílula ficam grávidas nesse mesmo período”, conta o ginecologista César Eduardo Fernandes, presidente da Febrasgo.

O que dá errado? É muito frequente  a usuária esquecer de tomar a pílula ou interromper o tratamento, o que acaba expondo-a à gravidez. “As falhas decorrem da necessidade de uso constante”, explica a ginecologista Ilza Maria Monteiro, professora responsável pelo setor de reprodução humana do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher, da Universidade de Campinas (Unicamp). Ou seja, como o método exige disciplina rígida, é comum que muitas não se adaptem.

Depois da pílula, o método mais popular é o preservativo. Seu índice de falha anual é de três a quatro gestações em cada 100 usuárias, quando a camisinha é usada do começo ao fim do ato sexual. No entanto, ocorrem 25 gestações a cada 100 usuárias. Mais uma vez, o resultado é fruto do uso incorreto.

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“O casal brinca, brinca e só coloca o preservativo quando falta pouco para a ejaculação. Acontece que nas preliminares há contato com o sêmen; assim, há risco de gravidez”, alerta o ginecologista Silvio Franceschini, do Centro Saúde-Escola ligado à Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto.   

As falhas no uso da pílula e da camisinha sobem ainda mais nos grupos vulneráveis: adolescentes, mulheres com baixo nível educacional e financeiro ou com dificuldade de acesso a serviços de saúde, além das usuárias de drogas e das moradoras de rua.

Por isso, a tendência nos sistemas de saúde é estimular o uso dos Larcs (sigla em inglês para métodos reversíveis de longa duração), que têm alto desempenho e, depois de inseridos pelo médico, independem do controle voluntário da usuária. Um deles é o DIU de cobre, dispositivo em forma de T colocado no útero para impedir o acesso dos espermatozoides às trompas. Pode ficar no corpo por dez anos.

Leia também: Mulheres agora têm acesso a DIU em maternidades atendidas pelo SUS 

O segundo, o DIU com depósito do progesterona, também chamado SIU, libera gradual e lentamente o hormônio por cinco anos. Além deles, existe o implante, bastão fino de 4 centímetros de extensão que contém progesterona. Inserido sob a pele do braço, inibe a ovulação por três anos. “Esses contraceptivos têm tanto êxito quanto a laqueadura. E o melhor: com a remoção deles, a fertilidade retorna”, defende Sorpreso. 

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Tipos de contraceptivo

Os métodos são divididos em três grupos. Os não hormonais: preservativos feminino e masculino, DIU de cobre, diafragma (cúpula rasa de silicone ou borracha, introduzida pela vagina, que cobre o colo do útero e impede a entrada dos espermatozoides). Os comportamentais, como tabelinha e coito interrompido.

Os hormonais combinados trazem substitutos sintéticos para o estrogênio e a progesterona e impedem a ovulação – é o caso da pílula, do injetável mensal, do adesivo transdérmico (semelhante a um pequeno curativo colado diretamente na pele) e  do anel vaginal (de plástico flexível, introduzido na vagina). Há também  os hormonais contendo apenas substitutos de progesterona:pílulas, implante, injeção trimestral e DIU hormonal.

Não é tão simples fazer a escolha, já que só de pílulas existem mais de 100 marcas. Elas diferem em dois pontos. Em primeiro lugar, quanto à forma de administração: algumas têm 21 comprimidos e pedem pausa de sete dias para menstruar; outras fornecem 24, com intervalo de quatro dias; e há cartelas com 28, sendo sete inertes.

Em segundo, pelo princípio ativo usado – note que cada um deles é mais indicado para tratar alguns sintomas comuns às mulheres: a drospirenona é melhor para evitar a retenção de líquido; o acetato de ciproterona alivia a acne; e o desogestrel, a noretisterona e a drospirenona amenizam a TPM.

Só uma consulta bem-feita elucida as características da paciente e permite a prescrição acertada do método. “Cada contraceptivo tem vantagens e desvantagens e deve ser avaliado levando-se em conta as necessidades de cada mulher”, alerta César Fernandes.

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Escolha sob medida

Veja quais características pessoais devem ser avaliadas na hora de eleger o melhor método para você:

1. Ritmo de vida

É o que determina se a frequência de uso deve ser diária, mensal, trienal ou ainda maior.

2. Atividade sexual

O número de relações por semana e o de parceiros ajudam a estimar o risco de engravidar e contrair doenças de  transmissão sexual.

3. Hábitos

Praticar exercícios, fumar e beber também tem influência nessa escolha. O cigarro associado à pílula, aumenta o risco de trombose. Já abusar de bebida a ponto de perder a consciência pode implicar o esquecimento do comprimido.

4. Hereditariedade   

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Ter antecedente pessoal ou familiar de doenças, especialmente trombose e infarto, pode levar à contraindicação. Ilza Monteiro alerta, entretanto, que não se comprovou que a pílula aumenta o risco de câncer de mama. Portanto, ter casos na família não seria um impeditivo para o uso.

5. Queixas como sangramento intenso ou irregular, dores  e TPM pedem métodos capazes de aliviar  esses sintomas.

6. Prioridades

Projetos de mudar de país, de emprego ou de estilo de vida exigem planos que levem em conta a gravidez no curto ou no longo prazo.

Erros comuns

O que derruba a eficácia dos contraceptivos:

1.  Esquecer de tomar a pílula (especialmente a de baixa dosagem) ou iniciar tardiamente a cartela. “A maioria das usuárias não se lembra de tomar a pílula por dois ou três dias consecutivos”, diz Franceschini.

2. Interromper abruptamente o uso sem recorrer a outro método. Em geral, isso ocorre quando a mulher ouve que a pílula engorda, deixa o cabelo oleoso ou piora o desejo sexual – efeitos que nem sempre acontecem.

3. Abandonar o uso depois de uma briga com o parceiro e, no calor da reconciliação, esquecer que está desprotegida. Ou errar as contas da tabelinha. “O risco de se atrapalhar  é alto: o sexo é gerido pelo hipotálamo, que suprime a ação do neocórtex, a parte lógica do cérebro”, explica Franceschini.

4. Fazer pausas de um a três meses, para o corpo “descansar” do hormônio, confiando numa suposta ação residual. Além de o risco de gravidez ser alto, os efeitos colaterais voltam a surgir a cada recomeço. A interrupção deve ser adotada, sim, mas na aparição de doenças como pressão alta e diabetes.

5. Tomar remédio que atrapalha a absorção do contraceptivo oral sem recorrer à camisinha. É o caso de antibióticos como a rifampicina (indicada para tuberculose) e de anticonvulsivantes que previnem enxaqueca. A barreira extra deve ser usada ainda em crise de vômito ocorrida até uma hora após tomar a pílula.

6. Usar preservativo vencido, exposto ao calor ou sem remover o ar da ponta antes de vestir. Tudo isso aumenta  o perigo de rompimento.

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