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Cientista chinesa identificou o novo coronavírus há mais de 10 anos

Shi Zheng-Li é a maior especialista de coronavírus na China e alerta que a luta continua

Por Da Redação
1 ago 2020, 19h09
Shi Zheng-li no laboratório do Instituto de Virologia em Wuhan Institute of Virology  (Feature China/Barcroft Media/Getty Images)
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No campo científico, o nome de Shi Zheng-Li é referência. A cientista do Instituto de Virologia em Wuhan, na China, recebeu um telefonema na véspera da virada do ano, em 30 de dezembro de 2019, que mudou o inicio dessa década. Logo depois que testes de um paciente misterioso foram reportados, seu chefe no Centro de Controle de Doenças e Prevenção ligou. Os exames detectaram um novo coronavírus em dois pacientes com pneumonias atípicas. Precisavam que Shi investigasse os casos pois o risco de uma pandemia era possível. O vírus era da mesma família de um que causava severa síndrome de respiração (SARS), uma doença que já contabilizava mais 800 vidas entre 2002 e 2003. “Pare tudo que estiver fazendo e veja isso agora”, é tudo que ela lembra do diretor falar.

Shi é uma virologista especializada em morcegos, tanto que, na China, tem um apelido de “Batwoman”. Longe de ser uma Bruce Wayne de saias, a referência é deviada a dedicação de mais 16 anos à expedições em cavernas e morcegos. Em 30 de dezembro de 2019, Shi estava em uma conferência em Xangai. Em questão de horas, embarcou em um trem para Wuhan, no centro da China. “Eu estava torcendo por um erro das autoridades, nunca esperava que isso aconteceria em Wuhan”, ela relembra hoje.

Faz sentido. Seus estudos apontavam para regiões sudestes e subtropicais como as zonas de risco de contaminação de coronavírus, não a região central. Foi Shi e sua equipe que identificaram o novo vírus e seu alto risco de contágio. Em uma semana, o SARS-CoV-2 ganhou nome e até metade de abril, matou mais de 84 mil pessoas apenas na China. Os números ainda não reduziram ao redor do mundo.

Shi começou sua especialização em morcegos em 2004. Ela lembra ainda da sensação de entrar em uma caverna perto de Nanning, a capital de Guangxi. Era larga e popular entre os turistas, com fácil acesso. Para achar os morcegos, não foi tão fácil e demandava entrar em pontos escuros e difíceis, mas nem desconfiava que o resultado de seu trabalho seria essencial para mapear a primeira grande epidemia do século 21. Antes do SARS, o mundo tinha pouca noção dos coronavirus, um vírus que ganhou esse nome porque sua aparência no microscópio lembra uma coroa. Até então, só se atribuía a eles resfriados e gripes. Tudo mudou em dezembro de 2019.

vírus covid-19
(CDC/API/Gamma-Rapho/Getty Images)
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Os primeiros coronavírus surgiram nos anos 1990. Em 1994, na Austrália, saindo de cavalos para humanos e quatro anos depois, em 1998, na Malásia, quando de porcos passaram para pessoas. Em comum estava a figura do morcegos, que se alimentavam de frutas. Cavalos e porcos eram apenas hospedeiros enquanto morcegos carregavam o vírus SARS. Ainda assim, se descartou a contaminação. Alguns cientistas, como Shi, insistiam na maior investigação por isso a viagem de 2004 foi tão importante.

 

Cientistas coletaram sangue, fezes e saliva dos animais para teste. Nada que tenha ajudado a chegar ao material genético do coronavírus. “Foram oito meses de trabalho para o ralo”, ela lembra. “Pensamos que não tinha nada a ver com SARS”, admite. Até que pessoas testaram positivo e os cientistas insistiram na pesquisa. Mesmo sem garantia de anticorpos, Shi se jogou com tudo no trabalho. “O que teríamos a perder?”, ela se perguntou. Os resultados provaram que estava certa e foram definitivos para a pesquisa. Cientistas confirmaram que a presença do coronavirus em morcegos era efêmera e de estações, mas a reação de anticorpos duravam semanas até anos. O kit ajudou a encontrar o genoma no vírus. E estava na Caverna de Kunming, a capital de Yunnan, onde ficaram cinco anos pesquisando. O resultado foram centenas de coronavirus vindos de morcegos, com grande diversidade. “A maioria é inofensiva para humanos”, a cientista admite, mas uma dúzia deles pertencem ao mesmo grupo do SARS, altamente infeccioso para o pulmão humano.

 

Os cientistas liderados por Shi verificaram, após vários testes, que cerca de 3% da população local carregava anticorpos para SARS típicos dos morcegos, mesmo sem ter vivido no campo ou ter tido alguma doença respiratória. Ainda assim Shi continuou acompanhando o caminho do coronavirus, com alguns casos afetando trabalhadores em túneis ou cavernas onde havia morcegos. Em seus trabalhos, Shi alertou o risco da contaminação, pelo menos um ano antes da pandemia. Por isso, na noite de 30 de dezembro ela ficou preocupada. As semanas que se seguiram foram, para ela, as piores de sua vida quando viu o pior pesadelo virar realidade, mesmo que estivesse se preparando para ele há 16 anos. Em 07 de janeiro confirmaram que o novo vírus causou a doença dos pacientes, mas mais de 4 mil sequências de genoma do vírus foram identificadas. A pesquisa comprova que a contaminação é de humano para humano, mesmo a origem ter sido dos morcegos. “Comer animais selvagens é apenas parte do problema [na China]”, admite Shin.

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O relaxamento do isolamento na China não alegrou Shi. Uma das coisa que mais a irrita são as sugestões que a pandemia teria iniciado com um vazamento do seu laboratório, mesmo que o novo coronavírus não seja o mesmo que ela estava investigando. “A missão é seguir em frente. Só descobrimos o topo do iceberg”, ela alerta. “Coronavírus vindos de morcegos podem causar mais mortes. Precisamos identificá-los antes que nos encontrem”, diz.

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