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Brasileiro com câncer terminal tem alta após tratamento inovador

Em menos de 20 dias após o início do tratamento, os sinais da doença desapareceram do organismo do paciente

Por Da Redação
Atualizado em 17 fev 2020, 12h42 - Publicado em 11 out 2019, 17h19

Vamberto Luiz de Castro acaba de se tornar o primeiro paciente na América Latina a passar por um tratamento inteiramente individualizado contra o câncer. O aposentado de 63 anos sofria desde 2017 com um linfoma não Hodgkins avançado, um tipo de câncer de alto risco e bastante agressivo. De lá para cá, ele já havia passado por radioterapia e quimioterapia, ambas sem sucesso. Seus médicos então conseguiram autorização para tentar um outro tipo de terapia: o método CAR T.

Fazendo uso de células geneticamente modificadas, o tratamento CAR T-cell (inglês para “célula T com receptor de antígeno quimérico”) é recente, e foi liberado para uso comercial nos Estados Unidos apenas no ano passado. Os resultados foram tão favoráveis que renderam aos seus percussores o prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em 2018.

“O câncer, todo mundo sabe, é um desafio. Os tratamentos têm melhorado muito e esse tratamento com as células CAR T é um dos mais promissores que existem no momento. É um tratamento disponível em poucos países”, declarou ao Jornal da USP o médico hematologista Dimas Tadeu Covas, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e coordenador do Centro de Terapia Celular (CTC). Sediado na USP de Ribeirão, o centro faz parte de um projeto financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

No caso de Vamberto, o câncer afetava o sistema imunológico e o deixava com um prognóstico de apenas um ano de vida. Em menos de 20 dias após o início do tratamento, ele – que precisava de morfina e tinha nódulos por todo o corpo – já não apresentou mais sinais da doença. Exames apontaram que as células cancerígenas haviam desaparecido, assim como os nódulos e as dores.

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“Tratando-se de câncer, ainda é cedo para dizer que ele está curado, mas ele não apresenta mais sinais da doença e era um paciente que já estava em cuidados paliativos” disse Covas à VEJA. Vamberto deve receber alta no sábado (12) e estará em acompanhamento pelos próximos 10 anos. 

A técnica

Para dar início ao tratamento, é preciso uma amostra de 200ml de sangue do paciente. Dela, se retiram os linfócitos do tipo T, responsáveis por guardar nosso organismo de bactérias invasoras, por exemplo. Em laboratório, os pesquisadores alteraram essas células, introduzindo o CAR, uma espécie de vírus sintético que é capaz de se dirigir a alvos terapêuticos específicos. No caso de Vamberto, o alvo era o CD19, molécula que pode ser encontrada na superfície das células com linfoma não Hodgkin.

Uma vez modificados em CAR T, os linfócitos foram reintroduzidos na corrente sanguínea do paciente, onde se multiplicaram, aderindo ao sistema de defesa do organismo e matando as células cancerígenas.

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“As células T nos defendem contra infecções e o tumores. Mas em determinado momento, o tumor consegue driblar esse mecanismo e a célula não o reconhece mais. É quando ele começa a crescer. A modificação basicamente dá à célula um novo receptor que faz com que ela enxergue o tumor. É como um mecanismo chave-fechadura. A célula modificada tem uma chave que reconhece uma fechadura específica, que está no tumor, que precisa ser destruído.”, explicou Renato Cunha, diretor técnico do Centro de Transplante de Medula Óssea do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto à revista VEJA.

(Reprodução/Reprodução)

Após a aplicação das CAR T, Vamberto apresentou uma inflamação generalizada, a qual os médicos chamam de “tempestade de citocinas” e indicam que as células haviam encontrado seu alvo. Entre os sintomas dessa fase, estão súbita queda de pressão, dificuldade para respirar e inchaço dos órgãos. Caso o paciente esteja muito debilitado pela doença, as reações podem ser fatais, por isso é preciso que fique em uma UTI até que seu quadro se estabilize.

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“Nós usamos um remédio que bloqueia essas citocinas, sem prejudicar o processo do CAR, porque essas citocinas fazem o CAR crescer mais e matar mais tumor. Precisamos delas para a eficácia do tratamento, mas em uma quantidade que não mate o paciente. Essa tempestade varia do grau 1 ao 4. Vamberto teve até o grau 3 e depois começou a melhorar”, disse Cunha.

Uma semana depois, já era notável a melhora nos sintomas. Enquanto medicamentos comuns como a quimioterapia possuem um tempo de efeito determinado, as células CAR T permanecem por muitos anos no organismo do paciente. Sua vida útil varia entre 30 e 50 anos e ela protege o paciente contra o tumor enquanto estiver viva.

Custos

Devido a sua complexidade, o tratamento exige a existência de uma estrutura laboratorial de ponta, com certificação da Anvisa e boas práticas de produção. Os hospitais também precisam ser capazes de realizar transplantes de medula óssea, e possuir bons laboratórios e bom suporte de tratamento intensivo. Além do Brasil, os poucos países que possuem capacidade para produzir as células são Estados Unidos, China, Japão, Reino Unido, entre outros.

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Por todas essas exigências, seu custo é alto. De acordo com Covas, nos EUA, as despesas podem chegar a 1 milhão de dólares (cerca de R$ 4 milhões). Mas há esperanças de que a plataforma brasileira barateie o tratamento, que atualmente varia entre R$ 50.000 e R$ 100.000 em até 20 vezes. Há também planos de manter aberto o protocolo de produção das células para que outros laboratórios reproduzam a técnica e atendam mais pacientes.

Para que o tratamento chegue ao SUS, o que também está nas expectativas do CTC, serão necessários testes clínicos fases I,II e III e aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “Representa um grande avanço científico, porque é um tratamento muito recente, uma tecnologia protegida por segredos industriais. E, por outro lado, é um grande avanço em termos sociais. Vamos poder oferecer isso, daqui a algum tempo, para a nossa população”, comemora Covas, que coordena o CTC.

Por enquanto, o tratamento só está disponibilizado de modo compassivo, ou seja, o paciente “pede para ser tratado como última alternativa, porque ele não tem mais nenhuma opção. Geralmente, para fazer uso compassivo, é aquele paciente que poderia entrar em algum estudo clínico, mas ele não preenche critérios. Isso surgiu para ele não ficar sem tratamento”, esclareceu Renato Cunha.

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Atendendo apenas um paciente por vez e com fila andando de acordo com o critério de gravidade, o CTC tem planos de expandir sua capacidade em breve e deve incluir mais 10 pacientes nos próximos seis meses. Segundo os pesquisadores, outro tratamento está prestes a começar em um homem de 35 anos.

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