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“Se eu não me dispusesse a defender meu filho, quem faria isso?”

Nascido com uma má formação no rosto, o filho de Érika Mendonça Berato recebeu apoio e tratamento do Facial Anomalies Center, idealizado pela vencedora do Prêmio CLAUDIA 2013, Vera Cardim. Érika conta a história da família.

Por Solange Azevedo
Atualizado em 22 out 2016, 17h47 - Publicado em 9 set 2014, 22h00

Depoimento de Érika Mendonça Berato, dona de casa, 29 anos

“A gravidez do Felipe, meu único filho, foi bastante comemorada. Fiz todo o pré-natal direitinho, como deve ser, e os exames não detectaram nada fora do normal. Por isso, o choque foi tão grande quando ele nasceu com uma anomalia do lado direito da face: sem a orelhinha, com o olhinho quase fechado e má-formação no nariz.

No fundo, no fundo, acho que já pressentia que algo não ia bem. Andava triste e angustiada, tanto que fui chorando de casa até o hospital no dia de fazer a cesárea. Só fiquei aliviada na hora em que o médico veio com meu bebê, mas essa tranquilidade durou pouco. Logo em seguida, ele chamou meu marido, Edinaldo, e nos disse que Felipe tinha um ‘probleminha’. Perguntei: ‘O que é, se não percebi nada?’ Quando o doutor contou, o sofrimento me cegou, tive um surto e gritei que eles haviam trocado a criança.

Ainda na sala de parto, porém, trouxeram meu filho novamente e eu o reconheci. Da primeira vez, apenas o lado esquerdo, que era perfeito, tinha sido mostrado para mim. Questionei o porquê de isso ter acontecido comigo. Tem tanta gente que joga seu bebê no lixo, que rejeita, e eu o desejava tanto! Mas, no auge daquele desespero, Felipe tocou meu rosto. Naquele exato momento, a nuvem carregada que pairava no ar foi embora e eu falei: ‘Me perdoe, meu filho. Seja bem-vindo e que Deus te abençoe’. Ele sorriu para mim.

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Chorei muito durante dez dias. Mas, a partir dali, botei na minha cabeça: ‘Esse é o meu filho, essa é a minha vida e vou ter de lutar’. Acho que, quando algo do tipo acontece, a pior fase é a da não aceitação, porque aí as coisas não fluem. Conheço pais de crianças de 10, 11 anos que ainda sentem vergonha da deficiência do filho. Claro que é muito difícil lidar com a situação e eu não tinha ideia de por onde deveria começar minha batalha. Sabia, no entanto, que não poderia ficar parada, só esperando.

No princípio, pensava apenas que Felipe precisaria de cirurgias plásticas. Ficava apreensiva ao imaginar o futuro, que ele poderia ser discriminado na escola. Notei, porém, que o preconceito maior vem dos adultos. Uma vez, por exemplo, a gente estava no supermercado quando duas mulheres se aproximaram do carrinho em que ele brincava e uma delas falou: ‘Olha, que monstrinho’.

Eu não poderia admitir que fizesse aquilo. Se eu não me dispusesse a defender meu filho, quem faria isso? Ele não poderia crescer se sentindo desamparado. Bati boca e chamei a polícia. Ela tentou argumentar que eu estava louca, mas um senhor que testemunhou a cena confirmou o que a mulher tinha dito.

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Felipe tem uma síndrome rara e pouco estudada chamada Goldenhar, anomalia genética caracterizada principalmente por problemas craniofaciais do lado direito e que atinge um a cada 21 mil nascidos vivos. Passamos por muitas provações desde que ganhei meu menino.

Nas primeiras semanas de vida, ele apresentava muita dificuldade de mamar no peito e se cansava logo. Achando aquilo esquisito, o levei ao médico e ouvi que eu era marinheira de primeira viagem e que estava com preguiça de amamentar. De novo, parece que pressenti algo errado. Quando ele tinha 24 dias, percebi que a respiração não estava normal e fui a um posto de saúde.

De lá, meu bebê foi transferido para a UTI de um hospital. Ficou 135 dias internado porque havia oito buracos do lado direito do coração. O especialista ficou surpreso pelo problema não ter sido diagnosticado nem durante o pré-natal nem na maternidade. Disse que meu filho nunca deveria ter mamado no peito porque isso exigia dele um esforço imenso. Poderia ter tido uma parada cardíaca nos meus braços. Naquela ocasião, ele fez uma cirurgia e, seis meses depois, outra. Felizmente, o problema cardíaco foi resolvido.

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Como ainda restava a má-formação na face, procurei atendimento e consegui. Felipe fez 15 operações para reconstruir o nariz, mas elas não foram bem-sucedidas. Só soube disso quando o médico dele se aposentou e fui em busca de outro lugar para continuar o tratamento. Descobri, então, em São Paulo, o Facial Anomalies Center (F.A.CE.), criado pela cirurgiã plástica Vera Cardim (uma das vencedoras do Prêmio CLAUDIA 2013).

Ela é um anjo. Aliás, toda a equipe de lá é. Sou muito grata pelo atendimento que deram e ainda dão ao meu filho. São profissionais especializados, extremamente competentes e dedicados, que doam seu tempo. O F.A.CE. é uma entidade filantrópica. Eu jamais teria condições de bancar um tratamento como esse porque parei de trabalhar como assistente financeira justamente para cuidar do Felipe, e meu marido é metalúrgico. Tentamos até contratar um plano de saúde, mas o convênio não aceitou nosso filho. Por isso, foi uma grande bênção termos encontrado a doutora Vera.

Quando ela operou o nariz do meu menino pela primeira vez, ficou estarrecida de ver o que o outro médico tinha feito. Havia pele solta e enxerto onde não precisava. Em decorrência desses erros, ele não respirava direito. Nas madrugadas mais frias, eu e meu marido nos revezávamos, porque Felipe só conseguia dormir meio sentadinho e tínhamos de segurá-lo.

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O resultado dessa intervenção da doutora Vera já foi fantástico. Só que meu menino também era extremamente agitado, não parava quieto um minuto sequer e falava com muita dificuldade. Por causa disso, a equipe do F.A.CE. desconfiou que ele tivesse hipertensão intracraniana. Então, na segunda operação do nariz feita lá foi realizada uma tomografia craniofacial completa, e a suspeita se confirmou. Era final de 2011 e meu filho tinha 5 anos.

Nos 24 meses seguintes, foram mais seis tomografias, três ressonâncias magnéticas, diversos outros exames e consultas semanais com uma neuropsicóloga para ter certeza absoluta do diagnóstico. Tudo feito gratuitamente. Até que, em dezembro de 2013, ele foi submetido a uma operação para aliviar a pressão no crânio. A neurocirurgiã Nelci Zanon, que faz parte da equipe, também é fantástica.

Quem não conhecia o Felipe não tem ideia de como essa intervenção provocou uma verdadeira revolução na vida dele. Fiquei impressionada como a língua do meu filho destravou e ele passou a falar superbem. Com isso, deslanchou na escrita e, por outro lado, a agitação diminuiu 95%. As mudanças foram tão positivas e rápidas que me assustei.

Sei que meu filho terá de se submeter a outras cirurgias, pois falta fazer a orelhinha e os médicos querem mexer um pouquinho mais no nariz. Aprendi, porém, a ter paciência, porque esse processo é lento, e precisa ser assim. Penso dessa maneira hoje porque confio plenamente na doutora Vera. Tenho certeza de que tudo o que virá daqui em diante será sempre para o bem do Felipe.

Ele é apenas uma criança, completará 8 anos em novembro e já passou por tanta coisa! Às vezes, ainda é discriminado – até na nossa família. Mas não me importo mais com quem não acrescenta. Faço questão de permitir que tenha uma vida completamente normal, estude, passeie e brinque como outros meninos da idade dele. Uma das melhores coisas da equipe da doutora Vera é que eles não só reconstroem rostos: todos ali se preocupam em elevar a autoestima dos pacientes. Desse modo, eles tratam também mentes e corações.”

Facial Anomalies Center (F.A.CE.)

Idealizado pela cirurgiã plástica Vera Cardim, ganhadora da categoria Trabalho Social do Prêmio CLAUDIA 2013, o Facial Anomalies Center (F.A.CE.) realizou, desde 2005, mais de 1,8 mil cirurgias craniofaciais pelo SUS – 85% delas em crianças.

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