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É mais fácil justificar o racismo do que reconhecê-lo

O jornalista deduziu que um entrevistado negro era "catador de bolinhas" de um tradicional clube de SP, porém o jovem é um atleta de polo aquático

Por Ana Carolina Pinheiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 7 fev 2020, 14h53 - Publicado em 7 fev 2020, 12h56
 (TV GLOBO/Reprodução)
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Se alguém pedisse para você pensar na imagem de uma médica, a representação que viria à sua mente seria de uma pessoa negra ou indígena? Provavelmente não! E a resposta disso está no racismo estrutural, que ainda segrega quem tem o direito de estudar, de escolher a profissão que vai seguir e até de que vai ter medo de morrer por conta da cor da pele.

Na manhã de hoje (7), durante uma matéria sobre o metrô de São Paulo, o apresentador do Bom dia São Paulo, Rodrigo Bocardi, fez uma associação pra lá de problemática. Rodrigo perguntou se o entrevistado, um jovem negro chamado Leonel, ia “pegar bolinhas de tênis no Pinheiros”, que é clube de lazer elitizado de São Paulo. O comentário ao vivo foi feito, segundo Bocardi, por conta da camiseta do clube utilizada pelo garoto, já que o jornalista frequenta o local e disse conhecer os jovens que fazem essa função. Porém, Leonel respondeu que, na verdade, é atleta de polo aquático do clube.

https://twitter.com/oantoniojr/status/1225744331979489286?s=20

Quando vivemos em uma sociedade com problemas estruturais, como racismo, machismo, homofobia, transfobia, entre outros, todos os indivíduos são possíveis agentes de reprodução de ações e falas preconceituosas. Certas vezes, a opressão se dá apenas pela existência. Antes de soltar um comentário racista, uma pessoa branca já é opressora por sua existência a um indivíduo indígena, por exemplo. Afinal, o direito do não-branco é retirado para manter o privilégio das pessoas que não sofrem por conta da etnia, o que não exclui o fato delas serem vítimas de outras opressões.

E isso não é de hoje. No Brasil, sabemos que durante o período colonial, com o sistema de escravidão, a utilidade da pessoa negra era reduzida ao ato de servir. Com isso, a complexidade e potência dos afrodescendentes entraram em um limbo assustador, uma espécie de bolha de invisibilidade, que dura até hoje.

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Uma pessoa negra que frequenta um tradicional clube da elite paulistana? Só pode ser um funcionário, óbvio! Ironias à parte, a dedução que o jornalista fez ao dizer que o entrevistado poderia ser um dos garotos que recolhia as bolinhas de tênis dos endinheirados, que chegam a desembolsar até R$20 mil reais para conseguir um título, é uma fala racista, sim.

Com o comentário feito, Rodrigo preferiu seguir um caminho duplo de negação, ou seja, além de não reconhecer que errou, afirmou que: “não existe preconceito, não existe racismo. Quem fala e quem escreve, que é”. Uma saída que infelizmente é usada com frequência entre os racistas.

https://twitter.com/rodrigobocardi/status/1225779322809700353?s=20

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No Twitter, a chuva de justificativa continuou. “Nunca escondi minha origem humilde. Comecei a vida como garoto pobre, contínuo, andando mais de duas horas de ônibus todos os dias para ir e voltar do trabalho e escola. Alguém como eu não pode ter preconceito. Eu não tenho, nunca tive […] nunca terei [preconceito]”. Que lembra até aquela clássica frase: “não sou racista, até porque tenho amigos negros”.

https://twitter.com/_anacosta/status/1225731394250432513?s=20

O excesso de autoconfiança das pessoas privilegiadas é uma das principais barreiras para a desconstrução. Elas cresceram em um cenário de condição ideal: protegidas de injustiças que coloquem em risco o seu bem-estar. Por isso, deve ser mais fácil achar que é só uma confusão ou bater o pé de que não reproduziu uma ideia racista em vez de reconhecer e fazer o exercício contínuo de não propagar os rótulos restritivos ou ofensivos.

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