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Mara Gabrilli: “Partidos políticos são redutos masculinos”

Confira a entrevista com Mara Gabrilli, deputada federal pelo PSDB

Por Isabella Marinelli
Atualizado em 8 Maio 2017, 12h56 - Publicado em 7 jul 2016, 15h27

Para discutir as recentes mudanças no eixo governamental com relação aos direitos femininos e representatividade política, CLAUDIA procurou mulheres que participam ativamente da democracia, são formadoras de opinião e militam pelas questões de gênero.

Estruturamos o debate com base em quatro questões padrões e as mesmas perguntas foram levadas a diversas especialistas escolhidas a dedo. Como resultado, lançamos a série Mulheres na Política, que reúne todos esses pontos de vista.

A entrevista que continua nossa sequência é com Mara Cristina Gabrilli, deputada federal (PSDB):

1. O ranking “Abismo de Gênero”, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial em 2014, apontou, em seu último relatório, que o Brasil caiu 9 posições no ranking em relação ao ano anterior e ocupa a 71ª colocação na lista. Ficamos atrás de países como Nicarágua, Ruanda, Moçambique e Cuba. Quais são, na sua opinião, os avanços que as mulheres alcançaram no governo anterior? E os retrocessos?

Mara Gabrilli: Acredito que, como em outras esferas de políticas públicas, infelizmente o governo Dilma não foi tão atuante como deveria e os demais países avançaram mais que o Brasil. Um aspecto onde tivemos a pior colocação (81ª) foi quanto à participação econômica. Apesar de ser cada vez maior o número de famílias chefiadas pelo sexo feminino, o Ipea calcula que o Brasil pode levar 87 anos para igualar salários de homens e mulheres. Somente 19% das empresas brasileiras têm mulheres em cargos de liderança.
O governo Dilma investiu apenas em programas de valorização da autonomia das mulheres (não estou dizendo que isso é ruim), mas é necessário políticas de incentivo para que as empresas ofereçam creches e horários flexíveis de trabalho, por exemplo. E investir mais na educação pública. O PAC 2 que começou junto com o primeiro mandato de Dilma e com a promessa da construção de 6 mil creches até 2014, entregou somente 14% dessas creches. Em 4 anos, 86% não saíram do papel. Não deve ser apenas responsabilidade das mulheres buscarem por suportes como contratar uma babá ou ter familiares que podem ajudar. Isso sem falar nas questões de quem tem um filho com deficiência. Geralmente é a mãe que para de trabalhar devido a total ausência de políticas de cuidados no Brasil, algo que trabalho muito para mudar e tenho alguns projetos de lei tramitando para oferecer esses suportes. Afinal, investir na infância é ter uma visão de futuro sustentável e ainda contribuir para o desenvolvimento profissional das mulheres.

Por outro lado, no quesito Educação, dentro do ranking “Abismo de Gênero”, estamos muito bem, com nota máxima. O IBGE mensurou que entre 2000 e 2010, a proporção de adolescentes entre 15 a 19 anos com filhos caiu de 14,8% para 11,8%. Ou seja, as meninas passaram a postergar a maternidade para continuar os estudos. O IBGE também apontou que em 2010, as mulheres já representavam 57,1% do total de universitários de 18 a 24 anos. Apesar de haver um notável amadurecimento feminino, programas como o “Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero” e “Meninas e Jovens Fazendo Ciência, Tecnologia e Inovação” ainda são tímidos e pouco se vê noticias na mídia sobre eles. No entanto, os retrocessos quanto à Educação no país são grandes. Houve um corte de R$ 9,4 bilhões no orçamento da educação em 2015, que foi ampliado em 2016 com mais R$ 4,27 bilhões. Como 70% dos municípios brasileiros sobrevivem do Fundo de Participação dos Municípios e são dependentes de programas do governo federal, os cortes impactam a todos. Programas como o Pronatec e de escola em tempo integral, por exemplo, tiveram o número de vagas reduzido em 50% em 2016.

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Outro grande retrocesso, que muito me impactou, foi a exclusão da superação da desigualdade de gênero do Plano Nacional de Educação. Recebi diariamente centenas de e-mails de pessoas pedindo essa exclusão. Uma campanha massiva, com apoio das bancadas religiosas, que alegavam que isso deturparia os conceitos de homem e mulher, destruindo o modelo de família. Na Câmara dos Deputados, inicialmente, aprovamos o texto que determinava a “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual”. Mas o texto foi alterado no Senado, cedendo a essa pressão. Uma pena.

2. O primeiro anúncio da alta cúpula de Temer não tinha mulheres. No entanto, sob fortes críticas, ele se apressou em fazer contratações de peso, como Maria Sílvia Bastos Marques, para presidir o BNDES, e Flávia Piovesan, para a Secretaria de Direitos Humanos. Esse é um bom sinal ou apenas um remendo frouxo?

Vejo como um bom sinal. Acredito que o maior problema tenha ocorrido por conta da forma como nossa política ainda é estruturada, aquela velha maneira de se fazer e pensar política. O Temer assumiu um governo de emergência, tendo que agradar a população, fazer corte de Ministérios, mas também precisando governar, o que a Dilma não conseguia. Para que isso fosse possível ele precisava agradar os partidos políticos, para, em troca, ter apoio no Congresso. Acontece que os próprios líderes de partido acabaram indicando os membros e não indicaram mulheres. Mas é claro que faltou sim, não só mulheres; quanto mais diversidade você tem, mais você representa uma população. A Flávia Piovesan é um excelente nome nos Direitos Humanos. E embora tivéssemos uma presidente mulher e com várias ministras, ela nunca chamou as mulheres para conversar. E ele, seja ou não por pressão, em seis dias de governo chamou a bancada feminina para conversar.

3. O Brasil tem apenas 9% de mulheres em cargos legislativos. O sistema de cotas seria a solução para chegar à paridade?

MG: Hoje já existe a reserva mínima de 30% das vagas de candidatos mulheres para cada partido, mas ainda não trouxemos essa porcentagem para dentro dos parlamentos. A bancada feminina do Congresso Nacional tem 10,77% das cadeiras – 13 senadoras (16,05% das 81) e 51 deputadas federais (9,94% das 513). Não concordo com as cotas obrigatórias de 15% como foi proposto na PEC porque acredito que esse aumento deveria ser reflexo do empoderamento das mulheres na sociedade e a confiança depositadas na competência e honestidade de cada uma pelo voto. Mesmo com avanços, os partidos políticos ainda continuam como redutos masculinos e a política ainda se mostra como um ‘jogo sujo’.

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Infelizmente, o noticiário recente comprova muito disso. Acredito que isso desanime muitas mulheres a se filiarem a um partido – coisa obrigatória para ser candidata a qualquer cargo eletivo. Porém, já existe um número grande de lideranças femininas, sobretudo nas periferias, que lutam por inclusão de pessoas com deficiência, melhoria de escolas, entre outras demandas de suas comunidades. Precisamos de mais mulheres como Ruth Cardoso, com uma história digna de militância intelectual e política, para inspirar as novas gerações e entrarem para a vida pública. Isso seria, de fato, transformador.
4. Dilma Rousseff alegou, em seu discurso no “Encontro com Mulheres em Defesa da Democracia” que “O fato de ser mulher teve influência na abertura do meu processo de impeachment.” Você concorda que o sexismo influenciou nas decisões do Congresso e do Senado?

Claro que ainda ocorre discriminação com base em gênero no Brasil. Esse olhar não está apenas em parte do Congresso, mas em diversas áreas de atuação. Um cenário que ainda é fruto de uma sociedade sexista e que tem muito a evoluir em termos de educação, inclusive de formação política e cidadã. No entanto, não foi esse o motivo para a abertura do processo de impeachment da presidente. Aliás, é no mínimo leviano por parte de Dilma levantar esse discurso diante das péssimas tomadas (e não tomadas) de decisão que ela, como autoridade máxima do País, adotou durante sua gestão.

Dilma mascarou as contas públicas, como nenhum governante jamais ousou fazer. E não estamos discutindo gênero aqui, mas sim democracia. Houve sim crime de responsabilidade na gestão das contas e este foi o motivo para que o Congresso autorizasse a abertura do processo de impeachment e o afastamento da presidente. Lembrando que Fernando Collor também foi impedido em processo semelhante.

A gestão de Dilma trouxe graves danos à economia e à sociedade. Hoje, 60 milhões de brasileiros estão inadimplentes, com dívidas pessoais em atraso que totalizam 256 bilhões de reais. Isso representa 41% da população. E destes devedores, 80% têm renda de 1 a 2 salários mínimos. Os mais pobres, os mais vulneráveis, inclusive muitas mulheres, estão arcando com os desmazelos desse governo. Fosse Dilma um homem, estaríamos então todos satisfeitos com o governo?

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