Entrevista: jornalista cria viral e conta como desafiou o conceito de beleza
Com o projeto "Antes e Depois" a americana Esther Honig mostrou como a cultura pode influenciar no padrão de beleza de uma sociedade. Aqui, ela fala sobre exigências estéticas e o esforço de muitas mulheres para alcançar um ideal inexistente.
Na foto da esquerda, a imagem não tratada de Esther. Na da direita, a imagem tratada na Indonésia.
Foto: “Before and After”
Empenhada em mostrar que o padrão de beleza não é único e, sim, varia de acordo com a cultura de cada país, a jornalista americana Esther Honig criou o projeto “Antes e Depois“. “O Photoshop se tornou um símbolo dos padrões de beleza inalcançáveis da nossa sociedade”, disse Esther com exclusividade ao site de CLAUDIA. A jornalista enviou um mesmo retrato seu (de cabelo preso e ombros à mostra) para usuários do programa de edição de imagem em mais de 25 países como Chile, Alemanha e Sri Lanka com a ideia de examinar como os padrões culturais variam em um nível global. Veja abaixo como surgiu o projeto e o que ela tem a dizer sobre o tema:
Como surgiu o projeto?
Quando descobri o Fiverr, um site internacional no qual você pode contratar pessoas de todo o mundo para executar qualquer tipo de arte digital. Ali, eles oferecem o serviço de freelancers especialistas em Photoshop, o que pareceu uma ótima oportunidade de conduzir um experimento sobre a variação do padrão de beleza no mundo.
E por que fazer essa análise via Photoshop?
Hoje, quase todos sabem que as imagens que vemos nas revistas e na televisão foram modificadas de algum modo para que aceitássemos essas alterações digitais naturalmente, como uma parte da nossa visão. Meu objetivo com o Antes e Depois era explorar o Photoshop em uma escala global e continuar um debate sobre as implicações do uso da tecnologia para esse fim.
Quando você recebeu as suas fotos modificadas, o que veio à sua mente?
Marrocos me mandou a imagem mais dinâmica. A escolha do criador de me cobrir com lenços na cabeça me mostrou uma noção de beleza relacionada a costumes de religião – um elemento que eu não tinha considerado. Já a imagem que veio dos Estados Unidos (com o cabelo loiro e olhos verdes), em um primeiro momento, me assustou: foi manipulada tão radicalmente que senti como se estivesse olhando em um espelho, sem reconhecer meu rosto.
À esquerda, a foto do Chile. À direita, de Marrocos.
Foto: “Before and After”
Como os padrões de beleza influenciam as mulheres?
Existe uma imensa pressão para cumprir os padrões de beleza estabelecidos pela nossa sociedade e perpetuados pela mídia. Se sentir bonita ou não tem um reflexo direto na autoestima e, para as mulheres, tem um efeito ainda maior do que outras características (como a inteligência e a habilidade nos esportes). Por isso é tão comum que mulheres, e especialmente as mais jovens, entrem em uma obsessão por corresponder a um ideal através de dietas mirabolantes ou até cirurgias.
As diferenças entre um padrão e outro são apenas culturais?
De um ponto de vista antropológico, o que influencia no ideal de beleza é a classe, a raça e a condição de saúde. Esses três elementos variam de cultura para cultura, logo, imagino que seja por isso que o conceito mude tanto dependendo de onde você está. A globalização é um fator novo nessa conta: quanto maior, mais eurocêntrico o padrão. Justamente por isso temos visto alguns países caminhando em direção a um visual que inclui pele e olhos mais claros — uma visão típica do mundo ocidental. A extensão dessa influência varia e tem tido um impacto diferente em cada lugar.
O que faz cada país ter seu próprio modelo de beleza?
No contexto do meu projeto, temos que entender que esses photoshoppers estão trabalhando de acordo com suas próprias influências culturais e estéticas. É este o porquê de imagens modificadas de formas tão drásticas e variadas.
Em que ponto você acha que padrões de beleza se tornam prejudiciais?
Na verdade, é a obsessão por um único padrão de beleza que se torna prejudicial. Quando tais conceitos são muito singulares, há menos espaço para a diversidade e poucos se sentem de acordo com as normas. Entretanto, quando diversificamos esse padrão e comparamos modelos de beleza inatingíveis em escala global, o conceito se torna neutro. Simplesmente não pode haver um ideal se todos têm aparências ideais diferentes.
Na foto da esquerda, a imagem tratada na Alemanha, com a pele mais clara. Já a direita, dos Estados Unidos, clareou o cabelo e bronzeou a pelem (além de mudar a cor dos olhos).
Foto: “Before and After”
O que pode mudar essa obsessão pela perfeição?
Como uma mulher jovem, acho importante poder desenvolver minha própria definição de beleza. Para começar, sugiro que ampliemos nossa perspectiva aprendendo mais sobre outras culturas e compreendendo que há decepção por trás das indústrias da moda e da beleza. Nós poderíamos gastar nossas vidas inteiras tentando alcançar os padrões inatingíveis apresentados a nós, mas isso nos tornaria infelizes e forçaria a renunciar aspectos mais prazerosos da vida.
Com o que você está trabalhando no momento?
Eu estou desenvolvendo uma segunda parte do Antes e Depois e trabalhando em reportagens de interesse humanoa no Centro-Oeste americano e exterior.
A imagem tratada nas Filipinas acrescentou cabelo, maquiagem carregada e até acessórios.
Foto: “Before and After”