PrograMaria: Iana Chan ajuda a capacitar mulheres na tecnologia
Acolhendo outras profissionais, a empreendedora quer alcançar um futuro mais inclusivo e justo
A paixão de Iana Chan pela programação começou no momento em que usou um computador pela primeira vez, aos 12 anos. Mesmo sem internet, a empreendedora por trás do PrograMaria, organização que busca diversidade de gênero na tecnologia, fingia que estava enviando e-mails por meio do pacote Office, fascinada pela ideia de construir algo por meio da inovação.
O interesse apenas se intensificou quando a conexão online finalmente chegou. “Naquela época, vivíamos a febre dos blogs. Eu havia criado um com as minhas amigas e queria deixá-lo com a minha cara”, diz. Para isso, começou a buscar tutoriais de programação e HTML para colocar efeitos no cursor e personalizar o estilo da página. “Foi aí que percebi o quanto me interessava por essa linguagem.”
Na hora de se inscrever no vestibular, porém, Iana acabou optando pelo jornalismo. “Olhando em retrospecto, percebo que fui afetada por essa ideia da tecnologia ser uma área masculinizada. Eu pegava o livro de profissões e pulava os institutos de engenharia e matemática. Pensava: o que eu vou fazer no meio desse monte de homem? Esse mundo não é para mim”, relembra.
Iana passou cinco anos no jornalismo, incluindo dois na revista Nova Escola, à época na Editora Abril, até migrar de área e trabalhar integralmente com tecnologia. Foi então que passou a vivenciar o machismo, típico do ramo, na pele.
“Lembro até hoje: estava na minha primeira reunião com fornecedores terceirizados e, ao chegar na sala, não havia mulheres. Os olhares faziam eu me sentir como se não pertencesse àquele ambiente”, diz.
Enquanto explicava o projeto, um dos líderes da empresa contratada a interrompeu, colocando a mão na frente de seu rosto e afirmando: “Gente, eu não sei se vocês estão entendendo o que a Iana quer dizer, mas vou explicar melhor”. A programadora ficou em choque: “Ele falou de uma forma como se eu não estivesse lá. Saí muito incomodada”.
Foi a partir desse e de outros episódios sexistas que nasceu o embrião do que seria a PrograMaria. “Estava desabafando com duas amigas. Uma delas, empreendedora, se queixou que, por não ter conhecimento na área, não sabia se o programador que havia contratado a estava enrolando”, diz.
A outra, designer, estava insegura. “Ela me contou que todos os lugares estavam exigindo programação no currículo, e ela achava que era ‘burra’ demais para aprender.” Foi essa junção de falas que lhe trouxeram a certeza de que era necessário mudar o cenário. “Precisávamos de mais mulheres no ramo”, pensou.
PrograMaria
Tudo começou em 2015, com a criação de um metasite onde as inscritas podiam acompanhar o desenvolvimento da página do PrograMaria, com explicações sobre como cada elemento da URL estava sendo construído.
A primeira tentativa foi bem-sucedida e, em 2018, o projeto se transformou oficialmente em um negócio de impacto social. Desde então, Iana oferece cursos focados no público feminino sobre front-end, back-end, infraestrutura digital e experiência mobile. “Este ano teremos aulas focadas em dados”, revela.
Mais de 13 mil “astronautas” (como Iana chama as matriculadas) já passaram pelo projeto, sendo 43% das inscritas pessoas negras e 35% pertencentes à comunidade LGBTQIAPN+: “Criamos metáforas para explorar o universo da programação. Cada linguagem é um planeta. Gosto de tornar as coisas bem lúdicas para que todas se sintam à vontade, acolhidas e pertencentes”.
Os esforços de Iana, inclusive, foram reconhecidos mundialmente. Em 2020, a empreendedora foi considerada pela revista americana Wired como uma das 50 pessoas que mais expandiram a criatividade em nosso país. Também foi eleita Profissional Tech do Ano pelo prêmio “Mulheres que Transformam”, da XP Inc.
Hoje em dia, Iana está dedicada a conscientizar o público de que as novas tecnologias — principalmente as IAs generativas — também podem reforçar injustiças e vieses sexistas e racistas.
Se não estivermos cientes disto, é muito provável que caminhemos em direção a um futuro em que a tecnologia continue aprofundando desigualdades, em vez de combatê-las. “Cada vez mais iremos puxar esse debate. O trabalho de conscientização é urgente.”