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“Depois do abuso, ainda criança, fiquei viciada em masturbação e pornô”

A leitora Fátima* foi abusada por seus primos. Sem entender o que aconteceu, desenvolveu uma relação negativa com o sexo que lhe causou depressão

Por Da Redação
4 out 2020, 09h00
mulheres
 (Palmiro Domingues/Getty Images)
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“Tudo começou quando eu tinha 8 anos. Fui passar a tarde na casa de uma tia, de quem sempre fui próxima. Ela tem dois filhos, a menina, que era mais velha, já estava noiva e o menino, que tinha 21 anos na época.

No dia em que o episódio aconteceu, só estavam minha tia e meu primo em casa. Durante a tarde, depois do almoço, minha tia se deitou no sofá da sala e acabou dormindo. Eu era uma criança e fui para o quarto do meu primo onde tinha um computador. Não era muito comum ter computador em casa naquela época e eu gostava de mexer nesse, de jogar.

Quando entrei, ele estava mexendo no computador. Não lembro muito bem de todos os detalhes, mas lembro que ele colocou um vídeo pornô e me mostrou. Eu estava sentada na cama e logo depois ele colocou a mão em minhas partes íntimas e introduziu o dedo em mim.

Não sei o que passou na minha cabeça, eu não fazia ideia do que era sexo antes daquilo, só sei que congelei. Não tive reação, não fiz nada. Lembro de depois ir correndo para o banheiro, tudo era muito estranho para mim. Depois do ocorrido tudo mudou na minha vida. Eu sabia que aquilo não deveria ter acontecido, mas não sabia que ele era o único culpado!

Não contei para minha mãe, pois me sentia responsável pelo ocorrido. Passei os anos seguintes me afundando em vídeo pornô e me sentido culpada por, na minha cabeça, ter “atraído” aquilo. Depois disso, algumas outras situações ocorreram envolvendo mais dois outros primos, mas não chegaram a este ponto.

Eu sempre senti que estava atraindo essas atitudes deles, me culpava. Hoje, vejo que estes primos
eram muito próximos, provavelmente deveriam ter conversado sobre mim e de certa forma confabulado tudo.

Com o passar dos anos, fui crescendo e me dando conta do que realmente aquilo tinha significado. Comecei a ter repulsa por esse primo. Algumas vezes, ele ia em casa e falava coisas para mim quando ninguém estava por perto, dizendo que ia namorar comigo.

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Aquilo me incomodava muito, mas ainda assim não tinha coragem de dizer nada. Sempre carreguei esse segredo comigo e o sentimento de culpa me levou a situações desconfortáveis. Comecei a me masturbar muito nova. No começo, logo depois do ocorrido, chegava a introduzir objetos em minha
vagina.

Eu não sabia o sentido daquilo, não sabia sobre prazer ou orgasmo, mas sabia que era sexo e passei a me sentir atraída por isso. Depois, já na adolescência, descobri o orgasmo e então virei escrava da masturbação e do pornô.

Sempre pensava e procurava por situações de sexo forçado e imaginações com meu primo eram frequentes. Conforme comecei a ter consciência de que ele era um abusador e de que ele havia me abusado, comecei a sentir uma profunda tristeza depois da masturbação.

Aí passei a evitar pensar nele, mas muitas vezes a imagem dele surgia inconscientemente e aquilo se tornou um pesadelo para mim. Então, depois de muito sofrimento, consegui parar de me masturbar.
Já no final do ensino médio, comecei a namorar um menino e, então, voltei a ter contato com meu lado sexual.

Mas, sempre tive dificuldade em manter relações sexuais. Nunca consegui sentir prazer com meu namorado e um dia durante o sexo tive uma crise de choro que veio do nada. Naquele momento,
percebi o quanto ter passado por aquela situação e ter guardado tudo para mim, por tanto tempo, havia me trazido inúmeras sequelas.

Fiquei dois anos namorando este menino em uma espécie de dependência afetiva e quando ele terminou comigo, me senti sozinha. Todo sentimento guardado pelo abuso veio à tona e entrei em depressão, cheguei a pensar em suicídio. Mas, graças a Deus, procurei um psicólogo e psiquiatra, tomei antidepressivos e com o tempo a depressão foi passando.

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Hoje sou formada, não namorei mais ninguém depois do término. Nessas voltas da vida me descobri bissexual, e, talvez pelo ocorrido, sinto mais atração por mulheres do que por homens. Tenho dificuldades em me relacionar com as pessoas, me sinto muito só, mesmo tendo pessoas que me amam ao meu redor.

Ainda tenho muito o que melhorar e pretendo fazer isto com a ajuda de um psicólogo, mas hoje tenho plena consciência de que fui uma vítima e jamais a culpada. Pretendo, um dia, poder ajudar meninas e mulheres a se libertarem do peso da falsa culpa por um abuso sexual.”

A partir de agora, CLAUDIA mantém esse canal aberto e oferece acolhimento para quem quiser libertar as palavras e as dores que elas carregam. Fale com CLAUDIA em falecomclaudia@abril.com.br.

*Nome trocado a pedido da personagem

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