Fernanda Montenegro: “Sexo na terceira idade existe, sim!”
A atriz fala sobre a novela Babilônia, a polêmica envolvendo sua personagem e também como lida com o envelhecimento
Histórias de casais gays que superam o preconceito estão se tornando comuns em novelas. Só que, quando se trata de um romance em que as protagonistas são Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg, duas (maravilhosas) atrizes de 85 anos, dá-lhe polêmica! Em Babilônia, elas vivem Teresa e Estela, que mantêm um relacionamento sólido há quase quatro décadas. Embora o beijo trocado por elas no primeiro capítulo tenha sido discreto, muita gente achou a cena absurda. “Quem pensa que sexo na terceira idade não existe são os jovens, que ainda não chegaram lá”, afirma Fernanda Montenegro, que bateu um papo com a gente sobre amor, preconceito e envelhecimento.
Você acha que existe preconceito também em relação ao sexo na terceira idade?
Os que acham que não existe sexo na velhice são jovens, mas, quando chegarem a essa idade, irão ver que é diferente. Quem pensa assim vai ver quando envelhecer que esse pensamento se resume a uma palavra só: preconceito. E de preconceito já estamos cheios. Está na hora de mais uma vez lutarmos contra isso de fato.
Ainda sobre preconceito, quais temas que você gostaria de ver abordados em outras novelas?
A união de velhos de terceira, quarta e quinta idade. Outro exemplo que seria bom abordar é a vida dos leprosos. Existem milhões de zonas escuras e fragilidades no ser humano quando se trata de uma doença. Havia um tempo em que a maior desgraça que poderia acontecer a uma pessoa era a tuberculose! Isso era um pânico, como é a AIDS hoje em dia. É bom falar disso.
Todo ser humano tem o direito de ser o que quer
Muitas atrizes acham que você é um exemplo de beleza na terceira idade justamente por ter a aparência muito natural. Como se cuida?
Eu costumo falar que tomo banho duas vezes por dia [risos], procuro sempre fazer meus exames semestrais e vou ao dentista. Eu já comi muito, mas agora tomo mais cuidado, não fico me entupindo de comida. Tenho uma grande terapia ocupacional, que é a minha profissão. Não fico em casa sentada esperando nada acontecer.
E você é a favor das plásticas ou já fez alguma?
Há 40 anos, eu já tinha estas bolsas [apontando para os olhos], e aí eu fiz plástica para tirá-las, mas elas voltaram, ainda piores. Pensei: então, agora vão ficar aí mesmo [risos].
Pratica alguma atividade física?
Eu sou de organismo magro. Deus me deu esse negócio. Eu trabalho muito e sou ágil. Lógico que uma vez ou outra o corpo apresenta algum probleminha, mas não é só velho que tem isso. Tem até crianças que também nascem com problemas de saúde!
É a primeira vez que você representa uma homossexual?
Não. Eu fiz, no teatro, As Lágrimas Amargas de Petra von Kant, no começo da década de 1980, por vários anos. Na televisão, sim, é a primeira vez. É um prazer fazer esse papel com uma companheira maravilhosa de profissão e de geração como a Nathalia.
Chegou a escutar algum tipo de comentário preconceituoso sobre essa personagem?
Podem até fazer alguns comentários particulares, mas a sociedade já caminhou bastante nesse sentido. Não como nós queremos que caminhe, mas já enxergamos uma luz no fim do túnel. O trabalho não é para espantar ou ofender ninguém; estamos apenas mostrando duas mulheres que têm uma vida em comum há quase 40 anos. Elas têm uma vida normal na sua beleza, nas suas necessidades sexuais particulares.
Já conviveu com um casal assim na vida real?
Eu sei de casos como esse que a sociedade aceita, sim. Já vi mulheres que têm filhos juntas e vão a festinhas de aniversário, as mães vão, os coleguinhas vão, tudo normal. A novela faz isso de uma forma mais popular; vai ser bom para abrir a cabeça de quem ainda resiste. Acho que essa é a caminhada do ser humano: ter direito de ser o que quer e ter a sua vida plenamente realizada. Agora, lógico que o preconceito ainda existe. Muita gente banca a moderninha publicamente, mas pensa: não traga isso para dentro de casa.
Como você define a Teresa?
Ela é uma mulher muito consciente, uma advogada que sabe contestar e tem coragem de sempre defender o que acha justo para a sociedade. Isso tudo é interessante porque o Gilberto Braga não faz somente um blá-blá-blá seco e direto na novela. A Teresa é uma pessoa muito humana, é uma mulher quente, que vê a vida pelo sentimento.