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Xenia França: “O externo não pode pautar minha subjetividade”

Cantora, filha de Oxum, tema de novela das nove, vencedora do Grammy Latino e garota Chanel no Brasil. Tudo isso é Xenia, artista espiritual e espirituosa

Por Bárbara Poerner
8 mar 2024, 08h48
xenia frança capa claudia março 2024
Xenia França usa vestido, The Esthe. Brincos e colar, Olsen K Sandália, Louis Vuitton (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)
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A estrela na capa de CLAUDIA deste mês tem curiosidade por tudo “que não se pode ver”. A definição parte dela mesma — estelar também no nome. Literalmente: sua certidão de nascimento consta Xenia Eric Estrela França. Não à toa, a mesma palavra nomeia o álbum vencedor de um Grammy Latino em 2023, o Em Nome da Estrela. Holística, espirituosa, esotérica, filha de Oxum, apaixonada por skincare, garota Chanel e tutora de dois gatos, ela definitivamente não é uma mulher de uma única sentença — e tampouco de acasos. Mas já veremos isso.

Mais conhecida por sua trajetória musical, Xenia começou a carreira na moda. Nascida no Recôncavo Baiano, desembarcou em São Paulo aos 16 anos trazendo na mala o sonho (e o talento, como se vê pelas fotos) de ser modelo.

xenia frança capa claudia março de 2024
Xenia França usa brincos e anel Olsen K. Vestido The Esthe . Sandálias Louis Vuitton. (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)

O apreço pela estética e pela imagem é mais antigo ainda, data da infância, impulsionado por sua mãe, uma mulher extremamente vaidosa. “Uma vez eu fui para a aula de educação física de salto alto. Eu tinha uns 10 anos de idade”, diz ela, rindo e entendendo essa memória como uma espécie de projeção do futuro.

Os cabelos longos e volumosos, como os do ensaio, não são acidentais. “Tenho uma obsessão por cabelo longo desde a primeira infância.”

Sua relação com a Bahia é umbilical. “Eu sou a Bahia”, diz a artista, que tenta visitar a terra natal pelo menos uma vez por ano. De lá, carrega sua essência para o resto do mundo, pois, para Xenia, viajar é somar bagagem de vida.

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Xenia França usa brincos e anel Olsen K. Vestido The Esthe . Sandálias Louis Vuitton. (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)
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Uma de suas experiências mais marcantes aconteceu em Paris — recentemente, a cantora se tornou amiga da marca de alto luxo Chanel, e passou a ser convidada a acompanhar os desfiles na capital francesa. Na ocasião, teve a oportunidade de conhecer sua grande ídola, a modelo Naomi Campbell: “Maravilhosa”.

Ainda sonha em conhecer o Japão, junto a outros países da Ásia e da África. “Tenho necessidade de absorver o mundo inteiro e misturá-lo com essa Bahia que tem dentro de mim.” 

A música é o idioma de Xenia França

xenia frança ensaio claudia 2024
Xenia França usa top e saia The Esthe . Brincos Olsen K . Anéis, colar e pulseira Bulgari . Botas Louis Vuitton (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)

Para Xenia, uma coisa é certa: “A música não é só um artefato ou objeto de entretenimento, mas um fenômeno da natureza”. Essa não-definição permite também que a artista não veja necessidade em se encaixar em um único estilo musical. Ela faz música. Ponto.

“Obviamente meu trabalho está embasado na MPB, no jazz, no R&B e na black music mais clássica, ou mesmo no samba. Mas ele não se restringe a isso”, diz. Para ela, tudo é construção e desenvolvimento, o que permite que a cantora vá elaborando a sua personalidade ao mesmo tempo em que cria sua música.

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“Tenho certeza de que ainda estou nessa toada. A cada álbum, a cada música gravada, estou tentando alcançar o melhor de mim.”

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Xenia França usa joias, Bulgari. Vestido, Fendi (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)
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Xenia França usa joias, Bulgari. Vestido, Fendi (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)

O gosto pelo som, o rádio e os discos acompanha Xenia desde cedo. Recém-chegada em São Paulo, em 2004, descobriu que a cidade era uma fonte inesgotável de energia e efervescência cultural, de bares e lugares para assistir shows e espetáculos.

A partir daí, começou a ser chamada para cantar em estabelecimentos, criou contatos e fez aulas de canto e teoria musical para se especializar na técnica. Hoje, procura se envolver em todas as etapas do seu trabalho: da pré-produção à concepção dos shows.

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Para isso, reúne pessoas nas quais confia e com quem procura trabalhar em sinergia. Como exemplo, ela cita dois colegas, o produtor Pipo Pegoraro e o arranjador Lourenço Rebetez, que produziram ao seu lado o álbum Em Nome da Estrela.

O disco foi o vencedor do Grammy Latino 2023 na categoria de Melhor Álbum Pop Contemporâneo em Língua Portuguesa. A artista ainda acumula indicações anteriores em Melhor Canção em Língua Portuguesa e Melhor Álbum Pop Contemporâneo por seu primeiro e homônimo álbum, além de ter concorrido ao Women Music Awards e Billboard WIM Awards em Melhor Videoclipe e Melhor Show. A conquista de 2023, marcante, tornou-se “um mantra antiproblemas”, diz. “Qualquer coisa que acontece na minha vida agora, eu falo: ‘Xenia, você ganhou um Grammy, para!’”

Em Nome da Estrela reúne composições autorais e também regravações de Futurível (Gilberto Gil) e Magia (Djavan), obras de artistas que, segundo ela, lhe dão orgulho de ser brasileira.

“Tenho certeza que até os aliens conhecem Gil e Djavan, e os escutam no café da manhã”, brinca. Mas as canções que Xenia quer regravar não acabam por aí.

“Sinto que eu vou sempre estar dizendo ‘eu te amo’ pra algum mestre nos meus trabalhos. Regravá-los é como eu expresso a minha devoção pela arte deles. Como sou uma artista de outra geração, faz sentido que eu atualize as pessoas que gostam da minha música.”

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Xenia França ensaio claudia 2024
Xenia França usa brincos, Olsen K. Anel, caftan, calça e chinelos, Chanel (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)

Ao lado de Luedji Luna, Xenia regravou recentemente Lua Soberana, música de Ivan Lins que virou tema de abertura da novela Renascer, remake do sucesso exibido pela Globo em 1993.

Xenia se lembra da versão original: “Foi uma das primeiras novelas que assisti com a minha mãe. Ela chegava do trabalho, tomava banho, deixava tudo organizado e a gente se juntava para assistir”.

A artista celebra a participação na nova novela e acredita que estar em uma produção como essa, na TV aberta, é uma outra forma de entrar na vida das pessoas. 

A moda na vida de Xenia

Xenia França ensaio claudia 2024
Xenia França usa brincos, Olsen K. Anel, caftan, calça e chinelos, Chanel (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)
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Na adolescência, Xenia adorava revistas de moda — foi quando se apaixonou por Naomi Campbell, aliás. Naquela época, em meados dos anos 2000, o Brasil exportava estrelas de passarela que, a exemplo de Gisele Bündchen, promoviam o que seria a “cara da mulher brasileira”.

Xenia decidiu tentar a carreira de modelo inspirada nesse movimento, o que a levou a se mudar para São Paulo em 2004. Para uma menina negra, porém, os caminhos não foram tão fáceis. 

Foram as dificuldades desse comecinho que a ensinaram a importância do autoconhecimento. “Só existe uma de mim e se eu não aprender a criar um relacionamento comigo mesma, nunca vai haver autoestima. A sociedade sempre vai atualizar o padrão de beleza, e pode ser que o próximo não seja o meu. Ou seja, o externo não pode pautar minha subjetividade”, complementa.

Esse pensamento permite que a artista trabalhe com sua imagem de forma autônoma, seja cantando, se apresentando, fotografando ou fazendo ensaios de revistas.

“Aprendi a lidar e a trabalhar para que a minha parte externa seja totalmente eu. Assim tenho controle sobre onde eu quero estar, como eu quero estar, a maneira como quero aparecer.”

Xenia França ensaio claudia 2024
Xenia França usa vestido, The Esthe. Brincos e colar, Olsen K Sandália, Louis Vuitton (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)

De fato, ao posar para nossa capa, Xenia sabia exatamente como posicionar braços, queixo, olhos para alcançar o efeito desejado. Depois, ao final de quase 10 horas de trabalho, fez questão de revisar as centenas de imagens que resultaram nestas fotografias finais. 

Da mesma forma, ajudou a escolher as peças que vestiria neste ensaio. Chanel, é claro — mas também Louis Vuitton, Fendi e The Esthe. Xenia cultiva um carinho especial pela figura de Coco Chanel.

Quando foi a Paris pela primeira vez em 2022, convidada pela grife, conheceu o apartamento da estilista e se encantou com a cor das paredes, pintadas de amarelo dourado.

Assim que voltou para seu apartamento, em São Paulo, decidiu pintar as paredes com um tom parecido, ocre. Quando viu que havíamos escolhido a exata mesma cor para servir de cenário para este ensaio, Xenia riu da coincidência. Definitivamente, não é uma mulher de acasos.

Juntar a moda à música foi orgânico para Xenia. Para ela, ambas andam de mãos dadas. Como exemplo, cita Michael Jackson e suas luvas, sapatos e chapéus, símbolos indissociáveis do rei do pop. “Estou aprendendo a desenvolver essa outra linguagem, que eu também considero artística, que é a minha relação com a moda.” 

Um exemplo são os acessórios, que têm um significado próprio para ela. Ao pensar em Xenia França, talvez lhe venha à cabeça colares, brincos e anéis.

“Meus adornos pessoais são meus objetos de poder. Eu empodero essas coisas e elas me empoderam de volta, é uma troca”, argumenta. Não se trata de uma relação meramente da vaidade, focada em joias e minerais — em vez disso, descreve-a como um ímpeto “holístico, esotérico — uma maneira de potencializar as minhas energias através das coisas que estão sobre o meu corpo”. 

É d’Oxum

Xenia França Claudia 2024
Xenia França usa vestido e sandálias, Louis Vuitton. Brincos, anéis e pulseira, Bulgari. (Raquel Espírito Santo/CLAUDIA)

O que une todas as vertentes da artista, porém, vem de outros planos. Xenia é uma pessoa de espiritualidade aflorada. A artista é filha de Oxum, orixá cultuada em religiões de matriz africana que, entre outras definições, é a deusa do ouro e da água doce. Embora conserve uma relação próxima com a entidade, a artista prefere reforçar que é apenas uma pessoa espiritual. 

No seu tempo livre, Xenia gosta de escrever em seu diário, fazer “caminhadas da gratidão” (caminhar por parques agradecendo por alguma conquista), decorar a casa, comprar flores e fazer skincare.

Mas o que é recorrente é a conexão com aquilo que não vê. “Todo o tempo que eu tenho, estou com um fone de ouvido, me atualizando, me nutrindo de coisas que fazem eu abrir os meus olhos”, compartilha.

O agora é o único lugar onde ela quer estar. “Eu não tenho muita noção de como vai ser o meu futuro, mas, se ele for parecido com meu presente, posso dizer que estarei muito feliz”, diz.

Para Xenia, a verdadeira definição de estar presente é um compromisso da memória: “Tenho feito os meus exercícios para que essa conexão com minhas experiências marcantes seja realmente inesquecível porque sabemos que estamos aqui só de passagem. Nada vai comigo. Nem o Grammy vai comigo, só a experiência do Grammy, só aquele momento mágico”. 

Por isso, Xenia cultiva um constante estado de atenção e deslumbramento. Isso vale para os momentos grandiosos, é claro, como capas de revista, prêmios internacionais, músicas na novela.

Mas é especialmente importante para os instantes cotidianos: um afago nos seus gatos, uma borboleta voando, um buquê de flores, Oceano, de Djavan. “Eu sou atenta à vida, porque a vida está o tempo todo se comunicando comigo de mil formas. E se eu não estiver atenta à vida, vou estar atenta a o quê?”  

Texto: Bárbara Poerner
Foto: Raquel Espírito Santo
Styling: Renata Brosina
Beleza: Camila Anac
Direção de arte: Kareen Sayuri

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