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Domitila Barros reflete sobre carreira, saúde mental e Big Brother Brasil

Tão forte quanto sensível, Domitila Barros encanta o público brasileiro ao mostrar que existe doçura em meio às lutas diárias

Por Kalel Adolfo
14 jun 2023, 08h55

Quando Domitila Barros passou sorridente pelo pequeno portão de nosso estúdio fotográfico, por volta das 11 da manhã, o dia estava com uma atmosfera semelhante à sua energia: vibrante, ensolarado e, de certa forma, aconchegante.

Foi entre reflexões místicas (ela pressentiu que o número do endereço, ‘888’, atraía prosperidade), risadas genuínas e flashes belíssimos que sentamos no camarim, ambos descalços, para esse papo. Eu queria compreender como alguém conseguia abraçar o mundo de forma tão voraz.

Regata, Hist; jeans, Another Place; mocassim, Sarah Chofakian.
Regata, Hist; jeans, Another Place; mocassim, Sarah Chofakian. (Thiago Santos/CLAUDIA)

Para contextualizar: aos 15 anos, Domitila recebeu o prêmio ‘Sonhadores do Milênio’ da Unesco. Com 21, conquistou uma bolsa de estudos na Alemanha para realizar um mestrado em ciências sociais. Entre os corredores da Universidade de Berlim, ganhou a chance de entrar para o elenco da novela alemã Gute Zeiten, schlechte Zeiten, exibida pela RTL Television.

No ano passado, buscando quebrar ainda mais barreiras em sua trajetória, se inscreveu no Miss Alemanha, vencendo a competição entre mais de 12 mil candidatas. E claro, neste ano, a estrela entrou de vez no radar do público brasileiro ao ser a grande protagonista do Big Brother Brasil 23 — mesmo sem ter vencido o maior reality show do país.

Não há como negar que este é um ser com uma potência notável: “Minha mãe sempre dizia, desde cedo, que o mundo era pequeno para mim, que eu era de outro planeta”, brinca.

Com apenas 15 anos, Domitila recebeu o prêmio ‘Sonhadores do Milênio’ da UNESCO.
Com apenas 15 anos, Domitila recebeu o prêmio ‘Sonhadores do Milênio’ da UNESCO. (Thiago Santos/CLAUDIA)

Talvez só pertencendo a outra galáxia para conseguir ressignificar tantas vivências e usá-las como combustível para abraçar o ativismo social ininterruptamente:

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“Vim de Linha do Tiro, comunidade do Recife. Antes de nascer, meus pais comandavam um projeto [CAMM – Centro de Atendimento a Meninos e Meninas] destinado a dar aulas de alfabetização para crianças em situação de risco. Então, quando vim ao mundo, já haviam cinquenta crianças carentes que eram meus irmãos e irmãs. Com o passar dos anos, tive algumas experiências que me marcaram. A mais traumatizante foi presenciar a morte de uma amiga por bala perdida, aos 12. Isso me motivou a ensinar meus colegas a ler e escrever, para que eles pudessem reconhecer o letreiro do ônibus, saber qual pegar e voltar para casa em segurança.”

Trenchcoat, Burberry; moletom, Zara; shorts, Intimissimi; meias, Calzedonia; tênis, New Balance.
Trenchcoat, Burberry; moletom, Zara; shorts, Intimissimi; meias, Calzedonia; tênis, New Balance. (Thiago Santos/CLAUDIA)

Nessas aulas, Domitila inseria elementos do teatro para tornar a experiência tanto culturalmente enriquecedora quanto escapista (já que a necessidade do aprendizado escondia uma motivação melancólica).

“O projeto dos meus pais contava com aulas de teatro, que comecei a fazer bem cedo. Sempre gostei de atuar pois, nos palcos, eu podia ser o que quisesse. Ali, eu não era apenas a menina de Linha do Tiro. Eu era atriz, cientista e o que mais desejasse ser. Foi por esse esforço que recebi o prêmio da Unesco e percebi a potência do ativismo.”

É inevitável indagar, porém, como alguém tão focada em ajudar o próximo consegue ter espaço mental para cuidar de si. Para a ativista, o grande obstáculo em relação ao autocuidado em sua vida não foi encontrar tempo, mas, sim, acreditar que merecia se acolher.

Terno, Dod Alfaiataria; mocassim, Sarah Chofakian.
Terno, Dod Alfaiataria; mocassim, Sarah Chofakian. (Thiago Santos/CLAUDIA)

“Por muitos anos achei que era egoísmo me cuidar. Lembro de uma situação em que fui a um jantar de gala e pensei: ‘Minha família está agora na comunidade comendo com as crianças e eu estou aqui’. Naquele dia, quase não consegui jantar. Foi um processo muito longo de cura mental e espiritual até eu aceitar que estava apenas colhendo o karma [positivo] por me dedicar ao ativismo social por tanto tempo. Não podemos amar o próximo e sermos péssimos conosco. E eu sou uma pessoa que, além de me cobrar excessivamente, falo muito mal de mim”, compartilha.

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A virada de chave neste pensamento autodestrutivo veio à tona após Domitila sofrer um burnout ao completar 30 anos: “Cheguei a pesar 42 quilos e estava com pancreatite. Minha terapeuta disse que, se eu não passasse a me priorizar, não chegaria aos 40. Precisei disso para entender que autocuidado não é luxo, é necessidade. As pessoas falam bastante sobre amor próprio, mas é impossível nos amarmos 24 horas por dia. Por isso, passei a realizar o exercício diário de me amar mesmo quando errava. São nesses momentos que mais precisamos de nós mesmas.”

Novas alturas

Top, Another Place; trenchcoat, Estúdio Traça; bermuda, Levi's; piercings, Usejoias.
Top, Another Place; trenchcoat, Estúdio Traça; bermuda, Levi’s; piercings, Usejoias. (Thiago Santos/CLAUDIA)

Na vida, nos palcos, nas telas, ao vivo: não importa o formato, Domitila se entrega e incorpora muitas facetas (e todas com tamanha facilidade). Prova disso são as fotos deste ensaio.

Com a versatilidade da modelo em mente, é hora de perguntar sobre a sensação de ser uma brasileira vencendo o Miss Alemanha. Ela abre mais um sorriso e diz: “Minhas pernas ficaram fracas, eu caí no chão. A caminhada até aquele palco foi tão árdua que, quando isso acontece, em um país que não é meu, numa língua que não é minha, e com um público que eu ainda não compreendia, fiquei comovida. Definitivamente não esperava chegar tão longe”, conta.

Da mesma forma que Domitila Barros não esperava chegar tão longe na competição, seus amigos e familiares jamais esperariam que, após inúmeros feitos, o próximo passo da ativista seria ingressar no Big Brother Brasil.

“Todos ao meu redor entraram em pânico. Mesmo assim, eu sabia o quão importante era impactar as pessoas com as minhas pautas. Jamais conseguiria alcançar milhões de brasileiros em apenas três meses se não fosse ali dentro. Isso foi maior que o meu medo.”

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Vestido, Patu + Pinga; piercings, Usejoias.
Vestido, Patu + Pinga; piercings, Usejoias. (Thiago Santos/CLAUDIA)

Curiosamente, ela compartilha que a parte mais fácil da experiência foi ser vigiada 24 horas por dia, pois cresceu ao lado de milhares de crianças, vindas dos projetos de seus pais. “De certa forma, eu estava sempre sendo observada. Também já sabia lidar com a imprensa desde cedo e entendia sobre as expectativas que poderiam ser criadas em relação à minha participação. A grande dificuldade mesmo foi a convivência com as pessoas lá dentro. Essa foi a pior parte”, revela.

Ela explica que esse desafio a surpreendeu bastante, pois como estava acostumada a estar junto com indivíduos das mais diferentes realidades, imaginou que a relação com os brothers seria tranquila.

Aliás, o seu mote era saber lidar com todos. “No fim, estou abalada até agora. Certa vez, precisei explicar para um candidato por que era tão importante que ele me chamasse pelo meu nome, Domitila Barros, já que o Brasil ainda não me conhecia. Eu era Miss, mas não era rica, influenciadora, nada disso. Entrei no Big Brother para dar o meu nome, e foi um tapa muito grande ver as pessoas tentando desmerecer isso. Tudo o que eu tenho é o meu nome e um sonho, então me deixe pelo menos estar aqui. Era muito desse lugar.”

top, Flavia Aranha; calça, Ateliê Opus; piercings, Usejoias
top, Flavia Aranha; calça, Ateliê Opus; piercings, Usejoias (Thiago Santos/CLAUDIA)

Inclusive, quem acompanhou o programa não pôde deixar de notar as discussões sociais levantadas pela pernambucana, que, mesmo não tendo essa intenção em todos os momentos, acabou impulsionando fortes debates acerca do racismo estrutural para fora das telinhas.

Quando uma candidata se torna autêntica por gritar e falar palavrão, e quem é ofendido é rotulado como briguento, percebemos que a narrativa muda de acordo com quem somos. Isso é uma benção porque, antes, as pessoas achavam que a minha vivência com o racismo era vitimismo. Agora, é só mandar o número do episódio”, pontua.

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E mesmo que não tenha chegado até a final, Domi — como foi carinhosamente apelidada por seus admiradores — está satisfeita com a mensagem que conseguiu transmitir aos lares brasileiros.

Eu não escolhi nascer em Linha do Tiro, nem nascer num corpo negro, então não vou lutar contra isso. Esse é o lugar de onde eu vim, mas mais importante é onde eu quero chegar. Hoje, eu tenho poder de fala no Brasil. Recebo e-mails de pessoas contando que, após a minha participação, estão se candidatando para mestrados no exterior. Mães estão dizendo que as filhas me assistiram e passaram a usar o cabelo natural, sem alisamentos. Podem falar o que for, mas eu tenho consciência de que tive um impacto social relevante para o meu país e para o meu povo.” Nós não temos dúvidas.

  • TEXTO KALEL ADOLFO
  • FOTOS THIAGO SANTOS
  • STYLING MATEUS ANDRADE
  • BELEZA MARCELA HANNA
  • CONCEPÇÃO VISUAL EDUARDO PIGNATA e CATARINA MOURA
  • ASSISTENTE DE FOTO RODRIGO REZA
  • PRODUTORA DE MODA JESSICA GOULART
  • CAMAREIRA ANINHA POLIZEL
  • PRODUÇÃO EXECUTIVA ODMGT
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