Hormônios à vista
Nada mais inspirador do que ver uma mulher madura sendo outra e, ainda assim, sendo ela mesma
Uma amiga menopausada, daquelas que não tem sequer um estrogênio pra chamar de seu, visitou uma ginecologista mulher. Antes, só se consultava com homens. Disse que queria ser outra. Passados anos no vale seco do climatério, ela quis sentir.
Será que não rola uma brecha para uma mínima reposição hormonal? Nessa década pós-câncer ela resistiu, vivendo uma vida banal, histérica, calorenta, duvidosa, mas sempre achando que aquilo seria a sua sina. Um dia, acordou revoltada com as negativas de seu médico homem.
Por que não poderia tentar uma migalha de mudança? Sentou na frente da médica e vomitou suas neuroses desidratadas, implorando com o olhar por uma saída. A médica, linda, jovem, cheia de tesão na existência, lhe deu uma esperança. Fórmulas, laser vaginal, suplementos, testosterona – e um alento brotou daquele rosto árido.
Ainda não seria o chip de estrogenio ou as pomadas milagrosas. Mas não teria chegado o momento de uma virada de vida? De novas tentativas de reagir e sentir mais a potência da vida? Não sei se foi o gesto de uma possível alegria no cotidiano rude da amiga débil, entregue aos efeitos nocivos da menopausa, mas a mulher já mudou.
Deu uma desabrochada, emagreceu uns gramas, intensificou a ginástica e olhou pro lado. Sobretudo por estar namorando um parceiro misógino que a leva para um combate diário. Descarta-lo ainda não conseguiu, mas já colocou a cabeça fora d’água. Está olhando até os novinhos.
E pensando sobre tudo o que lhe aconteceu naquela consulta médica, divaguei: por vezes, o que precisamos é a empatia de quem nem conhecemos. Primeira consulta, zero intimidade com a gineco e um imenso portal se abriu na frente da amiga. Torço para que seja duradoura essa mudança hormonal e que os frutos sejam colhidos logo.
Nada mais inspirador do que ver uma mulher madura sendo outra e, ainda assim, sendo ela mesma.