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Ana Claudia Paixão

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A jornalista Ana Claudia Paixão (@anaclaudia.paixao21) fala de filmes, séries e histórias de Hollywood
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A vitória de Lynn Goldsmith e o marco dos Direitos Autorais

Pioneira, criativa, simpática e consciente, artista americana venceu no Supremo Tribunal de Justiça pelo uso indevido de uma foto sua do cantor Prince

Por Ana Claudia Paixão
2 jun 2023, 11h56
lynn goldsmith
Lynn Goldsmith com a amiga Loree Rodkin, em exposição de Yayoi Kusama.  (Instagram @lynngoldsmith/Reprodução)
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“Eu detesto bullies”, Lynn Goldsmith explicou por zoom num sábado de manhã porque encarou, aos 75 anos e mais de cinco décadas de carreira, um processo judicial complexo e caro, que a expôs na mídia e seria determinante na discussão mundial dos Direitos Autorais.

Confesso que estava ansiosa e muito nervosa para conversar com ela, pois não apenas é uma lenda na fotografia, na TV, na música e na arte em geral. Ela é genial no mais correto uso do adjetivo. Atualmente, fotos suas estão em grande destaque na exposição Tina Turner: Uma Viagem para o Futuro, que está em cartaz no Museu da Imagem e do Som, em São Paulo. Capas de álbuns  e imagens icônicas de Carly SimonThe B-52’sRolling Stones, David Bowie, Bob Dylan, Bruce Springsteen, Kiss, Blondie, Sting, Madonna, Michael Jackson e Prince, na verdade, praticamente toda lenda do rock e da música pop dos últimos 30 anos, foram feitas por Lynn. Tenho certeza que quando fizer um Google vai ficar de boca aberta, caso ainda não conheça seu trabalho. Diretora de shows, documentários, curtas, música (nos anos 198s fez sucesso com o codinome de Will Powers, com material de vídeo e música falando de saúde mental), autora de livros, não há nada que Lynn não tenha feito e mais, tenha feito antes de todos.

Recentemente seu nome ficou em destaque por conta da longa batalha judicial que foi o ponta-pé do nosso papo e é uma luta que marca uma importante vitória no campo dos direitos autorais. Uma foto sua do elusivo Prince, feita no início dos anos 1980, quando ele ainda estava em ascensão, foi a base de um trabalho de Andy Warhol para uma revista, em 1984. O problema só surgiu quando a gravura de Warhol – a Orange Prince – foi usada indevidamente sem a autorização ou crédito de Lynn, em 2016, o que detonou um processo contra ela (pasmem!), a autora da foto original, movido pela Fundação Warhol, que não gostou quando ela os procurou perguntando sobre créditos e licenciamento.

Tina Turner fotografada por Lynn Goldsmith em 1981.
Tina Turner fotografada por Lynn Goldsmith em 1981. (Lynn Goldsmith/Corbis/VCG/Getty Images)

Quase sete anos depois, o Supremo Tribunal de Justiça nos Estados Unidos decidiu definitivamente a questão em favor de Lynn Goldsmith, determinando que não havia “uso justo” da imagem, como alegava a Fundação. A decisão, que não tem mais recurso, passa a ser um marco importante para proteção dos direitos autorais em várias indústrias criativas porque estabelece um marco jurídico para obras novas feitas com base em material existente, seja para uso comercial ou não.

Lynn, sempre ativa e criativa, foi rápida em aceitar o bate-papo exclusivo com CLAUDIA e conversamos sobre tudo: do pioneirismo profissional ao ter inventado o pau de selfie, sem esquecer, claro, da grande vitória com e por Prince.

CLAUDIA: Antes de mais nada, tenho que confessar que estou emocionada por estar falando com você. Tantas imagens que marcaram minha formação cultural foram feitas por você e é um privilégio ter esta oportunidade.

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LYNN: Estou muito grata de o que quer que eu tenha feito ou dito ter tido um efeito positivo sobre você. Não apenas um grande efeito, mas você sabe que todo o meu trabalho é sobre como todos nós temos talentos para acessar e é muito bom que você esteja usando o seu, escrevendo e entrevistando. Então, é um verdadeiro presente para mim ter tido algum tipo de influência.

CLAUDIA: Quando penso em Lynn Goldsmith a palavra pioneiro não poderia ter sido a melhor tradução, porque sua visão, seu trabalho e seu compromisso sempre estiveram à frente de todos. Em qualquer assunto!  

LYNN: Felizmente, um pouco longe demais. (risos). O exemplo mais claro disso foi por volta de 2004. Fiz um stick para fotos porque achei muito importante para, principalmente para as pessoas que viajam com as suas famílias ou o que quer que seja, poder tirar fotos de si mesmas com as suas famílias. E procurei empresas que patentearmos, fizemos amostras, fui a empresas por mais de 6 anos, que me recusaram até que finalmente disse ‘não quero que minha vida seja uma vara (stick)’. As pessoas tinham visto meu bastão, que ficou conhecido hoje como bastão de selfie e em 2014 foi eleito a invenção do ano, sabe. Mas naquela época eu já tinha vendido a patente para pagar minhas despesas. Então, embora eu tenha muito orgulho e alegria em querer fazer coisas que eu acho que são pioneiras, tudo que eu faço é pegar coisas que já existem e criar uma espécie de nova maneira de vê-las e usá-las. É assim que penso nisso e sendo pioneiro, muitas vezes, há aqueles que chegam cedo demais. Às vezes, foi, você sabe, meu destino.

David Lee Roth, do Van Halen, fotografado por lynn goldsmith
David Lee Roth, do Van Halen, em clique de Lynn em 1978. (Lynn Goldsmith/Corbis/VCG via/Getty Images)

CLAUDIA: Em quase tudo que olhamos em sua trajetória foi a primeira em tudo – a primeira mulher diretora, a mais jovem e também antecipando discussões como saúde mental uns 40 anos antes de virar pauta. E apenas para ter como um ponto de começo, quando a música e a fotografia entraram na sua vida?

LYNN: A fotografia veio porque meu pai era fotógrafo e cineasta amador. Ele era um inventor e engenheiro e para passar um tempo com meu pai, porque meus pais eram divorciados desde que eu tinha 4 anos, o acompanhava quando tirava fotos e depois íamos para o quarto escuro. Portanto, foi uma maneira de uma garotinha se relacionar com seu pai, mas também experimentar desde muito jovem como a arte pode ser como mágica, porque no escuro as fotos apareciam em diferentes bandejas e acho que associei tudo isso com amor. Já a música foi porque, na mesma época, nos anos 1950, fui enviada para um acampamento de verão e, quando chorava à noite, a conselheira me levava para um balanço e cantava para mim. Estávamos sempre no balanço e eu sentia amor novamente. Então os efeitos da arte, da fotografia e da música realmente me fizeram sentir conectada ao mundo, a mim mesma, sabe, não tão assustada, amedrontada. E não é apenas fotografia, é visual, é fazer imagens. Como minha irmã sabia desenhar desde cedo, mesmo sem nenhuma aula, não pintei até mais tarde na vida porque senti que era o domínio dela. Foi como escolher suas ferramentas. (risos).

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CLAUDIA: E assim nasceu seu desejo de trabalhar com arte?

LYNN: Bem, em primeiro lugar, nada na vida é como uma linha reta de A até B. É tortuoso, as coisas acontecem. Sempre tirei fotos e não começou com shows ou algo assim. Eu tirava fotos das minhas bonecas, mas nunca pensei que seria uma maneira de ganhar a vida. A câmera ou a música sempre foram ferramentas para expressar minhas ideias. A carreira de fotógrafa começou mesmo anos depois, quando estava dirigindo um programa de televisão e estava querendo fazer algo que fosse mais documental. A emissora estava fazendo um especial com a banda Grand Funk Railroad, e essa é uma história muito mais longa, mas eu os conheci e tive uma ideia. Na época estavam no topo das paradas das rádios FM, mas queriam estar em todas (Billboard, etc) e me ofereci para trabalhar de graça até que conseguissem o que queriam. O empresário deles pensou que isso nunca aconteceria e por isso me deixou fazer o que queria. Logo conseguiram um single número um em todas paradas. A fotografia começou porque uma das estratégias para colocar o Grand Funk nas revistas era colocá-los em revistas além das de música. Por exemplo, levei Mark Farner [vocalista da banda] para doar sangue e fiz as fotos que foram publicadas em uma revista nacional, não apenas uma especializada. Como eu era a diretora do especial da TV, fui aos shows e fiz as fotos para criar o storyboard e para estar pronta para o solo do guitarrista ou o que quer que fosse.  E assim começou, mas nunca fui apenas fotógrafa. Estou pronta e disposta a usar qualquer ferramenta para manifestar uma ideia.

Carie Fisher em 1981, pelas lentes de Lynn Goldsmith.
Carie Fisher em 1981, pelas lentes de Lynn Goldsmith. (Lynn Goldsmith/Corbis/VCG via/Getty Images)

 CLAUDIA: Sem mencionar o fato que não era comum que mulheres fizessem o que você fazia desde cedo…

LYNN: Acho que tudo é sobre como você pensa e nunca pensei que ser mulher me impediria de nada. Eu sabia que ser engraçada ajudava para que as pessoas me quisessem por perto, então eu trabalhei nisso. Mas também sabia que o olhar que as pessoas têm sobre você tem efeito: se é homem ou mulher, estilosa ou não, gorda ou magra. Mas são apenas fatos, e meio que me afasto disso quando digo pra mim mesma. “OK, eu tenho isso e isso e isso sobre mim que sei que afeta outras pessoas”, mas não posso mudar meu gênero. Tenho sorte porque tudo tem vantagens e desvantagens. Não me achava linda, mas sabia que era atraente. E quando você sabe que é atraente ou se sente atraente as pessoas são atraídas por você. Há muitas pessoas que não se sentem assim e que na verdade são atraentes.

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CLAUDIA: E o que mais de perguntam sobre a sua trajetória?

LYNN: Já tinha trabalhado na Electra Records em publicidade e marketing quando o Grand Funk entrou na minha vida, e dos vários livros que escrevi, os que focam no rock’n’roll são geralmente os de fotografia, em especial o “Rock’n’roll Stories” que tem as respostas para “como você conseguiu fotografar Bob Dylan?” “Como você caiu na estrada com os Rolling Stones?” [risos][OBS: Fica a dica: o livro tem tradução em português e foi lançado no Brasil.]

CLAUDIA: O que nos leva à foto do Prince e os retratos de estúdio que você fez. Mas antes de chegar ao assunto Jurídico: qual o segredo de um bom retrato?

LYNN: Quanto mais pesquisa você fizer sobre quem é a pessoa, de onde eles vêm, onde eles estavam, especialmente quando eram adolescentes, ajuda a criar um ambiente para a filmagem em que eles possam se sentir realmente confortáveis. Espera-se que qualquer fotógrafo de retratos realmente bom seja bom em se tornar o novo melhor amigo de alguém em cerca de 30 segundos. Mas isso vem da pesquisa e de se preparar com certas ideias em sua mente sobre o que você deseja manifestar para outras pessoas, mas estando aberto.

CLAUDIA: Com as câmeras digitais, todo mundo meio que sente capaz de se sentir um pouco artista, não? 

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LYNN: Vivemos em um mundo visual muito mais sofisticado hoje, bem diferente daquele em que cresci nos anos 1960. Quando você olha para a maneira como os programas de televisão em streaming são filmados agora, não parecia assim nos anos 1950 e 1960. Então temos um olhar muito mais educado, e porque o celular tornou a fotografia tão democrática. Uma forma de arte, à qual todos têm acesso o tempo todo. E o fato de que as câmeras podem fazer muitas coisas de ajuste automático que antes você tinha que saber em sua cabeça e fazer um certo tipo de matemática, permitiu que muitas pessoas pudessem fazer fotografias e algumas até tão boas quanto as das pessoas que passaram muitas décadas trabalhando naquele ofício em particular [fotografia] e estou feliz por isso. Quanto mais visuais no mundo realmente poderosos, com a maneira como as pessoas montam as coisas, sejam as cores, as formas, a emoção, melhor, porque mostra que estamos avançando.

CLAUDIA: Algo muito claro em toda sua trajetória foi sua consciência e luta pelos direitos autorais, outro campo no qual foi pioneira. No caso da Arte Fotográfica, então, acaba ainda hoje gerando dúvidas que já deveriam estar mais claras?

LYNN: A mudança começou quando com a Polaroid que realmente fez as pessoas pensarem, ‘oh, você apenas aperta um botão e bum, você tem uma foto!’. Eu senti que os direitos autorais eram tão importantes porque, em qualquer coisa que um artista faz, há custos envolvidos e você pode realmente lutar. Houve dias em que eu não comia a menos que alguém me levasse para jantar. Você realmente deve ser capaz de gerar receita para que possa financiar outras coisas que você faz. Por exemplo, eu nunca poderia ter feito a oferta ao Grand Funk para trabalhar gratuitamente, se já não tivesse um resguardo financeiro antes disso. Quando comecei a fazer retratos de celebridades foi um meio de gerar renda. Eu sabia onde queria chegarm porque quando comecei a fotografar, principalmente músicos, ninguém tinha orçamento -nem a gravadora ou as revistas. Cabelo, maquiagem, estilo, tudo isso custa dinheiro. Ter um estúdio custa dinheiro. O equipamento custa dinheiro. Ter um assistente custa dinheiro. Então, digamos que uma revista pagou a você $ 300,00. OK, isso não cobriu o custo. Você tinha que ser capaz de vender aquela foto para mais de uma publicação, a fim de pagar pelo dinheiro que colocou nela. Estava sempre investindo em mim mesma, porque acreditava que criaria um bom trabalho e acreditava que se pagaria por si mesmo e deveria me recompensar. Também fiz muitas fotos que guardei na gaveta e esperei até ficar pronto. Pintei quadros, desenhei, mas não quis mostrar. Não fazia sentido mostrar, porque as revistas não publicavam coisas assim na época.

CLAUDIA: Quando começou a mudar?

LYNN: A porta para a carreira de fotógrafos publicitários se abriu nos anos 1990, quando a publicidade passou a querer fotógrafos editoriais. Mesmo os fotógrafos de arte. Ninguém realmente pensou que Cindy Sherman iria fotografar para uma revista, ou Nan Goldin. Hoje em dia essas pessoas são contratadas por uma revista, mas naquela época [ainda nos anos 1980] fui pioneira por investir nos cabelos que compõem o styling. Agora nenhuma sessão de fotos com uma grande estrela é feita sem o maquiador com quem querem trabalhar, etc. E de fato, houve resistência também dos artistas, porque naquela época ainda poderia significar que você realmente não tinha integridade como músico se deixasse alguém te mudar, sabe? Tudo isso mudou hoje em dia.

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CLAUDIA: E nesse trabalho fica claro o direito autoral, não?

LYNN: O que sempre será verdade é que, por causa das leis de direitos autorais, as pessoas que se arriscam, como eu fiz, para fazer o trabalho, devem ser protegidas. Há muito trabalho em domínio público – seja porque tem mais de 75 anos ou porque a pessoa não o registrou – e são imagens são gratuitas para as pessoas usarem. Quando não for o caso, você pede permissão à pessoa que a criou. Porque a outra coisa é em relação à situação de [Andy] Warhol ou qualquer situação em que você seja um artista que queira usar minha imagem e seja de uma celebridade ou não. Posso não gostar do seu trabalho. Posso não querer que isso seja feito com a minha imagem. Eu deveria ter a opção disso! Ou, digamos, que seja um trabalho que planejei fazer em algum momento. Ou não quero competição pelo meu próprio trabalho que criei. E sabe de uma coisa? O que realmente me incomoda no caso Warhol é particularmente o juiz da Suprema Corte que disse que isso mataria a criatividade. Ao contrário! Não ter uma lei de direitos autorais é que mataria a criatividade.

Não sou contra a apropriação. Não sou contra os artistas se inspirarem na arte, mas sim em um direto uso de um traçado tão claro e evidente quanto na série Warhol Prince, mesmo que, se você olhar os documentos do tribunal, verá apenas desenhos em preto e branco que são colocados em papel vegetal sobre minha foto. Aí está. Então chamamos isso de trabalho derivado. Há artistas que eu amo, Rauschenberg começou com apropriação. Mas eu não. Eu acho que apropriação é diferente de pegar algo, fazer disso o corpo disso. Então a desculpa que eles usaram na Fundação Warhol é que ele [Andy Warhol], estava fazendo deles [celebridades] ícones. Ele estava fazendo essa homenagem à fama e que eu apenas fotografei as pessoas como elas são. É como se não tivesse o mesmo trabalho que Andy. Andy e eu tínhamos o mesmo trabalho. Nós dois trabalhamos para revistas, nós dois fizemos comissões privadas, nós dois estávamos em galerias. Sim, Andy se tornou, você sabe, um nome familiar no mundo da arte. Essa foi a jornada que ele fez, era assim que ele se autodenominava, mas isso não valida a fama dele, não valida que ele transformou a imagem. Se isso fosse verdade, então pegue o filme em preto e branco Casablanca e dê ao Andy para levar a um técnico de cores e lançar como ‘Casablanca de Andy Warhol’. Ele teria os direitos autorais e receberia todo o dinheiro? Jamais aconteceria! A indústria cinematográfica ficaria louca. Bem, é muito parecido. Ele também tinha desenhos em preto e branco e os reivindicou como seus. [a foto original do cantor Prince, feita em 1981 por Lynn, era em preto e branco, um dos argumentos usados pela Fundação Warhol para ressaltar as diferenças das obras].

CLAUDIA: Você e Andy Warhol se conheciam. Se ele ainda estivesse vivo, acredita que todo esse desgaste e discussão teria sido evitado? 

LYNN: Se Andy estivesse vivo, eu realmente acho teria sido diferente, porque ele resolveu mais de 14 ações judiciais antes de morrer com artistas que vieram até ele e disseram ‘você pegou meu trabalho’.  Foi por isso que Gerard Malanga deu a Andy uma câmera, porque ele disse ‘Você está sendo processado o tempo todo. Tire suas próprias fotos’. Foi assim que Andy explodiu, ele tinha sua Polaroid e começou a fazer fotos.

Página do processo que mostra as artes de Andy Warhol feitas com base na fotografia de Lynn Goldsmith
Página do processo que mostra as artes de Andy Warhol feitas com base na fotografia de Lynn Goldsmith. (Cortesia de documentos judiciais/Reprodução)

CLAUDIA: Não posso deixar de pensar como foi simbólico que a decisão judicial de proteger seus direitos autorais tenha sido justamente com uma imagem do Prince, que brigou até sua morte contra a pirataria de sua arte, impedindo o uso em redes sociais ou qualquer plataforma que não o pagasse pelo uso…

LYNN: Você foi a única pessoa que apontou isso e eu sinto o mesmo. É inacreditável que mais pessoas não tenham feito a associação, porque sua luta foi tão pública.  As pessoas não abordam, assim como não abordam que o próprio Prince se sentia assim em relação aos direitos autorais. E estou tão feliz que finalmente alguém disse isso. Não fui eu! [risos]

CLAUDIA: Foi o que te levou a encarar o longo e árduo processo judicial?

LYNN: Quando trabalhamos nesse gênero de retratos, você geralmente tem acordos, sejam eles acordos de boa fé ou acordos por escrito que você não fará uma série de coisas e você sabe que terá que pedir permissão deles se for fazer isso ou aquilo, então sua carreira nesse campo é baseada na confiança. Os artistas têm que ser capazes de confiar em você. Então, se é Andy ou Joe Blow, quando o fotografado vê algo diferente com sua imagem pode pensar que o fotógrafo deu os direitos para fazer isso e eles não vão mais trabalhar com você. Você pode destruir a carreira de alguém. Mas aqui foi pior, foi um ato de bullying e se não enfrentarmos o bullying, assim como se não defendermos nossos direitos, ele se espalha como uma doença.

CLAUDIA: Como tudo começou?

LYNN: A Fundação Warhol me processou primeiro com a chamada ação preventiva. Primeiro divulgaram informações de que eu tentei extorqui-los, mas tudo que fiz foi ligar e enviar a fatura da Vanity Fair de 1984, que licenciou a foto para uso único em uma publicação impressa com meu crédito. Na época, em 1984, a foto licenciada foi para um ilustrador – que eu não sabia quem seria – e como foi publicada quando eu estava na Europa promovendo e atuando como Will Powers, nunca prestei atenção até Prince morrer. Em 2016, vi a capa de uma edição comemorativa da Vanity Fair, e pensei, ‘parece a minha foto’. Fiz a pesquisa e vi que ela foi usada antes em um artigo de 1984 da revista, que mostrava meu crédito. Então fui aos meus arquivos, encontrei minha fatura, que guardo porque são licenças de direitos. Peguei meus arquivos em preto e branco, encontrei a foto, a digitalizei e a enviei com a fatura para Mike Herman, da Fundação Warhol. E eu disse, ‘Mike, essa é minha imagem de Prince e foi licenciada para isso. Eu gostaria de falar com vocês sobre como podemos resolver isso. Então, você pode, por favor, mostrar isso para as pessoas lá [da Vanity Fair]’. E o que ele faz? Ele volta para mim e diz, ‘o que você quer?’ E eu disse, bem, não poderia dizer o que quero. Não sei quantas licenças você deu. Você poderia fazer uma lista e depois podemos conversar sobre isso. Eu posso te dizer que eu gostaria de lhe dar uma licença retroativa. Na segunda-feira, o telefone tocou e eram repórteres do New York Post querendo que eu comentasse sobre o processo que havia sido aberto contra mim no tribunal federal, que tinha uma imagem colorida diferente e dizendo que tentei extorqui-los. Eu nunca pedi um centavo. Eu pedi uma lista.

CLAUDIA: E como foi a sua reação?

LYNN: Quando você é processado, você contrata um advogado para enfrentar na mesma qualidade do advogado da Fundação Warhol, você precisa de um bom advogado, o que é muito caro. E eles então ofereceram $15.000 para que eu desistisse do processo [iniciado por eles], mas teria que ceder meus direitos autorais para não lidar com os custos de continuar lutando na Justiça. Avisaram: ‘porque vamos continuar apelando, seja qual for a decisão, até a Suprema Corte’. Eu tinha ouvido falar de outras grandes empresas assustando vários fotógrafos. Não é apenas o custo legal, mas também o esgotamento emocional de passar por todo o sistema judicial. A maioria dos artistas não quer lidar com isso. Mas eu licencio meu trabalho. Eu vendo em galerias. Talvez um dia eu queira pintar aquela imagem do Prince. Eles alegaram que, embora tivessem visto a licença da Vanity Fair, que era uma foto publicitária de domínio público. Em primeiro lugar, não era. Mas se eu licenciar para publicidade, as licenças sempre dizem que é para uso por um ano apenas. Por exemplo, se o artista que fotografei está lançando um novo álbum e precisa de fotos publicitárias, dentro dessa licença, entendo a conexão, mas ainda assim tem que colocar meu nome na publicidade.

CLAUDIA: Agora a decisão do Supremo não tem mais recurso. Como fica?

LYNN: Minha iniciativa nunca foi a de tirar [as obras de Andy Warhol com a sua foto do Prince] de museus, tá? Não pretendo desfazer o trabalho de Andy de forma alguma. Eu amava Andy. Há muito em seu trabalho que realmente mudou o mundo da Arte. Mas uma coisa são fãs postando no Instagram, eu quero me marquem, que creditem e enviem de volta para mim, com minha tag de Lynn Goldsmith. Não estão atrás de ganho financeiro, é um festival de amor. O que não é aceitável é quando você coloca a imagem em produtos para vender.

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