Dois jovens promissores dividem um ateliê na Vila Madalena, em SP
O casal de artistas Sandra Cinto e Albano Afonso criaram o ateliê Fidalga para desenvolver seus projetos e ter um breve momento de reflexão e paz.
Respirar em meio ao caos. Parece que esse espírito emana da vida da artista plástica Sandra Cinto. E não é para menos. Seu tempo é dividido entre projetos internacionais, exposições e grupos de estudos semanais. Nesses grupos, ela orienta 60 jovens artistas atuantes, com os quais também troca ideias. Só um espaço muito agradável para dar conta de um turbilhão de atividades. Foi com esse intuito que Sandra pensou em cada detalhe do Ateliê Fidalga. Todos os ambientes dos 250 m² foram projetados para se conectarem e darem uma sensação de lar. “Passo o dia inteiro aqui, preciso me sentir em casa”, conta a artista, que, em períodos de criação, só sai dali de madrugada. O cuidado com o espaço é consequência de uma personalidade atenciosa em todos os sentidos, seja com quem trabalha, seja com suas obras. É só reparar nas curvas meticulosamente traçadas em seus grandes painéis de tema marítimo ou nos desenhos a caneta em instrumentos na instalação Pausa, obra que voltará a ser exposta, agora na Espanha. Nela, uma imensa pauta sem notas musicais serve de pano de fundo para a composição de violinos, contrabaixo, violoncelos – todos sem as cordas – e flautas. Um convite ao silêncio e à reflexão, valores nitidamente caros à artista. Não é sozinha que Sandra Cinto realiza todas as suas atividades. Com ela está o também artista Albano Afonso, que divide o trabalho nos grupos de estudos, o próprio Ateliê Fidalga, as ideias e a vida de companheirismo, desde 1992, quando se conheceram. De lá para cá, o casal cresceu, cada um com sua arte, mas com a mesma ideologia de viver em um sistema colaborativo. Foi o marido de uma de suas funcionárias, por exemplo, que caprichosamente colou vidrinho por vidrinho na obra Natureza Morta, de Albano, que em marçocompõe uma individual no Museu de Arte de Ribeirão Preto, no interior paulista. Como os dois artistas vivem e trabalham juntos, o espaço foi dividido igualmente, para que ambos tenham ali seu local de inspiração. Ele preferiu ateliê embaixo e escritório em cima. Ela, o inverso. “A parte superior é o meu canto preferido, junto de meus livros e meu computador”, conta Albano, que, ao ritualístico som de música clássica, está desenvolvendo um imenso mural de uma floresta geometrizada para uma exposição em comemoração aos 25 anos da Casa Triângulo. Entre uma breve prosa e suas criações, Albano Afonso ainda cuida de inúmeras plantas – que reforçama imagem de o Ateliê Fidalga ser um oásis de sossego e cor em meio à inquietude e ao cinza urbanos. Assim que chegou esbaforida em seu ateliê, a artista plástica Sandra Cinto foi logo se desculpando: “Estamos arrumando tudo na outra casa, no Projeto Fidalga, para receber cinco artistas japoneses. Fui até o bairro da Liberdade comprar uma panela para arroz”, disse a anfitriã com a mesma delicadeza com que trata todos ao seu redor. O local a que se refere é o antigo espaço de criação dela e do marido, onde ficaram por 18 anos. Após comprarem o próprio imóvel, na mesma rua, transformaram a casa alugada em cinco ateliês. Cada um é destinado a um jovem artista promissor. “Ter um ateliê faz com que o trabalho se desenvolva. No momento em que o artista vai a ele para executar suas ideias, parece que assume uma questão profissional”, afirma Sandra. O Projeto Fidalga – ou, carinhosamente, Vila Fidalga – possui também um espaço para exposição de obras dos grupos de estudos. E, em se tratando de Sandra e Albano, a tudo se dá um jeitinho. Os dois, com a ajuda dos fiéis funcionários, transformaram duas salas em dormitórios, com direitoa futon, para que os intercambistas se sentissem em casa mesmo estando do outro lado do mundo. Até legenda em japonês tem na cozinha. Com tanta atenção, é bem capaz de, em breve, o Ateliê Fidalga ter de aumentar ainda mais seu espaço para dar conta dos muitos pupilos.