Arte do resgate: conheça o ateliê da artista plástica Marina Saleme
E é neste ateliê situado numa rua tranquila de São Paulo que artista plástica Marina Saleme exercita seu poder de mudar o destino de quem conviverá com seu trabalho.
Mal havia se alfabetizado e Marina Saleme já denunciava a profissão que seguiria. “Passava horas desenhando as letras nos meus cadernos de caligrafia, fascinada com cada curva”, lembra ela, que chegou a estudar publicidade antes de ingressar na Faculdade de Artes Plásticas da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP). “Percebi que seria inevitável a troca do curso quando me corroía de inveja dos alunos que passavam pelo campus sujos de tinta”, diz, aos risos. Realizada com a mudança para o hábitat que lhe soava natural, descobriu ainda mais uma propensão: no universo das artes, era a pintura a vertente que de fato a satisfazia. A opção pelas telas, conta Marina, não deriva da estética, mas da linguagem. “Meu pensamento é bidimensional”, garante, enquanto aponta outro atrativo oferecido pelo manejo com os pincéis: a possibilidade de mudar de ideia com o trabalho em andamento. “Gosto de apagar alguém já desenhado, de trazer outro personagem de volta, de resgatar ou eliminar detalhes, sem ocultar as cicatrizes dessas alterações. Essa liberdade não existe em técnicas como a escultura”, afirma.
Conheça a história do ateliê de Marina Saleme
O vaivém de elementos, traço que permeia sua obra, ditou ainda o melhor material de trabalho. “A tinta a óleo me permite escavar sobre uma superfície pronta ou tirar uma figura de cena com um pano embebido em terebintina. Se usasse acrílica, só me restaria pintar por cima”, explica. Mas se por um lado garante o resultado esperado, por outro a tinta a óleo tem um forte odor, que exige dos ambientes boa ventilação. Daí o pedido feito ao arquiteto João Paulo Meirelles. “Ela encomendou um ateliê com muitas aberturas”, aponta ele, autor do projeto que ocupa o local de uma antiga casinha de vila na região dos Jardins, em São Paulo. Inaugurado há menos de um ano, o espaço foi erguido do zero para atender às necessidades da cliente – a moradia existente, desfigurada por sucessivas reformas, não comportaria o pé-direito de 6,50 m de altura que possibilitou criar um mezanino nem ofereceria as imensas paredes brancas das quais a artista precisa para dispor as peças ainda em produção. “O distanciamento é importante, por isso o mezanino. Daqui consigo visualizar os trabalhos e avaliar se estão no caminho que mais me agrada”, revela a autora.
Esse caminho, conta Marina, nasce antes mesmo do primeiro toque do pincel. “O ato de cortar a lona já me diz algo sobre o futuro daquela superfície”, diz ela, que começa a pintar com as telas ainda livres do chassi que lhes confere o formato final. “Tenho pinceladas muito vigorosas. A superfície das obras ficaria marcada por causa do suporte de madeira”, avisa. Os fãs certamente não se incomodariam – seriam apenas mais cicatrizes para admirar.