Vamos parar de falar “mas você está ótima pra sua idade”?
Conhecer mulheres que envelhecem sem fazer disso um fardo é um grande aprendizado

A primeira vez que eu levei um belíssimo fora relacionado à idade alheia aconteceu quando conheci em um jantar uma amiga do Instagram. Tínhamos trocado mensagens durante uma viagem que eu fazia por Berlim. Ela, sem dúvida uma das pessoas mais inteligentes que eu conheço, me deu dicas dos programas imperdíveis na cidade. Já em São Paulo, depois de algumas amenidades, perguntei quantos anos ela tinha. Quando ela me respondeu 39, falei empolgada: “Nossa, mas não parece, você está ótima!”. Ela retrucou: “Era pra eu estar acabada?”. Quis que um buraco se abrisse no chão e eu desaparecesse, voltando à cena apenas se fosse possível reencená-la.
Na mesma Berlim que foi motivo de nossa aproximação, encontrei recentemente uma amiga que eu não via há 10, 12 anos. Ela mudou pra cidade há 8, fala alemão com destreza e velocidade (que língua linda!), trabalha com vídeo e também com refugiadas, principalmente da África. Imaginem que um papo que eu achei que duraria umas duas horas se estendeu pela madrugada.

Entre as várias coisas que ouvi e aprendi, a pauta do envelhecimento feminino me chamou a atenção. Ela contou que antes de se mudar pra cidade alemã, tinha acabado um relacionamento longo. O cara logo depois começou a namorar uma menina na casa dos 20, isso quando ela tinha 35. A “troca” pesou e foi inevitável pensar na relação com a idade mais fértil da mulher, que naquela altura já começava a fazer uma curva descendente.
A mudança para Berlim, além de ter trazido novos direcionamentos para sua carreira, a fez ressignificar o passar do tempo. Para falar de uma forma bem simples, lá pessoas de 40, 50, 60 anos frequentam festas – e olha que elas podem durar 3 dias. Ter cabelos brancos é normal, ninguém precisa ficar refém das tinturas. Se quiser ter cabelo azul, verde, rosa, ótimo! Ninguém vai te olhar e dizer “aff, ela não tem mais idade pra isso”. Usar qualquer tipo de roupa, também. A vida útil das pessoas parece ganhar vários anos. Isso pra ficar só na aparência.
Por aqui, imagina alguém de 50 anos, com cabelo colorido e indo pra balada? Facilmente ganharia olhares atravessados e ouviria coisas como “essa daí não soube envelhecer, acha que vai ter 20, 30 anos eternamente”. Espera-se que com o passar dos anos uma caretice tome conta da vida. É preciso assentar, ter uma casa, uma família, fazer uma viagem por ano.
Tem horas que eu penso que a gente vive para ter vidas iguais, sem nem perceber. O padrão se impõe e quem sai dele é alternativo, louco, “tão diferente, né?”. Para as mulheres a coisa se complica ainda mais. Existe uma corrida maluca para que aquela ruga seja eliminada aos seus primeiros sinais. Existem indústrias, de moda, estética, mídia, que corroboram para essa vontade de ser forever young. Envelhecer é chegar ao fim, é perder espaço, é ser menos mulher. Que loucura! E desse estágio para a velhice propriamente dita, sempre penso: quando é que uma mulher deixou de ser uma mulher para se tornar apenas aquela velhinha fofa para quem a gente dispara “nhoin, que bonitinha, tão lindo esse cabelo meio arroxeado, queria que fosse minha avó”?
Conhecer mulheres que envelhecem sem fazer disso um fardo, respeitando suas histórias e os sinais do tempo no seu corpo, é um grande aprendizado. Vamos olhar mais de dentro pra fora. O brilho no rosto vai se mostrar inevitável, tenho essa impressão. E vamos parar de dizer “não parece, você está ótima!”. O que será que vamos querer ouvir quando disserem isso pra gente? Algo como “você é linda, do jeito que é, com a idade que tem” me parece bem mais legal.