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Fome oculta: quando a criança sofre de carência de nutrientes

A fome oculta vem de mansinho, sem sintomas, mas pode comprometer o crescimento e o desenvolvimento cognitivo e até tornar o corpo mais vulnerável a doenças

Por Paula Montefusco (colaboradora)
Atualizado em 22 out 2016, 23h47 - Publicado em 18 mar 2015, 07h36

A fome oculta, fome silenciosa ou deficiência marginal é uma deficiência crônica de micronutrientes (vitaminas ou minerais) e é definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a necessidade não explícita deum ou mais dos 26 micronutrientes essenciais para o bom funcionamento do organismo. “Apesar de desenvolver alterações silenciosas, a fomeoculta pode deixar sequelas”, afirma Márcia de Almeida, pediatra do Hospital Santa Catarina, de São Paulo. De acordo com Cristiane Kochi, médica assistente da Unidade de Endocrinopediatria do Departamento dePediatria da Santa Casa de São Paulo, se a deficiência de micronutrientes for prolongada, a doença pode se tornar sintomática.

A principal causa da fome oculta é uma alimentação deficiente, sem todos os nutrientes essenciais para o bom funcionamento do organismo – o que não quer dizer, necessariamente, que essa pessoa come pouco, mas sim que ela não come com qualidade. “Todo e qualquer distúrbio de  alimentação da criança que não come e da criança que come demais, masde forma equivocada, pode ser um importante fator de risco”, esclarece Mauro Fisberg, nutrólogo, pediatra e coordenador do Centro deDificuldades Alimentares do Instituto PENSI – Fundação José Luiz Setúbal – Hospital Infantil Sabará, de São Paulo.

No Brasil, o problema atinge os mais pobres, que não conseguem ter uma alimentação completa, e os mais ricos, que muitas vezes deixam decomer corretamente e buscam alimentos com calorias vazias, com poucos ou nenhum nutriente, como industrializados e frituras.

Segundo Durval Ribas Filho, médico nutrólogo e presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), estudos como a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, revelam que a fome oculta no Brasil é muito mais comum do que efetivamente se pensava. “Em algumas regiões e em alguns grupos, chegaa atingir 70% da população.”

De acordo com Jairo Len, pediatra do Departamento Materno-Infantil do Hospital Israelita Albert Einstein e da Clínica Len de Pediatria, de São Paulo, no mundo, a proporção é um pouco menor e se concentra em países mais subdesenvolvidos. “Estimativas mundiais calculam que entre 1/4 e 1/3 da população mundial sofra de fome oculta. Claramente é mais grave em áreas onde a fome não é tão ‘oculta’, como na África.”

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Essa é uma doença democrática: além de atingir todas as classes sociais, está presente em todas as faixas etárias. Pode ser mais grave nas crianças, por afetar o crescimento e o desenvolvimento físico e mental. “A fome oculta é uma condição que atinge mais crianças, por causa dehábitos alimentares pouco variados, com seletividade alimentar e neofobia (recusa a experimentar novos alimentos). Além disso, as crianças têm necessidades maiores de micronutrientes, devido ao rápido crescimento eà formação de órgãos vitais”, explica Len.

As consequências da fome oculta incluem alterações do crescimento e desenvolvimento (baixa estatura e baixo peso) e alterações cognitivas (aprendizado, inteligência, capacidade de resolver problemas e memória), especialmente quando surge pela falta de ferro, cálcio e vitaminas, que podem causar ainda osteopenia (perda de massa óssea). Além disso, adeficiência de micronutrientes deixa o corpo mais vulnerável. “A longo prazo, pode levar a alterações do sistema imunológico, aumentando, portanto, o risco para doenças infecciosas”, destaca Cristiane Kochi.

Como pode envolver um ou mais micronutrientes, o diagnóstico da doença é mais complicado do que parece e envolve um olho treinado. “Existem algumas carências de vitaminas e minerais que são detectadas clinicamente. No exame físico, é possível notar alterações de cabelo, língua, pele, unhas, tecido subcutâneo, marcas corporais, palidez e outros sinais”, explica Fisberg. E completa: “Em alguns casos, somente exames que não são de rotina ou de prática comum podem determinar a carência da vitamina ou do mineral”.

Para determinar quais são os micronutrientes que mais faltam nas mesas, é preciso avaliar a faixa etária. “Nos três primeiros anos de vida, aanemia por deficiência de ferro é a mais comum das carências nutricionais em todo o mundo, chegando a afetar aproximadamente de 40 a 50% das crianças, especialmente nos países menos desenvolvidos”, revela Fisberg.A OMS chama a atenção para a deficiência de ferro, vitamina A e iodo.

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Já no Brasil, estima-se que a deficiência de ferro atinja entre 30 e 50% das crianças menores de 3 anos. “Em um estudo que fizemos com aanálise da ingestão de alimentos em crianças pré-escolares de todo o Brasil, o Nutri Brasil Infância, verificamos que a carência de vitaminas A, E, C e D é bastante frequente em crianças de todos os níveis econômicos, devido à menor ingestão de frutas, verduras e legumes. Além disso, coma diminuição do consumo de lácteos, a deficiência de cálcio vai se agravando, de forma que praticamente 100% dos adolescentes e adultos brasileiros não conseguem ingerir a quantidade adequada desse mineral: três porções de alimentos lácteos, como iogurtes, leites e queijos”, pontua Fisberg.

Tratamento

Assim que o diagnóstico de ausência de determinado micronutriente é feito, o médico, muitas vezes em parceria com um nutricionista, orienta o paciente a fazer uma reeducação alimentar. A partir do momento em quea pessoa passa a ter uma dieta balanceada, ela começa a absorver os micronutrientes que faltavam. “Tem que comer ovo, carne, peixe, legumes e verduras, arroz e feijão. Se todo brasileiro tivesse um prato dearroz e feijão por dia, não teríamos desnutrição. A ingestão depolivitamínicos não é o mais recomendável, pois eles repõem o patamar mínimo para o organismo funcionar, sem haver uma reposição profunda”, diz Ary Lopes Cardoso, chefe da Unidade de Nutrologia do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas (FMUSP).

O melhor remédio ainda é a prevenção. Seguindo orientações gerais deconsumo saudável de alimentos variados, é possível evitar com êxito não somente a fome oculta, mas outras doenças de cunho alimentar, como obesidade, diabetes, hipertensão e doenças cardiovasculares.

Receita de sucesso

Márcia de Almeida, pediatra do Hospital Santa Catarina, dá algumas dicas que podem ajudar os pais:

  1. Consumir alimentos saudáveis em casa e na escola.
  2. Fazer educação ou reeducação alimentar: treinar o paladar com aintrodução dos diferentes alimentos.
  3. Oferecer frutas, legumes e verduras em pedaços para serem degustados, e não misturados ou escondidos, para evitar o desenvolvimento de comedores seletivos (picky eaters).
  4. Ensinar às crianças hábitos alimentares saudáveis. Os adultos devem ser bons exemplos para elas.
  5. Inserir alimentos diferentes rotineiramente e oferecer diversas vezes, até que se torne um hábito.
  6. Evitar o excesso de consumo de alimentos industrializados, ultraprocessados, com alto teor de sal, carboidrato e gordura. Dar preferência à alimentação natural saudável.
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