Crianças autistas: como entrar no mundo delas?
O autista apresenta deficiência em três áreas nobres do desenvolvimento: a comunicação, a interação social e a imaginação. Hoje se sabe que, quanto mais cedo essa barreira é quebrada, maiores são as chances de recuperação.
Desde 1943, quando foi descrito pela primeira vez pelo psiquiatra austríaco Leo Kanner, o autismo é um mistério para a ciência.
Foto: Getty Images
É comum que o comportamento da criança autista confunda a família num primeiro momento. Diferentemente dos portadores de outros problemas mentais, ela não apresenta nenhum sinal físico. A característica mais forte da síndrome é a tendência ao isolamento e a ausência de comunicação a criança olha de forma dispersa, não responde quando chamada nem demonstra interesse por outras pessoas. Ela pode reagir de forma exagerada a alguns estímulos, como ao barulho de uma porta batendo, e ignorar completamente outros, como o som de uma televisão no último volume.
Desde 1943, quando foi descrito pela primeira vez pelo psiquiatra austríaco Leo Kanner, o autismo é um mistério para a ciência. Pouco se sabe sobre as causas e menos ainda sobre a possível cura. Encarado como um distúrbio raro, nunca recebeu a atenção (nem verbas para pesquisas) necessária para o seu esclarecimento. Nos últimos anos, porém, descobriu-se que a incidência é bem maior: em cada 1 000 crianças que nascem em todo o mundo, uma é autista. Em alguns países, como os Estados Unidos, os registros apontam para o dobro desse número: um caso para cada 500 crianças estimativa que surpreendentemente ultrapassa os índices de síndrome de Down e de câncer infantil. A descoberta colocou o autismo na pauta dos programas de saúde pública de muitos países, inclusive do Brasil. Os frutos desse interesse começam a aparecer.
A novidade que mais tem empolgado os pesquisadores são os bons resultados obtidos com o diagnóstico e o tratamento precoces. Quanto mais cedo se detecta a síndrome, maiores são as chances de quebrar a barreira de isolamento da criança e de interferir em seu desenvolvimento, afirma o psiquiatra Raymond Rosemberg, de São Paulo. O principal obstáculo é que, geralmente, ela só inicia o tratamento muitos anos após surgir os primeiros indícios, quando o cérebro já está formado e certos comportamentos cristalizados. Depois de avaliar o resultado de vários estudos, a Academia Americana de Neurologia divulgou recentemente um documento alertando pais e pediatras e mostrando como identificar os sintomas a partir do primeiro ano. No Brasil, a Associação de Amigos do Autista (AMA) publicou uma cartilha com informações e questionários que serve de roteiro para detectar o problema.
Que planeta é esse?
O autista apresenta deficiência em três áreas nobres do desenvolvimento: a comunicação, a interação social e a imaginação. Juntos, esses três desvios conseguem produzir efeito semelhante à sensação de alguém que, de repente, se vê em um país de cultura e língua desconhecidas com as mãos imobilizadas, sem a mínima condição de compreender os outros ou de se expressar por palavras ou gestos. Não é à toa que o problema passou a ser conhecido como Oops! Wrong Planet Syndrome (Síndrome de Ops! Planeta Errado!), apelido dado pelos primeiros grupos de apoio às famílias dos portadores do distúrbio. Além disso, para o autista, não há diferenciação entre o eu e o mundo. Ele não tem a capacidade de interpretar o estado emocional e as expressões faciais das pessoas nem de fantasiar situações, como fingir que uma vassoura é um cavalo-de-pau.
Os primeiros sinais
Alguns sintomas que podem revelar a presença da síndrome
Até o primeiro ano
· Não olha para o rosto da mãe nem expressa qualquer emoção na presença das pessoas.
· Tem aversão ao toque, não fica no colo.
· Não estabelece comunicação com quem toma conta dele.
· Não dorme, dorme demais ou não acorda quando está com fome.
· Não atende quando chamado.
A partir do segundo ano
· Interessa-se mais por objetos do que por pessoas.
· Não partilha a atenção e não demonstra reação quando quem está cuidando dele faz algum gesto ou barulho.
· Tem dificuldade para fixar o olhar.
· Não aponta para mostrar interesse.
· Repete por horas brincadeiras e gestos, como balançar as mãos.