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Como conversar com seus filhos sobre sexo?

Conversar sobre o assunto desde a primeira infância é uma das medidas mais eficazes no caso de situações de risco e como medida protetiva para abuso sexual

Por Débora Stevaux Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
11 jun 2018, 15h22

Como conversar sobre sexo com os filhos? Essa dúvida já deve ter aparecido na cabeça das mães e dos pais – sejam eles ou não de primeira viagem. E o assunto é sério: os adolescentes estão iniciando cada vez mais cedo suas vidas sexuais, muitas vezes sem o cuidado necessário com o próprio corpo.

Para além das normas estabelecidas por uma sociedade que ainda trata o sexo como um tabu, o assunto é inevitável e recorrente na rodinha de amigos da escola, nas redes sociais e se faz presente em situações de risco quando os jovens não são orientados com a sinceridade e a normalidade com que deveriam. Não à toa, o Brasil vive hoje uma epidemia de sífilis.

Prova disso foram os dados assustadores apresentados pela pesquisa Mosaico 2.0, realizada pela Dra. Carmita Abdo, psiquiatra e professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e divulgada em 2017 pelo jornal da mesma instituição, a primeira relação sexual dos brasileiros acontece na faixa etária dos 13 aos 17 anos.

Outro dado preocupante apresentado pelo estudo, que consultou cerca de 3 mil internautas com idades entre 18 a 80 anos com o objetivo de analisar o comportamento sexual dos brasileiros, diz respeito ao fato de que somente um terço da população disse fazer uso de preservativo durante o sexo.

Por que a idade ideal para começar a falar sobre sexo é desde sempre?

Para a Dra. Renata de Camargo Menezes, médica ginecologista pela Sociedade Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, tratar a educação sexual com tamanha naturalidade para que ela seja algo que começa sem a gente nem perceber é uma das formas mais preventivas para evitar situações de risco a longo prazo. “As primeiras experiências de prazer acontecem logo na primeira infância, através do que a criança vivencia no toque do próprio corpo, das genitais, das sensações que são estimuladas por uma série de fatores”, explica.

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A psicóloga e psicanalista especializada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Raquel Jandozza, também concorda que o sexo não deve ser tratado como um fantasma atrás da porta do quarto dos pais, mas que para cada faixa etária é necessária uma abordagem e linguagem adequadas. “Se você for conversar sobre isso com uma criança de 4 anos, por exemplo, esse diálogo vai precisar ser norteado por noções do próprio corpo e dos órgãos genitais. Porque é natural que elas tenham essa curiosidade”, analisa.

Raquel também alerta que simplesmente não falar é abrir precedentes para que a sexualidade seja descoberta de outras formas: “Às vezes ela pode falar com outros coleguinhas, querer fazer brincadeiras sexuais, enfim. E isso pode deixar os pais estarrecidos. Por isso a gente aconselha os pais a já falarem desde cedo  para os filhos que as genitais fazem parte da sua intimidade e não podem ser tocadas por ninguém. Isso, inclusive, é preventivo para a questão de abusos”, completa.

Tratar a sexualidade como algo natural está em consonância com os processos fisiológicos do corpo, esclarece a médica. “Quando a criança nasce, ela se vê como uma extensão da mãe e aos poucos vai tomando consciência de si como indivíduo. A criança percebe, ainda dentro da barriga da mãe, que a boca e o movimento de sucção são ações prazerosas porque estão intimamente relacionados à nutrição. Até que, durante os primeiros anos de vida, durante o processo de desfralde, ela se empodera pelo controle dos esfíncteres e começa, então, a perceber o próprio corpo e as regiões de prazer que eles podem proporcionar”, pontua.

Renata ainda ressalta que a exploração do próprio corpo, desde que não seja de forma erotizada é positiva. “Não repreenda, portanto, se a criança está tocando a genitália. Explique que não é legal que ela faça isso num lugar público, que ela precisa lavar a mãozinha antes e depois, enfim. Explique que a menina tem vagina e os meninos tem pênis, num primeiro momento. As dúvidas vão surgindo e ficando cada vez mais complexas. E quanto mais os pais respondem às perguntas, mais aberta a criança vai se sentir para falar sobre sexualidade”, conta.

O toque do bem e o toque do mal

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A ginecologista explica que, a princípio, durante os primeiros anos de vida, os pais devem ir respondendo dúvidas pontuais das crianças, isso porque elas vão construindo uma linearidade e perguntando o que acham que precisam saber. O que não significa que as orientações devam ser deixadas de lado. Outro aspecto ressaltado pela médica é a necessidade dos pais conhecerem a anatomia do corpo feminino e masculino para conseguirem explicar com propriedade e clareza aos filhos as funções do seu corpo. “Existem livrinhos infantis que podem ajudar os pais e as crianças a abordarem esses assuntos quando surgirem. O diálogo sobre sexualidade com os pais protegem os filhos”, diz.

Uma das estratégias mais efetivas contra abuso, neste caso, é ensinar ao seu filho sobre o toque do bem e do mal. “O toque do bem é aquele beijinho que a mãe dá e que o filho não se sente constrangido em receber. E o toque do mal é tudo aquilo que ele se sente constrangido e é feito por pessoas que pedem para não fazê-lo na frente de ninguém. Essa é uma forma de fortalecer a confiança entre você e seu filho, porque certamente você dirá que ele poderá contar se ele se sentiu invadido em algum momento. Fale coisas como: ‘Se isso acontecer, você poderá contar para mim ou para outras pessoas que você confia para te ajudar nessa situação.’ Isso protege muito a criança na primeira infância, porque desde cedo ela vai aprender que o corpo é sua propriedade”, esclarece.

Para começar: pensar como você gostaria de que tivesse sido com você

Nem todas as mães e pais tiveram a oportunidade de terem um diálogo aberto e claro com os pais sobre educação sexual, não à toa toda a preocupação e o medo que envolve o tema. No entanto, isso não significa que os pais tenham o aval ou a justificativa para agir exatamente como seus pais em situações como esta. Um exercício, portanto, proposto pela psicóloga Raquel é pensar em como os pais gostariam que o assunto deveria ter sido abordado com eles.

“É uma das formas mais efetivas para quebrar esse ciclo de silêncio e silenciamento sobre o próprio corpo. Pense nas falhas, na sinceridade que você gostaria de que tivessem tido com você. Essa também é uma excelente hora para que os pais identifiquem as lacunas sobre a própria sexualidade e lidem com isso de forma positiva”, esclarece.

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Outro ponto levantado pela profissional diz respeito à presença do pai nessas discussões, que vai depender exclusivamente da dinâmica do casal. “É importante que os dois estejam presentes, mas isso não é regra. O primeiro viés deve ser sempre o biológico. Os pais, portanto, precisam estar à vontade com a própria sexualidade, olhar para trás e analisar como foram instruídos para então estejam aptos a responderem as curiosidades que surgirão tanto de forma prática, quanto fantasiosa”, completa.

A primeira consulta ao ginecologista deve ser antes da primeira menstruação

A Dra. Renata também alerta que a primeira visita ao ginecologista deve acontecer antes da primeira menstruação, isso porque a integração dos conhecimentos passados pelo especialista, pelos pais e pela escola aumentam em potencial a segurança dessa criança. “É a partir de então que ela é capaz de entender com maiores recursos o que está acontecendo com seu corpo e com a sua mente, porque a puberdade é um momento complicado. E também atrela as suas possíveis vontades a situações de risco e do quão vulnerável ela pode estar se tomar determinada atitude, por exemplo”, explica. Por isso, é fundamental que a partir dos 10 ou 11 anos, os pais já marquem essa primeira consulta. “Se os pais não tiveram tanta abertura com essa criança que agora já é um adolescente, aos poucos o profissional irá retomando essas questões, porque ele representará mais um pilar na sua vida”, completa.

A ginecologista alerta que estudos científicos têm mostrado que quase 50% das meninas têm iniciado sua vida sexual na faixa etária que compreende entre os 13 aos 14 anos. “Hoje, é muito difícil você controlar o acesso à mídia erotizada. As meninas estão menstruando cada vez mais cedo e tendo aquele boom hormonal junto com esse boom de informações erotizadas, que acabam favorecendo o interesse ao sexo de uma forma mais precoce. É o momento da família, da escola agirem. Em primeiro lugar, orientando o que acontece com o corpo depois que a menina menstrua. E explicar que apesar dela menstruar e poder manter relações sexuais pela maturidade do corpo, existe a possibilidade de contrair doenças e engravidar. Falar que essa gravidez será de risco porque o seu corpo ainda não consegue comportá-la, sobre as consequências para a sua vida acadêmica, profissional, afetiva e ensinar quais são os métodos contraceptivos disponíveis”, explica.

A proibição e a exposição como formas ineficazes de aprendizado e conscientização de risco

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As duas especialistas concordam que proibir e expor são formas ineficazes para lidar com o problema, principalmente quando se trata de masturbação, que ainda é uma prática vista puramente como masculina. “A proibição vem porque a gente associa a sexualidade com erotismo, e a gente acaba esquecendo que o sexo é um processo fisiológico, a questão do prazer é fisiológica. O nosso corpo foi feito para isso, é naturalmente propenso ao prazer, existem áreas erógenas do nosso corpo que foram desenvolvidas especificamente para isso”, diz Raquel.

A sexualidade apenas é descoberta pela vivência do próprio corpo. “Por isso a masturbação não deve ser entendida como algo somente dos meninos, porque as meninas também sentem prazer em determinada região e isso é fundamental para que eles lidem de uma forma saudável com a própria sexualidade. Por exemplo, um dia você diz que se ela for se limpar depois de fazer xixi ou quando estiver no banho, pode sentir prazer ao passar o papel ou a buchinha na região clitoriana. Dizer que isso é normal, mas que tem hora e momento para acontecer”, pontua a psicóloga.

6 dicas da psicóloga Raquel Jandozza para conversar sobre sexo de forma saudável com seus filhos:

1. Proibir não funciona. Por isso, diga quais são os lugares e os momentos para os filhos descobrirem o próprio corpo, se olharem nus no espelho, entenderem o que é o próprio corpo, perguntarem sobre questões de orientação práticas, de higiene etc.

2. A conversa não precisa ser feita de uma forma formal, é num papo descontraído, dentro de casa. É claro que não é um assunto que você vai abordar no almoço de família, para que seja possível criar noções de intimidade. E para que eles se conheçam em todos os níveis, emocional, afetuoso, psicológico.

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3. Não expor de forma alguma, falando para pessoas, postando em redes sociais, porque ele não sabe de todos os processos que estão acontecendo com ele. Você pode causar constrangimento e perder a confiança dele.

4. Às vezes, nessa busca, por não conseguir sanar a curiosidade, eles podem enveredar pela pornografia, enfim. Jamais invadir a privacidade da criança, porque você pode quebrar o elo de confiança fazendo isso. O bom senso nessa hora é sempre o caminho a ser seguido. Como eu gostaria que isso fosse abordado comigo? E como foi feito?

5. Se esses caminhos fossem trilhados, as chances de um risco provavelmente estariam bem longe. Falar sobre as consequências, explicar para o filho o que pode acontecer e não só castigar ou brigar.

6. Falar sobre confiança, sobre exposição de nudes, porque essa é uma realidade muito comum entre os adolescentes. Trazer para ele qual é a realidade e porque você ficou tão preocupado. Por vezes, deixar claro o motivo dessa preocupação mostra que você tem alguém que zela, que ele não está sozinho. Eles podem ficar chateados, num primeiro momento, mas no futuro elaborarão isso pelo viés da segurança. No entanto, tudo precisa ser dito com carinho, com cuidado para que eles não entendam isso com um sentido de perseguição. Dessa forma, vocês vão conseguir construir isso juntos e afastar a frustração do ‘não fazer’ porque é feio ou errado.

 

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