Perdi a memória e aprendi tudo de novo
No auge da carreira, um acidente me fez esquecer todo o meu passado. Tive que reaprender a falar, escrever e até comer
Dona da história: Zenilda Barbosa, 55 anos, figurinista, Rio de Janeiro, RJ
Reportagem: Clara Passi
Fiquei três meses em coma no hospital
e um completamente esquecida
Foto: Arquivo pessoal
O fim de semana começou com uma noite virada nos estúdios da Rede Globo. Eu coordenava a montagem do novo cenário do programa do Chacrinha de 1987. Passar a noite em claro era comum. Eu era macaca velha da produção dos figurinos e cenários e tinha acabado de ser promovida a gerente. Ou seja: as 24 horas do meu dia eram dedicadas a garantir que cada objeto de cena estivesse em ordem quando as câmeras fossem ligadas.
Depois de montar e desmontar tudo tomei o café da manhã de sábado num hotel à beira-mar, fui pra casa e dormi até as 6 da tarde. Acordei e fui para o aniversário de uma amiga. Na volta, já na esquina de onde moro, um ônibus avançou o sinal e pegou o meu carro em cheio. O motorista fugiu. Meu carro virou sucata. Pra mim tudo se apagou. Não senti nada, não vi nada, não me lembro de nada.
Foram três meses em coma e um fora do ar
O que sei do acidente foi minha mãe quem me contou. Apesar de ter sofrido traumatismo craniano, não precisei ser operada. Foram três meses em coma antes de voltar pra casa. Mamãe conta que eu não a reconhecia. Amigos de longa data viraram estranhos.
Eu não me mexia. Desaprendi a andar. Ficava sentada, parada, sem falar. Não sei traduzir em palavras o que sentia, mas era horrível. Eu não andava nem falava e não sabia o porquê. Mesmo hoje, depois de dez anos, não sei dizer o que se passava na minha cabeça. Bloqueei esse período.
Só depois de um mês em casa as coisas começaram a clarear. Eu tinha um médico para me auxiliar a voltar a falar, outro para escrever e um terceiro para desenhar. Todos iam à minha casa em dias alternados. Minei minhas economias em tratamentos.