Mulheres ganham espaço na ciência brasileira
Elas coordenam iniciativas inovadoras, como os projetos Odisseia e DNA do Brasil, além do Instituto de Ensino e Pesquisa Dasa
O que Lygia da Veiga Pereira, Michele Migliavacca e Flavia Paiva têm em comum? As três são brasileiras e pesquisadoras líderes em suas áreas e conduzem iniciativas que transformam a vida da população. No Dia Nacional da Ciência, celebrado em 8 de julho, suas trajetórias podem inspirar meninas e mulheres que também querem se dedicar a produzir conhecimento – que se traduz em avanços e benefícios para o bem comum.
Responsável pelo estabelecimento de uma primeira linhagem brasileira de células-tronco embrionárias de multiplicação in vitro, Lygia da Veiga Pereira é professora e pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) desde 1997. Em 2019, assumiu a frente do projeto DNA do Brasil, uma iniciativa que tem o objetivo ambicioso de colocar o país no mapa da genômica mundial.
“O principal objetivo é aumentar a diversidade dos dados genômicos disponíveis mundialmente”, ela explica. “Conhecendo as variações genéticas que existem no país, podemos desenvolver uma medicina de precisão para uma população como a nossa, que conjuga ancestralidade europeia, africana e indígena.” O projeto é realizado em parceria com a Dasa, maior rede de saúde integrada do país, e a plataforma de computação em nuvem Google Cloud.
Por sua vez, a dra. Michele Magliavacca é geneticista e coordenadora da Dasa Genômica, além de líder do Projeto Odisseia. “Com esse projeto, temos o objetivo de encurtar a caminhada do paciente com doença rara até o diagnóstico por meio da realização do teste genoma rápido em recém-nascidos naqueles pacientes em estado crítico internados em UTIs neonatais”, detalha.
Inteiramente financiada pela Dasa, a iniciativa se baseia no teste genoma rápido de sequenciamento completo em 100 pacientes internados em estado grave em UTI neonatal com suspeita de doença rara. É a primeira vez no Brasil que testes genéticos são usados como diagnóstico de emergência e a genética é aplicada em casos agudos.
Avanços
Michele lembra que há poucos médicos geneticistas no Brasil, e maioria é composta pelo público feminino. “Existem muitos estudos que sugerem que mulheres e homens praticam a medicina de forma diferente. Elas costumam ser mais comunicativas e aconselhar com frequência sobre os cuidados preventivos, além de aderir às diretrizes clínicas, e essas são algumas questões que podem trazem benefícios ao paciente”, ela explica.
“Há pouco de mais de 100 anos, se formava a primeira mulher médica no Brasil. Contudo, ainda temos um grande caminho para percorrer. Nós publicamos 30% menos do que os homens. Esse resultado tem uma explicação: sobrecarga feminina, principalmente após a maternidade”, diz a cientista.
De fato, o cenário vem mudando, mas ainda há espaço para avançar. Segundo um relatório do British Council realizado em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), as mulheres representam 46% do total de pesquisadores nos países da América Latina e Caribe. Estão, portanto, alcançando a paridade, ao menos numérica. Por outro lado, a publicação aponta que estereótipos de gênero e barreiras culturais estão entre os fatores que explicam a segregação das mulheres.
A dra. Flavia Paiva percebeu esse avanço ao longo da carreira. “Comecei cursando biomedicina, e na minha sala havia pouquíssimas meninas. No curso de medicina, comparativamente já havia um número maior de mulheres”, ela lembra. “Hoje, como professora do Programa de Pós-Graduação em Radiologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), vejo ainda mais alunas mulheres. Elas estão se interessando e quebrando barreiras”.
Flavia é coordenadora executiva do Instituto de Ensino e Pesquisa Dasa (IEPD) e coordenadora médica de pesquisa científica da Dasa, que, em 2021, levantou 252 artigos publicados em revistas médicas internacionais de renome. “As duas empresas entendem que pesquisa é essencial para entregar qualidade de vida aos pacientes. Temos aqui um grande equilíbrio de gênero, e a participação feminina é essencial.”
O IEPD é uma entidade sem fins lucrativos da qual a Dasa é a principal mantenedora e tem como objetivo impulsionar projetos de pesquisa científica nos campos da medicina e da saúde. Entre outros projetos, o instituto apoia o Genov, programa que está mapeando o genoma do Sars-CoV-2 no Brasil, e o laboratório de bioimpressão, que congrega impressão 3D e realidade virtual e aumentada. Pesquisas nas áreas de câncer de mama (inclusive um de avaliação psicológica de pacientes submetidas a biópsia), elastografia, cortisol basal e redes temáticas de inteligência artificial são apoiadas pelo IEPD.
“Temos publicado, de maneira constante, artigos de altíssimo impacto na literatura médica em áreas como inteligência artificial, genômica, oncologia, radiologia e, mais recentemente, estudos relacionados à Covid-19. Felizmente, também vemos muitas mulheres como autoras dessas publicações”, diz Flavia.