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Como o câncer de mama afeta a libido e a sexualidade

Efeitos colaterais do tratamento da doença causam queda no desejo e secura vaginal, o que pode afetar os relacionamentos que já não estavam muito bem.

Por Raquel Drehmer
Atualizado em 16 jan 2020, 08h25 - Publicado em 2 out 2018, 07h30

Se diagnosticado precocemente, o câncer de mama tem 95% de chance de cura. Seu tratamento pode incluir sessões de quimioterapia, de radioterapia e, em alguns casos, a necessidade de mastectomia (a retirada total da mama, que é substituída por expansor ou prótese). Diante disso, a mulher vê muitos aspectos de sua vida mudando repentinamente, incluindo um que é pouco lembrado: a sexualidade.

Tanto questões psicológicas quanto físicas contribuem para que a vida sexual da paciente com câncer de mama seja prejudicada, como explica o oncologista clínico Gilberto Amorim, conselheiro científico da Fundação Laço Rosa: “A reconstrução da mama nem sempre é imediata e, mesmo que seja, a cicatriz é grande e dolorida. A autoestima fica altamente comprometida. Daí vem a quimioterapia, que é outra pancada. A maioria dos medicamentos leva à queda dos cabelos, a energia cai, a mulher fica mais cansada, tende a ter menos vontade. Não é fácil manter a sexualidade normal.”

Além disso, quando há uma indicação de terapia hormonal para bloquear a produção e a ação dos hormônios, para diminuir os riscos de recidiva, os efeitos físicos são fortes. “São sintomas de menopausa: secura vaginal, ondas de calor, queda da libido, inchaço. Em alguns casos, ocorre uma atrofia vaginal que faz com que a mulher sinta muita dor na relação sexual e, por construir uma memória ruim daquele momento, não sinta mais vontade de tentar”, diz.

Como lidar com os efeitos colaterais do tratamento de câncer de mama

Há sempre alguma forma de contornar esses problemas. Gilberto, que procura aliar uma abordagem humana à técnica, conta que a atrofia vaginal pode ser tratada com cremes à base de derivados de estrogênio, que trabalham a elasticidade do músculo, ou com laser íntimo. Para a secura vaginal, o lubrificante à base d’água é uma ótima solução.

Trabalhar o emocional do casal também é importantíssimo no meio desse turbilhão de emoções e reações físicas. “A sexualidade está muito na cabeça”, defende o oncologista. “É preciso conversar com o companheiro ou com a companheira, com o médico, caprichar mais nas preliminares. Há o que fazer para resolver.”

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A psicóloga especializada em sexualidade Fernanda Navarro, da clínica Neolife (SP), vê a situação da mesma forma. “Neste momento, valorizar outras partes do relacionamento além do sexo ajuda. Falar coisas que estimulem, como ‘Não estou com você por causa dos seus cabelos’, elevam a autoestima da mulher que está passando pelo tratamento. Dormir agarradinho, tomar banho juntos, abraçar, fazer carinho, andar de mãos dadas. O ato sexual é apenas uma aba dentro da sexualidade”, afirma.

Ela considera importante reforçar com as duas pessoas do casal que o tratamento do câncer de mama tem começo, meio e fim – informação que, por mais óbvia que pareça, muitas vezes é esquecida –, e que uma hora essa fadiga e falta de vontade de fazer sexo vai passar.

Se for necessário, a recomendação da especialista é que se procure o auxílio da terapia individual ou de casal. “Manter o psicológico saudável ajuda no processo de cura. Aumenta a imunidade, diminui a recorrência de internações. Não pode negligenciar este lado”, justifica.

E como ficam os relacionamentos diante da sexualidade abalada?

Embora Gilberto observe que “é um clássico companheiros não segurarem a barra de um tratamento de saúde da mulher”, Fernanda sustenta que o câncer de mama e os efeitos colaterais de seu tratamento não são capazes, sozinhos, de prejudicar profundamente ou acabar com uma relação.

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“Quando o relacionamento é bom, o casal passa bem por tudo isso, supera junto; quando já não é legal, acaba piorando. A doença e as consequências do tratamento vêm para encerrar o que já não existia mesmo”, afirma a psicóloga.

Ela conta, ainda, que muitas vezes é a própria mulher que coloca um ponto final em uma relação que esteja ruim: “O câncer dá força para ela tomar uma atitude que já vinha sendo necessária, até para ela não ter que dividir energias entre seu tratamento e um relacionamento que exigia muito.”

De acordo com estudos feitos desde 2001 nos EUA e no Brasil, cujos resultados se repetem com pequenas variações ano após ano, cerca de 15% dos casamentos de pacientes com câncer de mama acabam durante o tratamento.

Holofotes sobre a sexualidade no debate sobre câncer de mama

Para quebrar o gelo sobre sexo e câncer de mama, a Fundação Laço Rosa colocou a sexualidade no centro de sua celebração do Outubro Rosa. Com o apoio de FQM Ginecologia, a campanha #50tonsderosa incentiva o debate sobre o assunto, para que as mulheres se sintam à vontade para falar sobre isso com parceiros e parceiras e também nos consultórios médicos.

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A ação é acompanhada pelo lançamento de um livro homônimo com fotos de quatro pacientes de diferentes idades e momentos do tratamento e textos inéditos. Os cliques são de Nana Moraes. Fique com uma amostra:

Fundação Laço Rosa - 50tonsderosa
(Nana Moraes/Divulgação)

Três mulheres, três histórias sobre câncer de mama, sexualidade e relacionamento

A seguir, três mulheres diagnosticadas com câncer de mama contam como sua sexualidade e seus relacionamentos foram afetados – positiva ou negativamente – pelo tratamento da doença.

Ana Luiza Sales, bibliotecária – Parte dos 15%

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“Durante meu tratamento, quem me acompanhou nas sessões de quimioterapia foi minha filha, na época com 14 anos. Meu então marido, com quem estava casada havia 19 anos, se mantinha alheio e chegava a cortar o assunto quando eu tentava contar algo sobre meus progressos. Até que um dia, na semana do terceiro ciclo da quimio, ele estourou porque quis transar e eu, não. Não era a primeira vez que acontecia, mas ele nunca quis ouvir minhas razões. Eu estava esgotada fisicamente, por efeito do medicamento, e também ficava mais inchada nas semanas de quimio, não me sentia à vontade para sexo. Naquele mesmo mês, ele falou que achava melhor a gente se distanciar enquanto eu estivesse me tratando e saiu de casa. Antes de eu acabar os seis ciclos de quimio, a gente se separou. Fiquei arrasada, mas não surpresa. Minha autoestima estava ruim por causa da saúde e ele não foi companheiro.”

Fernanda Muniz, enfermeira – A autodescoberta

“Em 2017 foi confirmado que eu tinha câncer de mama hormonal, ou seja, são meus hormônios que alimentam o câncer. E logo em seguida descobri metástase óssea. Primeiro passei pelo tratamento de quimio, porque o tumor cresceu de 1,5 cm para 4 cm e não era adequado fazer a cirurgia, ele precisava diminuir. Foram seis ciclos de quimio, tive todo o processo de queda de cabelos, náuseas, vômitos, parei de menstruar. Nesse período tive uma queda de libido, mas por estar exausta. Depois o corpo vai se adaptando aos sintomas, a imunidade volta a subir, e consegui fazer sexo com meu então namorado.

Quando acabei a quimio, fiz a cirurgia, a radioterapia para os ossos e comecei o tratamento com um bloqueador da produção dos hormônios. Automaticamente, tive uma queda da libido e ressecamento vaginal. Para piorar, meu médico achou melhor tirar meus ovários, porque comecei a produzir um pouco de hormônio. Então piorou cada vez mais a libido, a questão da minha sexualidade, do meu corpo. Afetou tudo na minha saúde, porque sexo é saúde. Quando comecei a fazer sexo e sentir dor, comecei a fugir. Então fui atrás de uma solução para o meu problema e para ajudar outras mulheres. Ainda tenho muito o que resolver na questão da sexualidade, mas a pós que busquei [em terapia sexual na saúde e na educação] me ajuda. A gente passa por tanto sofrimento, perder também a sexualidade não é justo, né?

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Hoje não estou mais com ele, mas a separação não teve nada a ver com a sexualidade.”

Linda Rojas, secretária executiva – Relacionamento fortalecido

“Tenho duas experiências com câncer de mama: em 2012, aos 24 anos, e em 2017, na mesma mama, a direita. Optei pela retirada das duas mamas, em conjunto com o médico.

Com relação à sexualidade, na primeira vez nossos momentos eram interrompidos na semana de quimioterapia. Tive muita sorte de ter um companheiro que se agregou ao processo, entendeu que faz parte da minha cura. E ele sempre me desejou muito, inclusive quando me sentia fraca por causa da quimio, então a gente conversava e eu dizia que não era um bom momento, porque eu não estava me sentindo muito bem, e ele sempre foi muito compreensivo. Nas outras semanas, a gente continuava a vida normalmente.

Nesta segunda vez, passei por um processo de quimio um pouco diferente e tomei uma medicação que faz com que os ovários fiquem congelados quimicamente. Na nossa relação, senti que estava com menos vontade, conversei com ele. Falei que não sabia o que estava acontecendo, mas eu não estava sentindo vontade, ele quis saber como ajudar. Uma semana depois, tivemos uma consulta e o oncologista falou sobre o assunto, sobre a importância das preliminares, minha baixa de libido, ressecamento vaginal, já receitou um creme.

Acho que acabou dando muito mais amor, entrega, intimidade. Eu sinto que ele me ama e me valoriza muito mais.”

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