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“Impeachment de Dilma é simbolicamente negativo para a mulher”

Confira a entrevista com Luciana de Oliveira Ramos, doutora em Direito Constitucional e membro da equipe de pesquisa Índice de Confiança na Justiça

Por Isabella Marinelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 8 Maio 2017, 12h58 - Publicado em 4 jul 2016, 18h03
Arte: Elisa Zaia
Arte: Elisa Zaia (/)
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Para discutir as recentes mudanças no eixo governamental com relação aos direitos femininos e representatividade política, CLAUDIA procurou mulheres que participam ativamente da democracia, são formadoras de opinião e militam pelas questões de gênero.

Estruturamos o debate com base em quatro questões padrões e as mesmas perguntas foram levadas a diversas especialistas escolhidas a dedo. Como resultado, lançamos a série Mulheres na Política, que reúne todos esses pontos de vista.

A entrevista que continua nossa sequência é com Luciana de Oliveira Ramos, doutora em Direito Constitucional e membro da equipe de pesquisa Índice de Confiança na Justiça (ICJBrasil) e Índice de Percepção do Cumprimento da Lei (IPCLBrasil):

1. O ranking “Abismo de Gênero”, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial em 2014, apontou, em seu último relatório, que o Brasil caiu 9 posições no ranking em relação ao ano anterior e ocupa a 71ª colocação na lista. Ficamos atrás de países como Nicarágua, Ruanda, Moçambique e Cuba. Quais são, na sua opinião, os avanços que as mulheres alcançaram no governo anterior? E os retrocessos?

Luciana Ramos: Um dos fatores que explica a queda do Brasil no ranking de igualdade de gênero, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, é a baixíssima presença feminina nas Casas Legislativas. De acordo com o levantamento da União Interparlamentar que analisa a participação de mulheres no Parlamento em quase todo o mundo, o Brasil está muito mal colocado: está na posição 155, de um total de 185 colocações. O Brasil é o país da América Latina pior colocado. O Brasil está pior colocado do que países que em geral são conhecidos pela constante violação dos direitos das mulheres, como Afeganistão (com 27,7% de mulheres no Parlamento), Sudão do Sul (com 26,5% de mulheres), Arábia Saudita (com 19,9%) e Índia (com 12% de mulheres). Assim, há poucos avanços a serem destacados nesse sentido. Porém, iniciativas interessantes apareceram nos últimos anos: como a criação da Bancada Feminina no Congresso Nacional, que visa fortalecer a voz das parlamentares dentro de um ambiente tão masculino como o Parlamento. A bancada teve um papel importante na CPMI da violência contra a mulher. Outra instituição que se destacou pelas ações que promoveu no sentido de minimizar a desigualdade de gênero foi a Secretaria de Políticas para Mulheres, que fomenta o Selo da igualdade de Gênero, lutou para a criação do Disque 180, entre outras medidas.

2. O primeiro anúncio da alta cúpula de Temer não tinha mulheres. No entanto, sob fortes críticas, ele se apressou em fazer contratações de peso, como Maria Sílvia Bastos Marques, para presidir o BNDES, e Flávia Piovesan, para a Secretaria de Direitos Humanos. Esse é um bom sinal ou apenas um remendo frouxo?

LR: É um sinal de que o governo foi ao menos influenciado pelas pressões sociais e procurou refletir melhor sobre as indicações de mulheres para cargos de relevância nacional, fomentando a diversidade. É importante lembrar, porém, que nenhuma dessas indicações substituiu ministros. A indicação da Flávia Piovesan, por exemplo, não foi uma indicação para o primeiro escalão do Governo. Ela chefiará a secretaria de Direitos Humanos, que é subordinada ao Ministério da Justiça. Se essas indicações são um remendo frouxo, só o tempo dirá. De todo modo, as escolhas feitas são muito boas e servem para mostrar que há, sim, mulheres muito competentes para assumir cargos relevantes na República.

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3. O Brasil tem apenas 9% de mulheres em cargos legislativos. O sistema de cotas seria a solução para chegar à paridade?

LR: Há três tipos de sistemas de cotas eleitorais de gênero: (i) a reserva de assentos; (ii) as cotas dos partidos; e (iii) as cotas legislativas. A reserva de assentos, diferentemente dos outros dois tipos, estabelece um número mínimo de legisladoras, ao invés de simplesmente definir uma quantidade mínima de mulheres entre os candidatos. As cotas partidárias, por sua vez, são medidas adotadas voluntariamente por partidos, que se comprometem a indicar um percentual mínimo de mulheres na lista de candidaturas. Já as cotas legislativas correspondem a disposições mandatórias que se aplicam a todas as agremiações políticas. É esse último tipo de cotas eleitorais que temos no Brasil. Em 1997, foi aprovada a Lei Federal nº. 9.504, que estabeleceu uma quota mínima de 30% e máxima de 70% para candidaturas de cada sexo para os cargos de representação proporcional (Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais). Desde a existência dessa lei até hoje, a proporção de mulheres eleitas para a Câmara dos Deputados passou de 5,7% para 9,9%. Isso mostra um aumento muito tímido da representação feminina, o que nos leva à conclusão de que esse tipo de sistema de cotas não tem sido efetivo. Portanto, as cotas eleitorais já existentes não são a melhor solução para se chegar à paridade de gênero.

Uma forma eficiente de se alcançar a participação paritária de homens e mulheres é a reserva de assentos. Nesse caso, 50% das cadeiras seriam reservadas às candidatas mais votadas nas eleições e a outra metade das cadeiras seria reservada aos candidatos mais votados, garantindo, assim, a representação feminina. Há uma proposta de emenda constitucional semelhante a essa em tramitação no Congresso Nacional. A proposta visa a garantir participação mínima para mulheres e homens na Câmara dos Deputados, nas assembleias legislativas dos Estados, na Câmara Legislativa do Distrito Federal e nas câmaras municipais. A garantia vale pelas três legislaturas subsequentes à promulgação da PEC. O percentual mínimo é de 10% das cadeiras da casa na primeira legislatura, 12% na segunda e 16% na terceira. Essa proposta, apesar de polêmica, ainda está longe de alterar significativamente o cenário de sub-representação feminina no Parlamento, pois esses percentuais não chegam nem perto da média mundial de participação de mulheres nas Casas legislativas, que é de 26%.

4. Dilma Rousseff alegou, em seu discurso no “Encontro com Mulheres em Defesa da Democracia” que “O fato de ser mulher teve influência na abertura do meu processo de impeachment.” Você concorda que o sexismo influenciou nas decisões do Congresso e do Senado?

LR: O sexismo, por ser tão latente em nossa sociedade, pode ter exercido alguma influência, mas não acredito que esse tenha sido um fator preponderante para a abertura do processo de impeachment. De toda forma, na votação da Câmara dos Deputados, vimos sinais claros de sexismo, como o “tchau, querida”. Fato é que o processo de impeachment da Presidente Dilma tem um efeito simbólico negativo para a potencial eleição de outra mulher para a Presidência da República.

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