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“Eu me senti um nada. E ele ainda me ameaçou”, relata adolescente estuprada pelo namorado

Aos 13 anos, Ariana sofreu um trauma para a vida toda. Encontrou forças para recomeçar através do projeto social Romper, na comunidade onde vive, em Belo Horizonte

Por Aline Takashima (colaboradora)
Atualizado em 12 abr 2024, 16h32 - Publicado em 20 set 2016, 17h46
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Em sua ingenuidade de menina, *Ariana acreditava ter conhecido o grande amor da sua vida aos 12 anos de idade. No ano anterior, começou a frequentar os bailes funks da comunidade Morro das Pedras, em Belo Horizonte. Antes de sair de casa, admirava-se no espelho, retocava o batom e ia ao encontro das amigas mais velhas, todas de 15 e 16 anos. Conheceu João em uma dessas festas. Ela apresentou-se como uma garota de 14 anos. Ele disse que tinha 22, mas na verdade acabara de fazer 34. “Depois que o *João me beijou, achei que ia casar e ter filhos com ele”, revela Ariana, que namorou escondido dos pais por dois anos. 

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A garota decidiu dar um basta na relação quando descobriu que ele a traía. João não aceitou o fim do relacionamento e convidou Ariana para conversar em sua casa. ”Eu queria terminar, mas era tão difícil. Eu não ia suportar ele com outras. Ou ele era meu ou não era de ninguém”, sentenciou a menina. O que seria só um encontro, transformou-se em um trauma para a vida toda. Aos 13 anos, Ariana foi estuprada pelo ex-namorado que ainda amava e o primeiro e único que transou. “Eu me senti ninguém. Eu me senti inferior. Ele ainda me ameaçou: ‘Se você contar para o seu pai e a sua mãe eu mato a sua família.’ Eu me isolei e guardei segredo”, lamenta. 

Após três meses do ocorrido, começou a se sentir constantemente cansada e recebeu a sentença em um posto de saúde: havia contraído HIV. Ariana faz parte do grupo de mulheres vulneráveis no mundo. De acordo com o relatório da ONU, Empower Young Women and adolescent girls: Unaids & The African Union (Capacitar jovens mulheres e adolescentes: Unaids & a união africana, em tradução livre), as adolescentes e mulheres jovens estão mais propensas a sofrer violência física e psicológica. E, as que possuem parceiros agressivos apresentam 50% mais chance de contrair HIV do que aquelas que não estão expostas à violência. 

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A médica Naila Janilde Santos, gerente de prevenção do Centro de Referência e Tratamento de DST Aids, em São Paulo, afirma que as mulheres estão mais sujeitas ao contágio em razão das formas de poder estabelecidas entre homens e mulheres. “A mulher tem uma chance maior de ser infectada do ponto de vista biológico, mas, sem dúvida, também existem as questões sociais. Muitas estão submetidas economicamente e socialmente aos homens”, explica. 

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A especialista acrescenta que a razão principal para as pessoas contraírem o vírus não é a falta de informação sobre o uso de camisinha, mas, sim, o machismo enraizado em nossa sociedade. “Eu vejo as novas gerações com toda a discussão sobre liberdade sexual e quando a menina transa com vários rapazes é chamada de galinha. A questão do machismo que permeia o imaginário dos homens e das mulheres ainda é um complicador para que elas entendam os seus direitos sexuais. Apesar dos avanços, o mundo ainda é bem machista e as mulheres estão em desvantagem.” 

Após o diagnóstico, Ariana parou de frequentar a escola. Os seus dias resumiam-se em chorar e dormir. “O mundo tinha acabado. Nada fazia sentido ou importava”, revela. Ela só tomou coragem em enfrentar a doença e procurar ajuda após conversar com Juthay Nogueira, coordenadora do Projeto Romper e finalista do Prêmio CLAUDIA, na categoria Consultora Natura Inspiradora. “Ela [Juthay] disse que sofrer não resolve nada. Assim a minha vida não iria para frente”, conta a garota.

Uma das iniciativas do Projeto Romper é dar suporte para as adolescentes da comunidade. O grupo recebe orientações sobre formas de prevenção e apoio quando descobrem uma gravidez indesejada ou contraem HIV. Juthay oferece a garagem da sua casa para a realização de rodas de conversa sobre sexualidade com psicólogas voluntárias e aposta no empoderamento feminino através da comunicação. “Na favela não tem lei. Não existe Lei Maria da Penha ou lei contra à pedofilia. O povo da comunidade sofre muito e existe um silêncio. Mas esse silêncio deve ser rompido”, afirma a finalista do Prêmio CLAUDIA. 

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Hoje, aos 16 anos, Ariana voltou a estudar e pensa em ingressar em uma faculdade. É o começo da tarde de uma quarta-feira de setembro, uma música de rap ecoa nas vielas da comunidade. Ariana vende roupas no bazar do Projeto e, cheia de sonhos, revela os planos para o futuro: “Minha vida não está 100% boa. Ainda tenho lembranças doloridas, mas eu me sinto melhor. Se eu ficar chorando eu não vou para frente. O segredo é não desistir.” 

*Nomes fictícios. 

Você também faz parte do júri que irá eleger as vencedoras de cada categoria. Para votar, aperte o coração ao lado da foto da finalista. Leia as histórias, avalie os trabalho e escolha as suas candidatas.

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