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“Eles matam a família e sequestram as crianças para lutar”

Yurani Salazar, 25 anos, mãe de duas filhas, abandonou a Colômbia depois de ter o marido assassinado por grupos criminosos

Por Aline Takashima (colaboradora)
Atualizado em 28 out 2016, 10h15 - Publicado em 6 Maio 2016, 15h44
Jorge Hynd
Jorge Hynd (/)
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Neste Dia das Mães, CLAUDIA produziu três reportagens sobre mães imigrantes e refugiadas. Para sobreviver, elas fogem e arrastam toda a família, ou parte dela, em busca de segurança. Deslocam-se por conta de perseguições políticas e religiosas, violações de direitos humanos e questões econômicas. Muitas não escolhem o Brasil. Param aqui por sorte do destino. Embarcam em um navio sem saber o ponto final. Conversamos com mães que engravidaram no Brasil, como a senegalesa Ndéye, as que deixaram os filhos, como a congolesa Sylvie, e as que trouxeram os filhos, como a colombiana Yurani, cuja história você lê a seguir.

O choro da filha de quatro meses acordou Yurani Alejandra Angarita Salazar. “O bebê está com fome”, deduziu a mãe da caçula Isabela e de Sofia, de 3 anos. O pouco leite em pó do armário foi suficiente para a colombiana de 25 anos preparar uma mamadeira. Antes do almoço, seu marido Fernando (nome fictício) saiu de casa para comprar leite. Nunca mais voltou.

Há mais de 50 anos, a Colômbia enfrenta guerrilhas associadas a grupos de traficantes de drogas. Em 2015, aproximadamente 122 mil pessoas morreram vítimas do conflito armado e cerca de 120 mil se deslocaram para fugir dos grupos criminosos, segundo a Rede Nacional de Informação (RNI).

 

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Yurani e Fernando conheceram-se em Bogotá em 2008, onde casaram e tiveram Sofia. Após o nascimento da primogênita, Fernando decidiu sair da guerrilha, a qual pertencia. “Quem participa destes grupos de narcotráfico não sai, só resta a morte”, explica Yurani. Para não morrer, a família fugiu.

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Moravam há sete meses em Calle no dia que Fernando foi comprar leite. O colombiano estava a um quarteirão de casa quando foi morto com um tiro à queima-roupa. Alguns minutos depois, Yurani viu uma foto do corpo no celular dos vizinhos. No instante seguinte, recolheu uns poucos pertences em duas malas pequenas e abandonou a casa no meio da chuva e com as duas filhas nos braços.

Naquele mesmo dia abafado de janeiro, Yurani foi até a rodoviária. Comprou uma passagem e viajou durante 15 dias. Passou pelo Equador e Peru antes de chegar ao Brasil. “Eu fui embora pelas minhas filhas. Os guerrilheiros matam famílias e sequestram as crianças para lutar.”

Entre 1999 e 2015, o Instituto Colombiano de Bem-estar Familiar (ICBF), organização dedicada aos cuidados de crianças e adolescentes, atendeu 5.923 jovens recrutados por grupos armados. Dentre as facções que sequestram crianças estão as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Exército de Liberação Nacional (ELN) e os paramilitares.

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 “O recrutamento ilícito de crianças e adolescentes é uma das violações de direitos humanos mais graves do conflito armado colombiano. (…) As crianças são vítimas do deslocamento forçado, violência sexual, entre outros”, esclarece o último relatório do ICBF, de fevereiro deste ano.

Jorge Hynd
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A colombiana vive há três meses no Brasil. Divide uma cama com as duas filhas em uma pensão. Não consegue um trabalho formal, pois ainda não tem carteira de trabalho. As crianças estão na fila de espera para conseguir se matricular na creche. Enquanto isso, Sofia participa de um projeto social da prefeitura. Pratica balé, brincadeiras e jogos durante a tarde.

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O processo para conseguir refúgio no Brasil demora em torno de um ano e meio a dois anos. De acordo com Maria Cristina Morelli, coordenadora do Cáritas, centro de referência para os refugiados, não há diferença de critério em relação a mães com filhos. O pedido não é agilizado por conta disso. Ela explica que os refugiados adaptam-se de maneira “forçada”, pois são obrigados a abandonar o seu país. O primeiro passo para se ajustar é aprender o idioma, em seguida, conhecer as leis trabalhistas, para então começar a trabalhar. Maria Cristina ressalta que, no caso das mulheres, a adaptação é ainda mais complexa, já que muitas têm filhos e precisam colocá-los na escola.

Segundo o Comitê Nacional para Refugiados (Conare), os colombianos representam o terceiro maior contingente de refugiados no Brasil, com 1.093 pessoas. Atrás dos sírios, com 2.077 pessoas e dos angolanos com 1.480. No total, o país abriga 8.400 refugiados que migram por conta da guerra, violações de direitos humanos e perseguições políticas e religiosas.

Yurani estudou até os 16 anos. Vendia marmitas com arroz e feijão na Colômbia. No Brasil, pretende concluir o ensino médio e fazer faculdade. “Quero aprender as línguas do mundo”, revela. A refugiada demorou um ano até conseguir engravidar de Sophia. Na época, tinha 22 anos. Ao lado das crianças, sente-se invencível. “A minha vida melhorou quando eu me tornei mãe. É muito triste estar sozinha. Sei que sou importante para as duas. Me sinto amada.”

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Balões de diferentes formas e desenhos colorem uma esquina na Liberdade, São Paulo. São os produtos que Yurani vende no bairro que vive. Deitada no carrinho, Isabela observa com os olhos redondos e verdes as pessoas que caminham apressadas. Mexe os bracinhos e pernas e sorri enquanto se diverte sozinha. Sofia observa a irmã e solta uma gargalhada. É a dona da rua e de todas as bexigas. A colombiana projeta um futuro brilhante para as filhas no Brasil:  “Espero que elas entrem na escola, crescam bem, sintam paz e vivam sem medo”.

*Nome fictício 

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