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“É essencial que mulheres ocupem o espaço político da sociedade”

Confira a entrevista com Isa Penna, pré-candidata a vereadora de São Paulo e militante feminista

Por Isabella Marinelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 8 Maio 2017, 12h56 - Publicado em 5 jul 2016, 09h19
Arte: Elisa Zaia
Arte: Elisa Zaia (/)
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Para discutir as recentes mudanças no eixo governamental com relação aos direitos femininos e representatividade política, CLAUDIA procurou mulheres que participam ativamente da democracia, são formadoras de opinião e militam pelas questões de gênero.

Estruturamos o debate com base em quatro questões padrões e as mesmas perguntas foram levadas a diversas especialistas escolhidas a dedo. Como resultado, lançamos a série Mulheres na Política, que reúne todos esses pontos de vista.

A entrevista que continua nossa sequência é com Isa Penna, pré-candidata a vereadora de São Paulo e militante feminista:

1. O ranking “Abismo de Gênero”, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial em 2014, apontou, em seu último relatório, que o Brasil caiu 9 posições no ranking em relação ao ano anterior e ocupa a 71ª colocação na lista. Ficamos atrás de países como Nicarágua, Ruanda, Moçambique e Cuba. Quais são, na sua opinião, os avanços que as mulheres alcançaram no governo anterior? E os retrocessos?

Isa Penna: A razão da queda que os índices mencionados demonstram é justamente o governo petista. Isso porque, durante seu governo, nem Dilma nem Lula se comprometeram com as defesas dos direitos mais básicos das mulheres, ao contrário, deram declarações que não mexeriam na questão do aborto, firmaram o acordo Brasil-Vaticano, trouxeram os mega eventos que aumentam a prostituição e o Turismo sexual. Veja que não estamos falando de avanços, porque o que ocorreu foram graves retrocessos. Ocorre que, o verdadeiro balanço do governo Dilma, sobre o qual as feministas tem muito que refletir, é de que o debate da representatividade deslocado de um programa e da prática política nos servem muito pouco.

A verdade é que mesmo antes desta queda de 9 posições, a posição do Brasil já era bastante ruim, isto porque o governo do PT não atacou frontalmente os pilares do machismo em nossa sociedade. Podemos dizer que existiu alguns avanços, como a prioridade para mulheres receberem o bolsa família e nas filas das moradias populares, porém não tivemos um comprometimento com os  dos direitos mais básicos das mulheres, ao contrário, deram declarações que não mexeriam na questão do aborto, firmaram o acordo Brasil-Vaticano, trouxeram os mega eventos que aumentam a prostituição e o Turismo sexual e creio que é por não enfrentar de frente o machismo estrutural do nosso país que permite que, quando chegada uma crise econômica/política, a condição da mulher na sociedade piore. Precisamos fazer um verdadeiro balanço do governo Dilma, sobre como o debate de representatividade deslocado de um programa e da prática política não alteram substancialmente a nossa condição na sociedade.

2. O primeiro anúncio da alta cúpula de Temer não tinha mulheres. No entanto, sob fortes críticas, ele se apressou em fazer contratações de peso, como Maria Sílvia Bastos Marques, para presidir o BNDES, e Flávia Piovesan, para a Secretaria de Direitos Humanos. Esse é um bom sinal ou apenas um remendo frouxo?

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IP: A nominata de ministros do Temer, seja pelo número de réus, seja pela ausência de mulheres, negros e lgbt’s no cargo de ministros, é a expressão do projeto político deste governo, qual seja, uma reforma estrutural nas bases políticas, econômicas e sociais do Brasil, com o objetivo de retirar os direitos mais básicos e duramente conquistados pelos trabalhadores. Do ponto de vista das mulheres, é um desastre ainda maior, porque nos afasta ainda mais da conquista dos nossos direitos e porque tentará nos escantear dos debates políticos. Desta forma, a posterior nomeação de duas mulheres é apenas um remendo frouxo, já que a nomeação para os principais cargos e todo o projeto político que Temer defende não vai ser alterada.  Contudo, apesar deles, milhares de mulheres ocupam as ruas para negar este projeto e a tendência é aumentar este número, as mulheres não voltarão aos seus lugares de donas de casa, recatadas e do lar.

3. O Brasil tem apenas 9% de mulheres em cargos legislativos. O sistema de cotas seria a solução para chegar à paridade?

Penso que devemos, primeiramente, pensarmos qual a importância da representação política.  Como sabemos, a divisão de papeis femininos e masculinos, estereótipos que marcam a nossa socialização, permite a continuação da dicotomia público-privado, que é um pilar fundamental desse sistema. O espaço público é racional, universal, justo, é masculino. O espaço privado é do cuidado, da doação, do afeto, é feminino. Isso faz com que se perpetue a divisão sexual do trabalho e a superexploração das mulheres e dificulte muito a nossa ocupação dos espaços políticos. Portanto, a representação política é muito importante. Assim, penso que talvez a definição de uma cota mínima de representação feminina seja sim uma importante definição, pois é essencial que as mulheres ocupem o espaço público e político da sociedade. Porém, precisamos ressaltar algumas questões. O ser mulher não é universal, nossa experiência é permeada por dimensões de classe, sexualidade e raciais. Eu e meu grupo, quando pensamos na importância da representação política feminina, reivindicamos uma representação que lute por um programa feminista, anti-racista e lgbtfóbico, o que, para nós, também significa um programa anti-capitalista.

4. Dilma Rousseff alegou, em seu discurso no “Encontro com Mulheres em Defesa da Democracia” que “O fato de ser mulher teve influência na abertura do meu processo de impeachment.” Você concorda que o sexismo influenciou nas decisões do Congresso e do Senado?

Eu sinto que essa conjunção de crises política e econômica no Brasil, inseridas em uma crise global desse sistema foi pautada pelo fortalecimento do conservadorismo e o ataque aos direitos das minorias políticas, dentre elas as mulheres. E a reação política foi protagonizada por esses mesmos grupos, basta olharmos como as mulheres e seu “Fora Cunha” em 2015 (inaugurando o que algumas chamam de “primavera lilás” no Brasil), um dos momentos políticos mais importantes desse ano, foram capazes de radicalizar as pautas nas ruas, para além do “Fla-Flu” da direita mais raivosa e dos governistas.

Penso que toda a construção desse processo de impeachment (que concordo com a caracterização de se tratar de um golpe jurídico-institucional-midiático) foi permeada por discursos e práticas misóginas sim, reforçando histeria e descontrole (e, consequentemente, incompotência) como características femininas incompatíveis com a política, por meio da figura da Dilma e, ao mesmo tempo, consolidando a ideia de que, se a mulher tem um papel na política, é o de adorno, enfeite, como a caracterização feita de Marcela Temer.

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