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Coluna da Liliane Prata: Você está confusa ou está com medo?

Nossa editora Liliane Prata fala sobre aquelas situações em que confundimos essas duas coisas

Por Liliane Prata
Atualizado em 28 out 2016, 00h31 - Publicado em 28 jul 2016, 13h59
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Uma conhecida minha sempre quis fazer um mochilão sozinha pela costa oeste dos Estados Unidos. Com vinte e poucos anos, o desejo era inviável: faltava grana. Com vinte e tantos, ela quase foi, mas o namorido não estava muito a fim de acompanhá-la, ela não quis ir sozinha e morrer de saudade dele, enfim: não foi. Aos trinta e poucos, separada, decidiu: “Agora eu vou”. E aí ela comprou as passagens, tirou o visto, fez reservas, pesquisou roteiros, baixou mapas, aplicativos, e, duas semanas antes de partir…

– Tô pensando em cancelar a viagem – ela comentou, num almoço com várias pessoas.
– Quê? – eu falei. – Mas você não estava doida pra viajar? O que aconteceu?
– Putz, não quero gastar essa grana toda, e ficar pra lá e pra cá sozinha, o mundo doido do jeito que tá, sei lá, perdi a vontade… Eu sou assim, sabe: me animo, faço o maior auê, mas depois não sei o que quero. Sempre fui meio confusa, hehehe.
– Mas espera, você tá confusa ou simplesmente tá com medo?

Nem somos muito próximas, e me senti meio enxerida (sou meio enxerida às vezes). Mas a questão é que me identifiquei muito com o conflito dela. Várias vezes, me refugiei na desculpa da confusão mental quando, na verdade, estava tendo um surto de covardia difícil de admitir para mim mesma (que dirá para os outros). Quantas vezes falei para as minhas amigas “Ai, sou tão louquinha”, quando na verdade estava omitindo a verdadeira frase: “Ai, tô com tanto medo”. Quantas vezes não era indecisão, e sim medo de bancar o que eu queria, o que eu sabia que queria.

Muito mais charmoso um “Sou tão confusa” do que um “Tô cagando de medo”. 

Momentos decisivos são difíceis. A gente pensa, avalia as possibilidades, até que numa terça qualquer respira fundo e compra as passagens, ou pede demissão, termina o casamento, para de tomar a pílula, se matricula no curso, junta a papelada para abrir o negócio. Mas o mais difícil ainda é o que vem depois da decisão tomada: é bancá-la, em toda a sua dor e delícia. É abraçar o que a gente decidiu sem olhar para trás. Muito mais difícil do que tomar uma decisão é seguir com paz de espírito depois da decisão tomada.

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Talvez porque saber o que se quer seja meio assustador. Tipo, a gente sabe que quer isso, mas, caramba, a gente vai fazer isso mesmo? Assim, no escuro, sem garantias – como tudo na vida?

Aí entra o “Como sou confusa”. As passagens estão compradas, o processo de demissão está rolando no RH, mas você entra em parafuso. Não porque está indecisa – afinal, você já se decidiu. E não porque está “confusa” – confusa a gente fica antes de ter decidido, certo? Você está simplesmente morrendo de medo. De a viagem ser uma furada, de se arrepender de terminar o relacionamento, de o negócio dar errado. De a vida dar errado, apesar da sua expectativa, da mistura de sonho e cálculo, da aposta bem intencionada, do suspiro inicial de alívio quando você finalmente decidiu – durou tão pouco aquele alívio…      

– Não sei. Talvez eu esteja com medo – ela confessou, para mim e para si mesma, ali, no restaurante.

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Falta de clareza mental, não ter ideia do que está sentindo ou de que caminho seguir, não conseguir avaliar os prós e contras de uma situação, se sentir naufragada em um mar de contradições e mudanças de ideia: já tive esses momentos na vida, acho que todo mundo. Fez um ótimo trabalho de autoconhecimento quem sabe distinguir esses momentos de confusão genuína dos de puro medo. Passar por cima do medo, quando é esse o caso, e seguir em frente, então… Aí é o céu no nosso complexo mundo interior. Como fez minha conhecida, que acabou respirando fundo e entrando no avião.

Liliane Prata é editora de CLAUDIA e escreve aqui no site semanalmente. Para falar com ela, clique aqui

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