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Coluna da Liliane Prata: “Eu odeio meu corpo”

Nossa editora Liliane Prata comenta em sua coluna sobre o mal-estar na própria pele e suas consequências para nosso mal-estar como um todo

Por Liliane Prata
Atualizado em 28 out 2016, 04h50 - Publicado em 16 jun 2016, 14h00

– Meu Deus, nada fica bom – escutei a adolescente dizendo à amiga, no provador da Forever 21. – Meu, eu odeio meu corpo!

Não foi exatamente a primeira vez que ouvi alguém falando isso. “Eu odeio meu corpo”, ou então “eu odeio meu braço gordo”/“eu odeio minha bunda”/“eu odeio minha barriga”: vira e mexe alguém diz frases assim na academia, no restaurante, na rua. São relativamente comuns, mas confesso que elas costumam me chocar um pouco. Odiar o corpo ou partes dele: acho isso meio forte.

Estar insatisfeito com a aparência é mais ou menos comum. Segundo esta pesquisa aqui, realizada na América Latina com 25 mil pessoas, os brasileiros são os mais insatisfeitos da região com a silhueta: só 30% se dizem satisfeitos. Até aí, nada impressionante. “Insatisfeito” é palavra meio neutra, sem força, quase inerente à condição humana. Eu adoro meu corpo, mas, se aparecesse uma fada-madrinha na minha frente, claro que pediria para ela mexer em uma ou outra coisinha. Adoro viver, mas… Adoro meu trabalho, meu casamento, meu apartamento, mas… Mas a gente é assim, fazer o quê.  

O que me pega é aquela insatisfação mais ranzinza, aquele desconforto crônico que descamba para um mal-estar na própria pele. Ficar reclamando que o braço é mole, que a bunda que não é igual a da Juliana Paes, que a barriga que não é como a da Gabriela Pugliesi. Posso olhar a foto da Pugliesi e ver que nossas barrigas não são iguais, mas daí a ficar se lamentando, se maltratando… Não sei, me parece meio surreal ter uma relação tão hostil com nosso próprio invólucro, algo que está com a gente em todos os momentos; algo que, bem, é a gente – ou que contém/embala/protege/viabiliza a gente, dependendo do ponto de vista.

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Tenho uma amiga bem angustiada com o peso. Uma vez, num almoço, ela disse: “Comi pra caramba agora e vou comer muito à noite, porque tenho um jantar… Sou uma imbecil, mesmo”. Falei como aquilo era importante na minha vida, me sentir bem na minha própria pele, e ela respondeu: “Pra você, é fácil. Você é magra”. Mas quantas mulheres são mais magras do que eu e mantêm uma relação angustiante com o que veem no espelho? A adolescente do provador, mesmo, era bem magrinha. Já presenciei tanta gente que está “no peso” se xingando por comer um brigadeiro, xingando o brigadeiro, xingando o confeiteiro por não resistir ao brigadeiro…

Quando vejo crianças pequenas brincando, girando, dançando e rindo à toa, super à vontade com suas barriguinhas, bracinhos, ombrinhos e tudo mais, me pego pensando: tomara que elas continuem assim quando crescerem. Mas, cada vez mais, percebo que manter uma boa relação com o corpo na idade adulta é um desafio difícil, considerando o quanto nossa sociedade estimula, além da neurose como um todo, a neurose com a aparência: a busca das medidas perfeitas, a comparação angustiante, principalmente entre as mulheres…

Se bem que talvez… Talvez esse desafio fique mais fácil quando a gente lembra que o corpo significa tão mais do que estética. Ninguém aqui está minimizando a satisfação estética, eu mesma me cuido muito (geralmente com prazer, não com angústia). Mas, caramba, nosso corpo é tão mais que isso.

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Quando penso em corpo, costumo me lembrar que é por meio dele que experenciamos o mundo. Aqueles momentos intensos e preciosos, em que a gente se sente conectado com a vida – nadando no mar, abraçando forte nosso filho no fim do dia, esquecendo de tudo enquanto dança numa festa, enquanto corre no parque ou faz ginástica, enquanto faz sexo… Em todos esses momentos, estamos sentindo a existência por meio do nosso corpo. Ele não apenas nos acompanha, ele não “apenas” é a gente ou está com a gente – ele possibilita as sensações, abre as portas para a existência passar, e todas as crianças sabem disso muito bem.

O mal-estar com o corpo pode ser comum, pode parecer banal. Mas, sem nos darmos conta, esse mal estar pode crescer a ponto de comprometer nossa experimentação em muitos níveis. É uma angústia que vai transformando nossa natação em lamentação, nossas tarefas simples como provar uma roupa em desgaste, nosso buscar o filho na escola com preocupação com os olhares alheios, nosso almoço com a amiga em turbulência com a comida. O mal-estar com o corpo, acredite, não prejudica só a praia do fim de semana e a piscina do clube, mas nossos sorrisos, nossos orgasmos, nosso tempo livre, nosso cardápio de interesses, nosso entusiasmo, nosso envelhecimento sereno, nossas relações – a começar da nossa relação com a gente mesma. 

Liliane Prata é editora de CLAUDIA e escreve aqui no site semanalmente. Para falar com ela, clique aqui!

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