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Nina Silva e a tecnologia como ferramenta para uma nova realidade

Cofundadora do Movimento Black Money e uma das mulheres mais disruptivas do mundo, Nina é capa da edição de maio de Claudia

Por Bárbara Poerner
Atualizado em 12 Maio 2023, 13h33 - Publicado em 12 Maio 2023, 08h32
Nina silva - capa claudia por inteligência artificial
Ensaio com Nina Silva foi criado com inteligência artificial. (Fabio Setti/CLAUDIA)
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Filha de dona Marize e seu Antônio Carlos. Entre tantos títulos importantes e premiações renomadas, é assim que Nina Silva faz questão de se apresentar. Ela é empresária e executiva em tecnologia, há mais de duas décadas, e especialista em gestão de negócios e inovação com atuação internacional. Em 2017, foi uma das fundadoras do Movimento Black Money (MBM), focado em articular social, financeira e profissionalmente a população negra brasileira, que, mais tarde, se desdobrou no D’Black Bank. Com uma jornada perspicaz às constantes mudanças do mundo, Nina tem adentrado cada vez mais os espaços digitais, inclusive no recurso que foi utilizado para a CLAUDIA produzir esta capa e matéria inéditas: a inteligência artificial.

Nascida no Jardim Catarina, no Rio de Janeiro, favela urbana que já foi uma das maiores da América Latina, Nina foi a segunda pessoa de sua família a ter acesso ao ensino superior — sua irmã mais velha foi a primeira e, hoje, atua como psicóloga, psicanalista e advogada —, mas não pensava em seguir o rumo profissional que se consolidou. “Não tinha a intenção de fazer tecnologia. Me faltavam referências, não sabia da área… Queria ser advogada com [especialização em] direito e economia”, conta ela, aos 40 anos.

O interesse pela advocacia partiu do seu senso de justiça, já aflorado na adolescência e juventude. A personalidade multitask também. Na escola, era curiosa, gostava e tinha aptidão para várias coisas: foi líder de torcida, capitã do time de handebol e chefe dos clubes de literatura e matemática. Curtia os números, mas também as palavras. Escolheu, então, estudar administração na Universidade Federal Fluminense (UFF) e logo começou um estágio em informática. Foi aos poucos descobrindo o poder e as possibilidades da área tecnológica.

À época, Nina conta que não via pares no ambiente de trabalho. Agora, embora o cenário empresarial e tech tenha adquirido novas referências, como ela, ainda está longe do ideal. As mulheres negras e indígenas são apenas 11% dos profissionais de empresas de tecnologia no Brasil, mesmo sendo 28% da população do país. Junto a isso temos a discrepância salarial de negros e brancos, que pode chegar a 30%.

ensaio Nina Silva para Claudia feito com inteligência artificial
“Me encontro nessa tecnologia não inclusiva e, ao longo da minha trajetória, tento transformá-la (Fabio Setti/CLAUDIA)

Todos esses dados reveladores da desigualdade econômica, social e racial não a afastaram do desejo de adentrar a área, justamente para modificá-la. “Me encontro nessa tecnologia não inclusiva e, ao longo da minha trajetória, tento transformá-la. Nunca pude me auto boicotar porque o mundo sempre se opôs a minha existência. Não posso escutar essas vozes que dizem que ‘isso não é para mim’, sempre tive que pensar ‘tem que ser para mim’”, compartilha a empresária, que, depois de 20 anos de carreira, soma dezenas de reconhecimentos, como o prêmio de Mulher Mais Disruptiva do Mundo pela Women in Tech Global Awards 2021 e o título de uma das 100 afrodescendentes mais influentes do mundo abaixo de 40 anos pela MIPAD (Most Influential People of African Descent).

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Isso fica nítido, também, no surgimento do Movimento Black Money. Nina relembra que, no início, o foco da iniciativa era conceder crédito para pessoas pretas a partir da tecnologia, permitindo o dinheiro circular por mais tempo dentro da comunidade negra. “O MBM é uma rede de conexão de profissionais e pessoas para fazer circular o capital, não apenas o de grana, mas também o intelectual e o social. Incentivamos cada um a crescer e se desenvolver em carreiras voltadas para o futuro, com inclusão econômica e produtiva.”

Nina Verso e a diversidade na era da tecnologia

Atenta às transformações sociais, Nina está no metaverso com a Nina Verso, que “é quase meu alter ego; propositalmente tem minha imagem e semelhança para bater na tecla de que, em outras realidades, quero continuar sendo eu, com esse corpo preto, a pele retinta e o cabelo crespo”, compartilha.

ensaio Nina Silva para Claudia feito com inteligência artificial
“Não tinha a intenção de fazer tecnologia. Me faltavam referências, não sabia da área… Queria ser advogada” (Fabio Setti/CLAUDIA)

A Nina Verso é mais uma de suas ferramentas para gerar pertencimento a partir do ambiente virtual. “Ela luta e cocria novas realidades. Estou tentando criar espaços de pertencimento para todas as pessoas no digital. O objetivo específico é democratizar o acesso a essas novas tecnologias”, explica Nina.

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A avatar é influenciadora da Unicef, viajou para o Qatar junto de Nina e foi a primeira rainha de carnaval do Carnaverso. E é a empresária quem a manipula e opera, com a ajuda de uma equipe de designers, todo esse corre do lado de lá. “É como se fosse minha rede social, é uma extensão. Trata-se de habitar [outras] realidades, mas já levando diversidade e conteúdo para esse espaço”, destaca.

Pensar no metaverso nos leva às discussões sobre os rumos e impactos da inteligência artificial, ChatGPT, algoritmos, internet e mídias sociais. Embora esses recursos estejam presentes no nosso cotidiano, como no pedido de comida por aplicativo ou na facilidade de desbloquear a tela do celular com a biometria, não é segredo que eles também podem ser extremamente racistas e preconceituosos.

Por exemplo, conforme a Rede de Observatório da Segurança, 90,5% das prisões feitas através do reconhecimento facial (um mix de IA com algoritmos para identificar padrões faciais) foram de pessoas negras. Algumas nunca tiveram passagem pela polícia e nem sabem como foram parar naquele banco de dados.

Ainda: precisamos considerar a cibersegurança, a privacidade e o combate às notícias falsas. Esse é um questionamento também para Nina, que elenca uma resposta: “[Teremos um contexto diferente] colocando pessoas diversas para ajustar esses algoritmos, para colaborar e pensar as estratégias desses dados; para testar as novas ferramentas, que nada mais são do que reproduções do comportamento preconceituoso que nós humanos sempre tivemos sobre pluralidades.” Segundo ela, é preciso garantir, com intencionalidade, um ambiente múltiplo de pessoas que tenham voz e poder de decisão. Ela acredita que “conseguimos calibrar as máquinas, mas só se estivermos à frente das big techs. Essas desigualdades só começarão a responder melhor do que a mentalidade humana quando tivermos pessoas diversas na alimentação dos programas”, defende ela, incluindo educação e investimentos na equação desses ideais de projeções.

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Não à toa, uma das frentes de atuação do Movimento Black Money é fomentar mais pessoas pretas e pardas na ciência de dados. Uma ação recente, que aconteceu em abril de 2023, foi o Inovahack, no qual 18 equipes de talentos negros se reuniram para trabalhar em um projeto na área de tecnologia ou desenvolvimento de software por um curto período. Todos receberam uma NFT comemorativa e entraram para a comunidade do MBM na Web3.

Nina pontua que isso é essencial para garantir a autonomia da comunidade negra. “Não podemos ser apenas objeto de estudo ou um avatar, precisamos criar as soluções e dialogar com quem investe no desenvolvimento dessas ferramentas. A gente quer mais diversidades para pensar em inovação, e não o contrário”, diz ela, ao destacar que o MBM está aberto a novos financiamentos para realizar iniciativas nesse escopo.

Talvez a metáfora mais apropriada para tratar dos feitos, sonhos e inspirações de Nina Silva seja o conceito de sankofa. A filosofia africana adinkra, que ensina a olhar para o passado para resgatar o que é preciso para o presente e futuro, lembra a empresária de nunca esquecer de onde veio — e para onde vai. “É também por isso que falo de dinheiro, amanhãs, tecnologias e ferramentas. Para voltarmos para nossa humanidade, que era muito rica antes da exploração predatória capitalista que sofremos”, conta ela, que descobriu ter ascendência da costa oeste africana. “O ensinamento é que ninguém voa tão alto se não se alimentar de suas próprias origens e resgatar suas ancestralidades.”

ensaio Nina Silva para Claudia feito com inteligência artificial
“Estou tentando criar espaços de pertencimento para todas as pessoas no digital” (Fabio Setti/CLAUDIA)
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Ainda assim, fincada no agora, ela tem procurado resiliência para colher os frutos do que está sendo semeado, em coletividade. Não que seja fácil. Ela diz “precisar de um olhar de águia para não romantizar as coisas”. Mas fato é que Nina também reconhece o valor de plantar as sementes para permitir outras conjugações nos próximos anos, décadas, séculos — mesmo que não possa vê-las em vida. “Essa Nina menina e essa menina grande adulta se transformam a partir da tecnologia enquanto uma das ferramentas para eu poder me encontrar em diferentes épocas, predizer e cocriar um futuro tecnológico mais justo.”

Imagens de IA criadas por Fabio Setti
Edição de arte: Eduardo Pignata
Direção de arte: Kareen Sayuri

 

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