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Maria Casadevall e Pathy Dejesus: amizade além de ‘Coisa Mais Linda’

Protagonistas da série da Netflix, as atrizes discutem suas atuações no feminismo

Por Isabella D'Ercole Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 18 fev 2020, 08h39 - Publicado em 14 Maio 2019, 15h16
 (Hugo Toni/CLAUDIA)
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Maria Casadevall e Pathy Dejesus, protagonistas da série brasileira Coisa Mais Linda, que atingiu grande sucesso e teve sua renovação para a segunda temporada confirmada nesta segunda-feira (13), viraram grandes amigas durante as gravações do seriado. Em entrevista à CLAUDIA, a dupla debateu suas atuações no movimento feminista, temática principal da série produzida pela Netflix.

Em breve, um dos retratos desta matéria estará emoldurado e pendurado na casa de Pathy. Esse pedido da artista emocionou Maria. A dupla diz que a sintonia foi imediata no set, e a química é mesmo visível na primeira temporada do seriado da Netflix.

Na trama, que se passa no final dos anos 1950, Malu (Maria) é abandonada pelo marido e escolhe deixar para trás a proteção do pai rico para abrir um negócio no Rio de Janeiro. Adélia (Pathy), empregada doméstica e mãe solo, se torna sua sócia improvável em um clube de bossa nova, estilo que conquistava a alta sociedade. Completam o elenco forte Mel Lisboa e Fernanda Vasconcellos.

As discussões sobre feminismo e equidade de direitos aparecem logo nos primeiros episódios, quando Malu é obrigada a forjar a assinatura do marido para conseguir um empréstimo no banco – lei que só mudou com o Estatuto da Mulher Casada, de 1962.

Para falar da temática, não podia ter sido melhor a escolha das pessoas envolvidas no projeto. Pathy, 41 anos, tem um longo histórico na abertura de caminhos para mulheres negras no mundo artístico.

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“Fui a primeira modelo negra a fazer comercial de xampu para cabelos crespos. Depois vieram creme hidratante, protetor solar… Mas, mesmo com tantos anos de carreira, só agora sou protagonista. Se perguntar para minhas colegas, todas já assumiram um papel principal”, ressalta.

Maria, 31, é engajada na luta feminista, vai às ruas apoiar o movimento, posiciona-se. “O feminismo está cada vez mais saindo dos nichos e alcançando a sociedade como um todo. Hoje, enxergo que minha atuação é mais efetiva ao escutar o que outras mulheres têm a dizer do que falar. Passei por um processo de conscientização. Ele começa com um desconforto, que a gente sente mas não entende; aí se informa e expande a noção do contexto em que nos inserimos”, conta.

PatyMaria1
(Hugo Toni/CLAUDIA)

Feminismo exige aprendizado constante. Como vocês se comprometem a seguir nesse processo de autocrítica e melhora?

Pathy: Maria certa vez me falou que não existe um mesmo ponto de partida nem de chegada para todos. É um processo evolutivo de cada indivíduo, que começa com a alienação, passa pela negação e atinge o desconforto, o primeiro toque. Concordo. E não dá para receber quem está nesses estágios iniciais com cinco pedras na mão. É preciso entender.

Maria: Você começa sozinha, mas depois se conecta com outras mulheres, vê-se parte de um coletivo que reconhece a opressão. Quando desconstruímos a narrativa da rivalidade feminina, damos um tapa na cara do machismo e da estrutura patriarcal.

A narrativa da rivalidade e de outros comportamentos é internalizada depois de anos de repetição. Como mudar coisas tão cristalizadas?

Pathy: Demoramos para começar a captar esses erros; é natural que estejamos confusas. Então, cobranças muito altas se tornam cruéis. Também estamos suscetíveis ao erro. E ele serve para nos manter atentas às falhas e consertá-las.

Maria: Estamos passando por uma transição, um novo levante da onda feminista. E vamos reconhecer essa movimentação também nos embates morais que travamos com nós mesmas. Reproduzimos algumas ideias por anos, portanto o questionamento é esperado. Mas isso é a nossa geração, porque as meninas mais novas, de 20 e poucos anos, não têm essas incertezas.

Vocês têm alguma batalha pessoal que se estende a outras mulheres?

Pathy: Para mim, é a mesma desde os 14 anos, me provar como mulher negra. Ainda tenho que fazer quatro vezes mais para conquistar algo. Quando preciso de estímulo, penso nas minhas sobrinhas, que podem tomar como exemplo uma tia que alcançou seus sonhos. Essa representatividade é importante. E, agora, quero educar meu filho dessa forma. Se depender de mim e do pai, ele vai saber respeitar o limite do próximo, entender o que é sororidade, feminismo, empatia.

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Maria: Eu quero ter a oportunidade de trabalhar e ganhar o mesmo que o meu colega homem. É uma causa justa. Porém, quando comecei esse processo de expansão da consciência, fui ler Angela Davis. E ela diz que a movimentação social da mulher negra provoca alteração em toda a estrutura. Então, de repente, não faz o menor sentido eu, com todos os meus privilégios, lutar pela igualdade salarial enquanto há mulheres que não têm a integridade de seu corpo respeitada, que estão morrendo na periferia. Não podemos repetir o que outras ondas feministas fizeram e permitir que mulheres brancas tomem o lugar de fala das negras. Eu, mais uma vez, me coloco na posição de escuta.

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(Hugo Toni/CLAUDIA)

Pathy, você já contou que, quando era adolescente, seu pai a chamou para explicar que, como mulher e negra, teria um caminho mais difícil para realizar seus sonhos. Você entendeu a mensagem no momento?

Hoje vejo que meu pai não queria que eu passasse pelo que ele e minha mãe viveram. No mesmo dia, disse que eu deveria procurar um emprego, pois só assim entenderia. E ele estava certo. Quando ia me inscrever para as vagas, tinha que colocar nome, formação e depois etnia. Aí caiu a ficha de que minha inteligência e empenho não bastariam.

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Você acha que a situação mudou?

Pathy: Precisamos reconhecer algumas vitórias. São poucas, mas só o fato de termos voz ativa já é algo. O problema é que qualquer mulher negra que quebre uma barreira vira responsável por um peso, uma obrigação de carregar aquela luta. E isso cansa. Tem dias em que me sinto exausta.

Maria, você enfrentou no Carnaval uma onda de críticas nas redes sociais porque saiu com os seios de fora em um bloco. A internet contribui para a educação feminista?

É uma ferramenta muito nova e revolucionária. Todas as potências se manifestam ali. Nesse episódio, quis dialogar com as mulheres que me enviaram mensagens. Eu abri essa discussão porque aquele é um espaço que uso para manter contato com as pessoas que admiram minha carreira. Isso me deu uma nova perspectiva, me senti em uma roda de conversa, algo que não poderia acontecer há alguns anos sem o ambiente digital.

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