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Annette Bening: “Ser ator é sobre explorar a alma humana”

Aos quase 60, atriz concorre ao BAFTA por interpretação de diva do cinema noir que casou quatro vezes e namorou ator 30 anos mais jovem

Por Juliana Resende
Atualizado em 18 fev 2018, 17h38 - Publicado em 17 fev 2018, 10h01

Annette Bening chega vestindo um pretinho básico – não um vestido, mas um terninho discreto. Não usa quase maquiagem, nem joias. Parece não querer esconder as rugas no rosto jovial, apesar delas. A atriz americana que faz 60 anos em 29 de maio é a convidada do prestigioso Screen Talk, bate-papo com astros e estrelas de primeira grandeza aberto ao público, promovido pelo BFI London Film Festival, o Festival de Cinema de Londres. Claudia está na plateia de sua 61a. edição.

Queremos conversar com – e conhecer – essa mulher que diz que, sim, “atua, mas é mãe em primeiro lugar e esposa em segundo”. O maridão é Warren Beatty, um dos homens influentes de Hollywood, ex de Madonna, com quem tem quatro filhas e é casada há 25 anos.

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Estado civil e maternidade à parte, Annette Bening é uma senhora atriz (com o perdão do trocadilho). E é também simpática e simples, séria e sexy sem forçar a barra. Já foi indicada quatro vezes, mas nunca ganhou um OscarEste ano, surpreendentemente, ela não recebeu indicação ao Oscar. Em compensação, concorre ao BAFTA, o “Oscar” britânico, concedido pela British Academy of Film and Television Arts, e cuja premiação acontece neste domingo (18/02), em Londres.

O motivo é sua interpretação primorosa da diva do cinema preto-e-branco Gloria Grahame, em Film Stars Don’t Die in Liverpool (2017, estreia no Brasil no primeiro semestre de 2018, ainda sem data definida), um dos destaques do London Film Festival. Baseado no livro homônimo do ator inglês Peter Turner, narra o romance entre eles, sendo ele 30 anos mais novo (vivido por Jamie Bell, o eterno Billy Elliot).

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Altos e baixos

Dizer que por isso a performance de Annette Bening é corajosa seria de um reducionismo obscurantista. Mas o fato é que o cinema também é um lugar machista e não se vê uma mulher madura (Gloria tinha 56 anos quando conheceu Peter) e um garotão tendo um tórrido romance todo dia nas telas. O filme também discute o mito do estrelato, especialmente quando ele se abate sobre alguém do sexo feminino.

Gloria foi ao topo nos anos 50: não só contracenou com Humphrey Bogart em No Silêncio da Noite (1950) como morava numa mansão ao lado da do ator e de sua mulher, Lauren Bacall. Quando encontrou Peter Turner, ela morava num quarto, em Londres. Não vivia seus mais prósperos dias. Ao longo do longa outra questão aflora: a vulnerabilidade em pleno curso feminista.

Quando Annette dividiu sua intimidade – carreira, família e medos – com um auditório abarrotado com cerca de 1000 pessoas, entre elas jornalistas, o caso do produtor-assediador Harvey Weinstein ainda não havia pipocado (muito menos o de James Toback, roteirista do filme Bugsy, no qual Bening e Beatty atuaram e se apaixonaram), espirrando acusações de assédio para todos os lados, inclusive o de Kevin Spacey, companheiro de cena da atriz em Beleza Americana (1999).

Trata-se do filme mais celebrado estrelando Annette Banning. Não é coincidência que escancare a hipocrisia na sociedade americana de modo tragicômico. Annette é, na vida real, o oposto da perua Carolyn Burnham, a mulher infiel de Spacey em Beleza Americana: sincera, sensível e nada deslumbrada com a celebridade. “Ser ator não é sobre ser famoso. É sobre explorar a alma humana”, define.

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Vaidades na fogueira

Hollywood, para ela, aconteceu por acaso. “Eu era uma garota do meio-oeste [nasceu no Kansas] me aventurando em meio a pessoas muito glamourosas”, lembra. “Como qualquer atriz de teatro, ficava muito assustada com a câmera – mesmo porque diante de uma câmara você sempre ganha 10 quilos e isso soa horrível!”.

Envelhecer, ao contrário, não a assusta. Com a mãe aprendeu a não se preocupar: ”Ela não se incomodava com a idade. Não temos escolha, estamos todos envelhecendo. Estou realmente confortável em envelhecer e ficar cada vez menos desprendida de ser atraente”, diz.

Beleza ajuda, mas não é fundamental e não faz verão sozinha. E, num ambiente onde ser bonita é supervalorizado, Annette Bening se diferencia. O ator inglês Sir Ben Kingsley a definiu como “extremamente inteligente, combinando perfeitamente seu cérebro e seu coração”.

Essa é uma boa medida para sua Gloria Grahame (1923-1981), em Film Stars Don’t Die in Liverpool. A diva do film noir morreu cedo, aos 57. Mas viveu intensamente. Seu romance com Peter Turner serviu de combustível para que ela continuasse lutando contra um câncer que retornava pela segunda vez. “Ela não arrumava trabalho nos EUA, apesar do estrelato, então decidiu ir para a Inglaterra fazer uma peça. Estava mal financeiramente. E foi aí que conheceu Peter Turner, que era de Liverpool e estava em Londres tentando a carreira de ator”, conta Annette.

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Ambos se apaixonam, apesar da diferença da idade e de vida (ela já havia sido casada quatro vezes, sendo que uma delas com o enteado). “É uma grande responsabilidade – e uma grande honra – interpretá-la. Ela era uma femme fatale, uma mulher que fazia o que queria e isso deve ter incomodado muita gente”, diz Annette, que foi quebrando o gelo com a câmera ao longo de sua carreira mas não abriu mão de grandes papéis femininos. “Quando eu comecei no teatro, fazia peças de Shakespeare, Ibsen e Chekhov – e todas tinham mulheres incríveis. Fiquei mal acostumada”, brinca.

(Sony Pictures Entertainment Deutschland GmbH/Divulgação)

Sem estereótipos

Seja como matriarcas nada tradicionais – a desencanada Dorothea Fields, em Mulheres do Século 20 (2016), e a lésbica caretona Nic, em Minhas Mães e Meu Pai (2010), que lhe valeu a mais recente indicação ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante –, seja na pele de espíritos livres como a liberada poeta Bella em Ginger & Rosa (2012) ou a descolada designer Sylvia Fowler em Mulheres – O Sexo Forte (2008), Annette subverte estereótipos.

“O que me faz amar um personagem é sua resiliência – aquele que tenta, se arrisca”. Nesse sentido, podemos dizer que Peter Turner não só tentou se relacionar com uma mulher mais experiente e muito mais temperamental, mas a amou genuinamente. Gloria Grahame se arriscou deixando este jovem entrar na sua vida e assumindo publicamente – no final dos anos 70 – o romance que dava o que falar e que não era bem visto pela sua família e muito menos pelo patriarcado de Hollywood.

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Na plateia do Screen Talk com Annette Bening, Peter Turner foi aplaudido de pé. “O livro é uma inspiração e Peter é um homem muito especial”, elogia a atriz. Apesar de ser uma declaração de amor, o livro de Turner não deixa de mostrar uma mulher excêntrica e teimosa. “Peter, apesar de amar Gloria, deixa claro suas insatisfações. Estou interessada em roteiros que explorem todos os lados dos seres humanos”, explica Annette.

A atriz foi trazida a Film Stars Don’t Die in Liverpool pela produtora Barbara Broccoli (uma das mais bem-sucedidas executivas do cinema, conhecida pelos filmes de James Bond). “Ela conheceu Peter e Gloria quando estavam juntos. Há anos Barbara queria fazer o filme e nossa conversa começou há muito tempo. Todos nós estávamos comprometidos em colocar essa história pouco usual na tela. Acho que este filme é parte de uma nova leva e de uma era menos preconceituosa. Gloria era uma sobrevivente. Enfrentou muitos escândalos e superou alguns”, diz Annette.

Agora vai?

Annette também encarou alguns micos. Na cerimônia do 63o. Oscar, em 1991, o então apresentador, o comediante Billy Crystal, chamou a atriz ao palco como “a Mulher-Gato de Batman Begins (1992)”. O papel acabou com Michelle Pfeiffer quando o estúdio soube que Annette estava grávida.

Quando ela recebeu sua segunda nomeação de Melhor Atriz, no 72o. Oscar, por Beleza Americana (que ganhou a estatueta de Melhor Filme), exibia o barrigão de oito meses. Perdeu para Hilary Swank em Meninos Não Choram (1999) – e novamente em 2005, desta vez concorrendo por Adorável Júlia (levou, em vez do Oscar, o Globo de Ouro pelo papel de Julia Lambert), enquanto Swank abocanhou a estatueta por Menina de Ouro (2004).

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Com o santo forte de Gloria Grahame – que foi indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por Rancor (1947) e ganhou o prêmio por Assim Estava Escrito (1952) –, Annette Bening continua na disputa. Sua primeira indicação ao Oscar foi de Melhor Atriz Coadjuvante por Os Imorais (1991), no qual contracenou com Angelica Huston. Ela é lembrando por Annette como uma das grandes atrizes com quem contracenou.

Mas seus ídolos são Helen Mirren, Frances McDormand, Liv Ulman e Ingrid Bergman. “Ainda sou muito crítica comigo no cinema”, reconhece, mesmo certa de “que a câmara é o território do diretor – muito mais que do ator.”

Se Annette já teve sua sanidade emocional comprometida por um papel? “Não tive minha psique totalmente destruída, mas uma vez me peguei chorando por causa de um personagem – eu adorei isso! Quando a gente descobrir como fingir tudo acho que atuar vai perder a graça”.

Falando em choro, uma senhora levantou a mão na hora das perguntas pós bate-papo e confessou: “Assisti ao filme esta manhã e não consegui parar de chorar!” A plateia caiu na gargalhada. Annette foi mais generosa: “Muito obrigada por compartilhar isso tão naturalmente”, disse. “Nestes 30 anos de carreira aprendi que é ok ter medo. Antes eu não admitia. Mas hoje eu me sinto melhor deixando o medo fluir. Assim como qualquer outra emoção. Atuando e vivendo”.

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