Shirley Espejo une colagens à memória e representatividade ancestral
Através do Espejismo, um tipo de colagem manual, a paulistana quer contar histórias ainda pouco conhecidas da migração boliviana

Foi entre tecidos, paetês e memórias costuradas pelas mãos dos pais que Shirley Espejo cresceu, cercada por um ambiente criativo. Filha de indígenas de La Paz, da etnia Aymara, a história da brasileira de 27 anos começou a ser escrita antes mesmo de seu nascimento. Em 1996, seus pais atravessaram a fronteira da Bolívia para o Brasil em busca de novas perspectivas de trabalho.
Aqui, atuaram na indústria têxtil, produzindo vestidos de festa, durante décadas. Nessa mistura de culturas a artista construiu um conceito de arte tão íntimo quanto político: o Espejismo, um tipo de colagem manual que muda discursos estereotipados impostos a corpos racializados ao longo do tempo.
O nome é uma homenagem ao sobrenome do pai, Espejo. “Espejismo”, em espanhol, significa miragem. “Sei que crio cenários que não são possíveis dentro do nosso mundo, mas que são possíveis através da arte”, explica.
As primeiras colagens surgiram ainda na escola, onde, com o passar dos anos, sentia-se cada vez mais sozinha — não apenas por ser a única pessoa indígena da sala, mas também pelo vazio de referências. Não se reconhecia em lugares de destaque, como capas de revistas. Na Vila Maria, bairro de São Paulo, suas inspirações vinham de trabalhadores bolivianos comuns.
“Como vou sonhar em ser algo, sendo que não existe essa construção visual do que posso ser?”, questiona.

Shirley une elementos da natureza, como paisagens montanhosas, a representações da selva de pedra paulistana. Uma caminhada ao ar livre inicia seu processo criativo, de composições futuristas feitas de recortes de revistas, jornais e panfletos colecionados.
Suas colagens são um exercício de pertencimento, de imaginar mundos em que pessoas não brancas vivam com reconhecimento e descanso. “Se eu não tenho um lugar ao qual pertencer, eu crio o meu próprio. O meu bom lugar, o meu próprio bem viver.”
Hoje, sua arte, que já foi exibida em seis exposições e ensinada em 26 oficinas, é uma ponte de diálogo de assuntos que a feriram ao longo de uma vida inteira. Essa fusão agora rendeu frutos: em abril, Shirley recebeu o Prêmio Pipa 2025, um dos maiores reconhecimentos de arte do país.
“Estar na lista é o maior significado de vitória. Porque eu não sei quantas pessoas do mesmo recorte que eu alcançaram esse lugar. A arte que faço e a pessoa que sou estão sendo vistas, e isso não tem preço.”
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