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A carreira de Kesha está por um fio – e precisamos falar disso

Kesha acaba de perder o processo contra o seu produtor e isso nos obriga a abrir ainda mais os olhos para o mundo abusivo do poder.

Por Gabriela Kimura
Atualizado em 11 abr 2024, 18h36 - Publicado em 23 set 2015, 12h40
Noam Galai/Getty Images (/)
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Em outubro de 2014, a cantora pop Kesha entrou com um processo contra o empresário Dr. Luke, responsável pela produção e divulgação de sua música. Ela alega ter sofrido abusos físicos e sexuais por parte dele, além de pedir que seja rompido o monópolio que a Sony e a gravadora Kemosabe Records têm sobre suas produções – que, vale lembrar, estão paradas desde 2012, quando ela lançou o álbum Warrior. Seu primeiro lançamento solo em 2010, Animals, ficou em primeiro lugar na Billboard, vendeu 152 mil cópias e teve singles que dominaram outras listas mundo afora.

As condições contratuais impedem que a cantora trabalhe com outros produtores e lance músicas novas fora da gravadora. O advogado de Kesha, Mark Geragos afirmou que é absolutamente necessário que a cantora possa seguir com seu trabalho em outro lugar – ou isso destruiria para sempre sua carreira. “Até que esta corte decida sobre a sentença declaratória, Kesha está em um impasse: sem músicas novas para apresentar, não pode fazer turnês. Fora das rádios, dos palcos e dos holofotes, ela também não consegue atrair a atenção da mídia. O valor de mercado dela decaiu e, a menos que o tribunal acarrete esta ação, Kesha sofrerá danos irreparáveis, levando sua carreira à um ponto sem volta”. O pedido de urgência tem um motivo além dos danos que ela já vem sofrendo: o processo tinha começado, originalmente, em Los Angeles, mas, no dia 18 de setembro, foi suspenso e endereçado ao tribunal de Nova Iorque, onde Kesha precisou recomeçar o duelo.

Kevin Winter/Getty Images Kevin Winter/Getty Images

Dr. Luke é um dos “deuses” da mundo da música, tendo produzido grandes nomes como Britney Spears, Miley Cyrus, Nicki Minaj, Jessie J e Kelly Clarkson. Kesha e ele firmaram contrato quando ela tinha apenas 18 anos, em 2005. De acordo com o site TMZ, o produtor também entrou com um processo contra a cantora afirmando que ela estaria mentindo e já teria tentado extorquí-lo, “inventado toda a história com a ajuda da mãe para fugir das obrigações contratuais” (e uma possível quebra de contrato e multa).

Para o advogado de Kesha, o “processo é um esforço incondicional para reaver o controle de sua música e de sua liberdade, após ser vítima de manipulação, abuso emocional e sexual por 10 anos de Dr. Luke”. O Buzzfeed apresentou cartas escritas por ela própria para os seus fãs, nas quais conta pequenos detalhes do seu sofrimento. Em um dos eventos alegados, o empresário a teria drogado e obrigado a fazer sexo com ele, além de criticá-la constantemente por causa de seu corpo, levando à um transtorno alimentar que terminou em uma clínica de reabilitação no final do ano passado. Especula-se que a música Dancing With The Devil (“Dançando com o diabo”, em português) seja sobre a relação da cantora com o produtor: “Eu e você, nós fizemos um trato/Eu era nova e a coisa ficou muito real(…)/O seu amor é feito de ouro sujo/Mas fui eu quem vendeu a alma”.

Reprodução/Kelly Mullins Reprodução/Kelly Mullins

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Carta de Kelly Mullins, 16 anos, Virgina, EUA

Primeiramente queria dizer que você é muito gentil e adorável. Eu chorei muito quando li sua carta e agora tenho fotos na minha parede A carreira de Kesha está por um fio – e precisamos falar disso. Eu amo muito você e realmente preciso do seu apoio nesse momento. Uma pessoa que trabalha comigo me conduziu (literalmente) à doença, me torturou e f*deu comigo e com a minha família. Então, aqui estou levando meu tempo e recuperando minha magia.”

Reprodução/Annie Gallo Reprodução/Annie Gallo

Annie Gallo, 18 anos, Virginia, EUA

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“Annie, sim, o Dr. Luke torturou à mim e à minha família… Ele fez sim as coisas que as pessoas sabem e MUITAS outras coisas piores. Mas eu tenho tentado viver minha própria vida, ser uma guerreira [a warrior, como referência ao seu último álbum] e ter orgulho do meu corpo perfeitamente imperfeito. Obrigada pelo carinho e pela carta. Eu não conseguiria passar por isso sem você e meus animals*.”

Reprodução/Twitter/@keshatoday Reprodução/Twitter/@keshatoday

“Connor, meu amor, muito obrigada pela sua carta – e eu me lembro sim de você! Estou trabalhando meus traumas e abusos emocionais aqui [na clínica]: tem uma pessoa que trabalha comigo que é realmente muito abusiva. Mas eu tenho que ser uma guerreira e me amar, por isso, obrigada pelo amor e apoio. É realmente necessário e sou muito grata por isso! Continue ridiculamente mágico.”

Atualização do caso

Kesha foi derrotada na primeira audiência do processo, que foi realizada no dia 19 de fevereiro de 2016em Nova Iorque. De acordo com o veículo The Hollywood Reporter, a defesa de Luke teria argumentado que foram investidos mais de US$ 60 milhões na carreira da artista. Por isso, apesar de já ter concordado em deixá-la gravar novos trabalhos sem a sua participação, Luke ainda lucraria por ser empresário e dono do selo fonográfico.

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Shirley Werner Kornreich, a juíza da Suprema Corte do estado de Nova Iorque responsável pelo caso, teria considerado que a quebra de contrato com a empresa de Luke era “infundada e sem embasamento”. Ainda de acordo com a publicação, ela teria justificado o seu veredito ao advogado de  Kesha: “Você está pedindo que a corte invalide um contrato que foi amplamente negociado e é típico da indústria. Meu instinto é fazer o comercialmente razoável”.

No dia 6 de abril de 2016, a juíza Kornreich decidiu inocentar o produtor das acusações de abusos sexuais e psicológicos. Segundo ela, “O estupro não é um crime de ódio motivado pelo sexo” e Kesha só teria especificado duas datas dos crimes, apesar de acusar Luke de abusá-la por anos. Sobre o quadro depressivo e emocional da cantora, a juíza definiu que “Insultos sobre seu valor como artista, aparência e peso são insuficientes, ultrajante e intolerável para constituir extrema conduta na sociedade civilizada”.

Em outras palavras, Shirley não acredita que existam provas consistentes o bastante para as reivindicações da artista. Dessa forma, foi descartada qualquer possibilidade de reabertura do processo e Kesha continua presa ao restritivo contrato firmado com a empresa de Luke. Poucos dias antes, a cantora usou sua conta no Instagram para comentar a proposta indecente que teria recebido da gravadora.

O fato é que o caso precisa chamar nossa atenção para o universo abusivo e controlador da fama. Jovens artistas precisam assinar contratos absurdos e abrir mão de sua criatividade, liberdade e, às vezes, até da própria voz para conseguir um espaço no mundo. E também estão sujeitas a se calarem quando precisam enfrentar um nome poderoso, bem como aconteceu no caso Bill Cosby. Quem sabe o que uma jovem de 18 anos que queria cantar suas músicas pode ter passado nesses 10 anos? E quem somos nós para julgar?

#FreeKesha <3

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