Dar uma chance para si mesma, provar outro ritmo e desfrutar o momento
Atriz e psicóloga, Tania Khalill é a nova colunista de CLAUDIA. Ela fala sobre o que podemos fazer para mudar o que experimentamos e provar um outro ritmo
Bem na nossa frente, abre-se uma tela branca, límpida, prontinha para pincelar aquele esboço por tanto tempo matutado. Afinal, o ano é novo, convidativo para colocarmos em jogo zilhões de sonhos e desejos. Mas, espera! Algo só vai rolar mesmo depois do Carnaval, nada acontece antes disso, né… Talvez na segunda-feira seguinte, assim tenho o final de semana para um detox… Hmm, pensando bem, na outra semana fica melhor, vou chegar chegando e arrebatar aquela vaga sonhada e, de lambuja, engatar naquele romance… Pensando bem, quando eu ganhar aquele papel em Hollywood, aí sim a vida se encaixa…
O ano mal começou e haja reticências… Até cansa!
A boa e a má notícia é que essa lista nunca vai acabar. Má pois, na maioria das vezes, ela é a repetição da historinha que contamos para nós mesmas dia após dia, ano após ano e, em 80% das vezes, é tudo balela. A boa é que, de alguma forma, os sonhos existem. Você não está totalmente imobilizada, então resta esperança.
Quando tinha uns 20 anos, meu pai, vendo-me surtar com indagações juvenis sobre terminar a faculdade de psicologia ou aceitar a vaga em um grupo de teatro experimental, entre tantas outras, me vem com a frase: “Os desejos nunca findam, filha”.
Aos 20, entendi sem realmente compreender o que hoje, 24 anos depois, absorvo. É impossível saciar a imensidão de desejos e estímulos que nos assolam vulcanicamente, quando se inicia um ano, até mesmo porque o carrossel dos desejos serve culturalmente para alimentar nossas insatisfações, deixando tudo absolutamente insaciável. O tempo vai escorrendo pelas nossas mãos e já é quase dezembro, quase 2023, 2024, 2025… E seguimos nas mesmas reticências, concluindo que o famoso estar no agora parece mais um “blá blá blá” impossível de alcançar, porque não há, aparentemente, tempo para pausar…
Como não quero isso nem para mim e nem para você, te convido a começar diferente, questionando-se no caminho inverso do famoso plano de ano novo do “quero ter, fazer, acontecer”. O que de fato em você, na sua vida e em seus comportamentos, deseja desaprender, deixar para trás? Ah, e não vale, óbvio, querer que o outro mude, combinado? É sobre você mesma!
O que pediria para o gênio da lâmpada levar para bem longe, para desmemorizar da sua existência? Sabe aquela lei do guarda-roupa abarrotado: só entra uma peça nova quando sai uma que não cabe mais? É simples assim. Abra espaços dentro de você, escolhendo o que não entra no calendário daqui para frente.
Posso garantir de antemão: é surpreendente a maravilhosa jornada quando nos dispomos a recapitular o que não desejamos mais pensar, sentir e agir de tal forma. Abre-se um mundo, o blá blá blá diminui, você começa a notar as historinhas furadas e, o melhor, não precisa esperar o Carnaval, a segunda-feira, o Espírito Santo e nem o colo do seu pai para te encorajar.
Certeza, você já sabe o que não gosta em você. Está pronta para desinstalar tudo isso do seu sistema.
Vamos juntas? Pronto! Eis o primeiro passo dado, do jeito inverso, colorindo sua tela com novas possibilidades