Nunca me esqueci dessa pergunta que iniciava o artigo de Ana Homayoun para o New York Times. Encontrei-o quando tentava decidir se faria sentido aceitar o presente que minha mãe oferecia à minha filha mais velha — um celular. A batalha por um telefone para chamar de seu finalmente se aproximava da conclusão vitoriosa para ela.
Nem preciso dizer que nós, pais, lutamos bravamente. Vocês já conhecem o roteiro. Negamos o pedido diversas vezes, negociamos um tablet sem chip como um primeiro passo mais seguro, argumentamos, adiamos e, por fim, aceitamos a respeitosa consulta da avó. De lá até aqui, nós (os adultos) e o telefone da pré-adolescente mantemos um relacionamento ora próximo, ora distante ainda que sempre cerimonioso.
Voltei ao artigo hoje porque estamos analisando agora a possibilidade de colocar um chip no celular de nossa filha mais nova – a pedidos, claro. Esta sim anda um tantinho mais assídua do que gostaríamos no uso do aparelho ainda ligado ao wi-fi de casa. A ideia era consultar o questionário proposto por Homayoun em seu texto e investigar quão saudável (ou não) anda seu convívio com a tecnologia.
Eis a lista que eu procurava:
1. O humor do seu filho muda rapidamente (fica irritado, ansioso, com raiva ou até mesmo violento) quando o telefone está indisponível para o uso?
2. Seu filho prefere faltar ou desmarcar programações para passar mais tempo nos aplicativos e redes sociais?
3. O tempo que ele dedica ao celular atrapalha seus cuidados com o corpo (sono, alimentação e higiene)?
4. Sente-se pressionado a responder ou ter suas solicitações respondidas imediatamente?
5. Consegue ignorar notificações, ou corre com urgência ao ouvir qualquer som emitido pelo telefone?
6. É acometido pelo FOMO – fear of missing out – (medo de perder o que está acontecendo)?
Tendo a menina de nove anos como alvo de minha pesquisa, respondi negativamente com um certo alívio até a pergunta 3. Mas será que o tempo gasto com eletrônicos não atrapalha mesmo o sono da criança? As questões 4, 5 e 6 me colocaram igualmente na dúvida. Tentei responder por mim e talvez tenha tirado uma nota ainda menor do que a dela. É só pensar na primeira pergunta: quantas vezes o finzinho da bateria anunciado sem dó de cinco em cinco por cento já nos tira do sério?
Penso que, cientificamente falando, o buraco é mais embaixo. Estamos todos precisando revisar o uso que fazemos do celular. Crianças e adultos. Que exemplo estamos dando a nossos filhos? Duas conclusões para a questão aqui em casa, pelo menos por agora. Primeiro, o chip vai precisar esperar – desculpa Sofi. E depois, o olhar de questionamento para as nossas atitudes, os adultos, sai dessa reflexão mais forte. Algumas perguntas precisam ser feitas e refeitas de tempos em tempos.
Seu filho está viciado no celular? E você?
Ps: essa conversa dá panos pras mangas.
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O manual do primeiro celular, de Rachel Campello
Intoxicações eletrônicas na primeira infância, de Julieta Jerusalinsky