Slow living: a casa colorida e tranquila de Calu Fontes
A artista plástica Calu Fontes procura viver o dia a dia de um jeito tranquilo, perto da filha, do marido e dos amigos, que encontram a casa sempre pronta para recebê-los
A tarde de sexta-feira, 10 de janeiro, chegou à casa de Calu Fontes com aroma adocicado de incenso e cheirode comida no forno. Havia Miles Davis tocando nasala, brinquedo de criança no quintal, beija-flor batendo asas no jardim, calmaria de cidade do interior. Mas, se a entrevista tivesse ocorrido uma semana depois, ou no momento em que você lê esta reportagem, a atmosfera seria a mesma. Tão tranquila que se custa a acreditar que, a poucos metros dali, fica uma das avenidas mais movimentadas da Lapa, bairro da Zona Oeste paulistana.“Essa localização me permite almoçar com a Noa todos os dias, pois dirijo por apenas cinco minutos até o ateliê”, conta. Noa é Eleonora, de 2 anos e meio,filha dela com o advogado Joaquim Moraes. Logo ao clarear do dia, as duas já estão juntas, em passeios nos parques e praças das redondezas. “Sempre curtimos esses momentos na companhia uma da outra. Só saio para trabalhar quando ela tira a sonequinha da manhã”,diz Calu, que também leva e busca a pequena na escola.Viver na contramão da rotina agitada predominante em São Paulo foi uma escolha natural. “Assim posso acompanhar de perto o crescimento da minha filha eme entregar verdadeiramente à criação artística. Preciso estar inteira em cada lugar, e não preocupada com o trânsito, com a cabeça em outras coisas”, explica a artista plástica, cujo talento dá origem a peças de porcelana únicas, decoradas com pintura e decalques.
O tempo destinado à família e a necessidade de recolhimento a fizeram montar, inclusive, um segundo ateliê, este mais perto ainda: na edícula da casa. Depois do jantar, ela se refugia ali com livros de poesia (Pablo Neruda, João Cabral de Melo Neto, Emily Dickinson, Ana Cristina Cesar) e discos (de jazz e rock) e passa horas em meio a pesquisas que darão origem a novas composições, algumas delas aplicadas em outras superfícies – desenvolveu uma coleção para a grife de calçados Ana Capri e sacolas reutilizáveis lançadas pela Tok & Stok. Não é raro Noa aparecer por lá e brincar sob os olhares da mãe. “Essa proximidade oferece a ela uma infância feliz.” Esse jeito sossegado sempre acompanhou Calu. “Cresci morando em casa, brincando na rua”, lembra ela, paulistana com um pé na Bahia, terra natal dos pais e da irmã e onde passou inúmeras férias. Além do gingado no sotaque, Salvador presenteou a artista com uma fé livre de rótulos. “Sou filha de Iemanjá, fui batizada na igreja Nosso Senhor do Bonfim, rezo para São Jorge, peço proteção a Vishnu…”, fala. Todas essas imagens adornam um altar montado sobre o frontão da lareira na sala de estar, aberta para um jardim criado pelo amigo e paisagista Gil Fialho. Outras amigas, as arquitetas Adriana Weichsler, Viviane Saraiva e Daniella Martini, do escritório Proa Arquitetos, deixaram a construção do jeito que Calu e Joaquim (apelidado de Joca) queriam. Nem foram necessárias grandes intervenções – uma abertura trocada aqui, um piso novo ali, pintura em tons vibrantes (“Adoro a paleta com ares mexicanos”, diz a moradora), e a obra estava pronta. A mudança mais significativa se deu na edícula, parte dela transformada numa deliciosa área de refeições, com vista para o quintal. Os momentos mais especiais, garante a artista, acontecem nesse espaço, cenário para cafés da manhã em família nos fins de semana e encontros com amigos. Enquanto um dos anfitriões cozinha, o outro cuida da decoração. “Me falta habilidade com as panelas, essa tarefa cabe ao Joca. Mas dedico o maior carinho a cada detalhe da arrumação da mesa”, observa, com o sorriso largo, enquanto prepara um café. Diante de tanto capricho, entende-se por que a morada vive cheia, da maneira que Calu gosta. “Não vejo a casa como um lugar de passagem e, sim, de permanência.”