Sou a motogirl mais charmosa de todo o Brasil
Trabalho seis horas por dia e tiro R$ 2 mil por mês. Sou a Penélope da vida real!

Duvidei do meu marido e me dei bem. Hoje, estou na profissão que amo!
Foto: arquivo pessoal
Meu marido era motoboy. Sempre que eu o encontrava jogado no sofá à noite, a gente discutia.
– Cansado? Mas de quê? Você fica sentado na moto o dia todo! – eu dizia, com desprezo.
– Ah! Pensa que não cansa?
Injuriado, ele marcou minhas aulas na autoescola. Assim que a habilitação saiu, me deu uma moto: ”Vamos ver como você se sai!”. E lá fui eu trabalhar com ele. Era o ano de 2002. De cara, me apaixonei pela profissão de motogirl!
Muitos tombos
Todos já me conheciam. ”Olha a Alemoa, com sua moto cor-de-rosa!”. Achei mais difícil dirigir moto do que carro. Confundia embreagem, freio… ”Sua mulher caiu lá na rua tal.” E lá ia meu marido me acudir.
É perigoso, mas eu gosto
Em 2007, me acidentei. Eu estava na rotina louca de fim de ano. Eram 5h30 da tarde de uma sexta-feira. O trânsito daquele jeito. Todos queriam chegar em casa logo. Assim que o farol abriu, arranquei. Mas um carro não parou no cruzamento e… BUM! Fui jogada a metros.
Meu braço quebrou e ficou igual a uma letra S. Também arrebentei os dois joelhos, as mãos e o pulso. Fiquei quatro meses parada, sem poder trabalhar. Além do risco, tive um baita prejuízo. Desde então, decidi que não vale a pena abusar. Minha carga horária é sempre a mesma: das 9h às 11h30, almoço, descanso, e depois volto das 14h às 17h30.
Tiro R$ 2 mil por mês
Minha clientela é bacana. Alguns herdei da época em que eu trabalhava com meu marido – hoje ele abriu um negócio e não é mais motoboy. Outros clientes conquistei sozinha. Mulher tem fama de cuidadosa, por isso, tenho preferência. Os valores do trecho variam com a distância, de R$ 10 a R$ 25. O gasto é pouco. De gasolina, vão cerca de R$ 10 por dia. E tem a manutenção da moto: óleo, freio, pneus… Pensa que meu marido me ajuda? Eu que vejo tudo, sozinha!
Consigo tirar cerca de R$ 2 mil por mês. No final do ano, tudo aumenta. Dá pra ganhar mais de R$ 3 mil. Mas aí não tem almoço nem hora pra voltar pra casa. Depois do acidente que sofri, mesmo nessa época, faço meu horário normal.
Preconceito
No começo, me olhavam com cara feia. Certa vez, parei em um estacionamento pra motos que estava lotado de motoboys. Peguei a mercadoria e, quando voltei, todos riram. Não tive dúvidas: me sacanearam! Dei uma geral e vi que o cachimbo da vela – parte importante da moto – estava torto. Coloquei-o no lugar, olhei pra eles e mandei:
”Precisam fazer melhor do que isso, meninos!”. E fui embora. Andei uns 100 metros e a moto começou a falhar. Não é que os desgraçados tinham desligado a gasolina também? Eu, no meio do trânsito, toda atrapalhada: ”Algum problema aí, Alemoa?”, me perguntou um motoboy, rindo. Que raiva! Mas tudo isso superei com o tempo. Agora, somos todos amigos. Mulheres que trabalham em um meio dominado por homens têm que ter muito jogo de cintura. Só assim conseguem ser respeitadas. Postura também é fundamental. O maior preconceito vem dos carros. Mas não é comigo exclusivamente, mas com motoboys em geral. As pessoas nos veem como marginais.
Tem cada uma!
Já passei por situações engraçadas. Um dia, fiz uma entrega em um prédio superluxuoso. O porteiro avisou que o motoboy havia chegado e me autorizaram a entrar e subir. Ao chegar no apartamento, dei de cara com um senhor, gay, vestido pra matar: todo de vermelho, com calcinha, sutiã e afins. Ele achou que subiria um homem, não uma mulher! Quando me viu, a cara dele foi hilária. Fui embora chorando de rir.
Amante da motocicleta
Já faz sete anos que sou motogirl e concilio a velocidade com a vida de dona de casa. Sou mãe de quatro filhos. Eu que cozinho, ensino a lição de casa, acompanho na escola… A mais velha, de 15 anos, me ajuda bastante. Mas a rotina é puxada. Mesmo sem tempo, não deixo minha feminilidade de lado. Acho que conta pontos na hora de conquistar clientes.
Hoje, dou um baita valor pra profissão. Reconheço todo esforço e cansaço que meu marido sentia quando era motoboy!
O que é preciso para ser motogirl
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Motoboys (Abram), Lucas Pimentel, o piso salarial varia em cada estado do país. Em São Paulo, por exemplo, é de R$ 730, sendo que a média salarial é de R$ 1 500. Abaixo, seguem as exigências da nova regulamentação aprovada pelo Congresso Nacional para quem deseja ingressar na carreira de motogirl:
. Ter, no mínimo, dois anos de habilitação na categoria A.
. Passar pelo curso de aperfeiçoamento defi nido pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran).
. Utilizar os equipamentos obrigatórios (colete, adesivo retrorrefletivo no baú e capacete).
. Ter licença da prefeitura.
. Licenciar a moto na categoria aluguel, com placa vermelha.
. Colocar na moto protetor de pernas e antena corta-pipas.