#Bringbackourgirls: O que o rapto das meninas na Nigéria tem a ver com você?
Afinal, o que está acontecendo na Nigéria e o que esse debate tem a ver com o Brasil? Entenda o caso e a visão que, em alguns lugares, ainda se tem do corpo e dos direitos das mulheres.
Quem são os sequestradores?
Fundado em 2002, o grupo Boko Haram carrega no nome o significado de suas crenças, “Educação do ocidente é um pecado”, e vêem nesse estilo de vida uma ameaça a ordem que acreditam ser natural. Ou seja, meninas e escolas não combinam e eles, homens, são os responsáveis por decidir a punição de quem desrespeitar isso.
Que mensagem eles quiseram passar?
Para Nadine Gasman, representante da ONU Mulheres no Brasil, entidade das Nações Unidas que defende a igualdade de gênero, a ação do Boko Haram é uma clara demonstração de poder. “Eles quiseram mostrar ao mundo que podem (e vão) tomar a vida de um grupo de meninas, se isso for necessário para manter a tradição e a ordem em que acreditam. Para eles, os homens são os donos do corpo e do destino das mulheres.” Nos vídeos, eles ameaçam estuprar e vender como escravas as adolescentes sequestradas e exigem que outras meninas que estudam deixem as escolas e se casem.
Como está o caso, quatro semanas depois do sequestro?
Não se sabe o número exato de adolescentes que estão em poder do Boko Haram, mas 223 meninas continuam desaparecidas. Ativistas nigerianos acreditam que algumas já foram mortas ou vendidas como escravas, como anunciou o grupo em um vídeo (em que algumas delas aparecem vestidas dos pés à cabeça com véus). Nesta última semana, os extremistas lançaram outro vídeo exigindo a libertação de membros do grupo que estão presos em troca das meninas.
O que isso tem a ver comigo?
Para Nadine, este é um tema que extrapola as fronteiras da Nigéria e esbarra na percepção que diferentes sociedades têm do sexo feminino. É uma violência que mostra a fragilidade dos direitos das mulheres.
“Para a sociedade atual, em especial, para países que vivem em situação de conflito, os corpos das mulheres fazem parte das estratégias de guerra. Raptar e violentar se tornam ações de poder. E por que isso acontece? Porque mulheres e meninas ainda são vistas como posse das comunidades e dos homens, como se estivessem lá para serem tomadas, vendidas ou intercambiadas”, diz.
Por que a educação feminina é ofensiva para esses grupos?
Essa visão de poder que os homens têm sobre as mulheres reflete no acesso à educação delas, principalmente nos países em situação de conflito. Por representar certa emancipação da mulher, a escola passa a ser um ambiente condenado por extremistas e, por consequência, um lugar perigoso a quem os desafia.
“A UNESCO tem visto um crescimento nos ataques às escolas e estudantes em países em situação de conflito, em especial contra as meninas. O caso da paquistanesa Malala (Yousafzai, estudante paquistanesa que levou um tiro por defender seu direito de estudar) foi importante para entender a violência extrema que é utilizada para manter as mulheres longe da educação”, afirma Nadine.
No Brasil, também temos esse problema?
A situação é otimista por aqui. Há mais mulheres do que homens estudando. Um dado importante é que, em 2011, as mulheres eram as que mais ingressavam (56%) e as que mais concluíam (61%) o ensino superior. Isso não é algo que você encontra em todos os lugares.
No entanto, Nadine defende que ainda há ações a serem tomadas para aumentar as condições de acesso à educação das mulheres brasileiras. “Entre jovens de 20 a 29 anos que não trabalham nem estudam, cerca de 70% são mulheres; a maioria mães que tiveram que abandonar os estudos. É por isso que os direitos reprodutivos da mulher e o acesso a creche, por exemplo, estão diretamente ligados ao direito que as mulheres têm de estudar”, diz.
Qual a utilidade das fotos publicadas com a hashtag #bringbackourgirls?
O tema gerou comoção internacional, com artistas e personalidades mundiais manifestando apoio à familia e às meninas. A cantora Madonna, a primeira dama norte-americana Michelle Obama e a ativista paquistanesa Malala Yousafzai foram algumas das que postaram nas redes sociais fotos com a hashtag #bringbackourgirls – criada como forma de pressão para que se encontre as meninas.
“É essencial para essas meninas, suas famílias e até para a humanidade que o mundo não se esqueça delas. É preciso deixar claro para o governo da Nigéria que é responsabilidade dele trazer essas meninas de volta, e assim mostrar para grupos terroristas que eles são a minoria e que a humanidade não compactua com suas ações”, afirma Nadine.
Como posso apoiar a causa?
Primeiro, não deixe a hashtag morrer e compartilhe-a para que mais gente conheça a história dessas meninas. Você também pode assinar uma petição, criada pela plataforma online Change, para cobrar organizações internacionais a pressionarem o governo nigeriano. Assine aqui.
Novidade: Elas podem voltar?
Dia 17 de outubro, seis meses após o incidente, o governo e o Exército nigerianos anunciaram um possível acordo com o grupo terrorista Boko Haram, que resultaria na libertação das mais de 200 estudantes sequestradas. Duas reuniões entre o primeiro-secretário da presidência da Nigéria, Hassan Tukur, e os extremistas aconteceram no Chade (país vizinho à Nigéria), sob a mediação do presidente do país, Idriss Deby.
Os representantes do governo afirmaram que o Boko Haram deu garantias de que as meninas estavam vivas e passavam bem. Em troca do cessar-fogo e das estudantes sequestradas, os extremistas teriam pedido a libertação de prisionerios ligados ao grupo.
Muitos nigerianos duvidam da eficácia do acordo, já que tentativas anteriores de conversa com o grupo não deram certo. O interesse político do atual presidente nigeriano também gera desconfiança; Goodluck Jonathan colocou as questões de segurança no centro de seu palanque eleitoral à reeleição.
*Matéria atualizada em 17/10/2014 para incluir o acordo para resgate das meninas nigerianas